A grande desordem
07-01-2022 - 06:11

Nós vivemos numa grande desordem paradoxal: estamos a perder liberdade todos os dias no mundo real, mas no mundo virtual campeia a total libertinagem, a liberdade total e não ordenada pelo estado de direito, ou seja, não é liberdade, é a lei da selva. O mesmo indivíduo pode ser como cidadão um 8 securitário na realidade física e um 80 libertino no mundo virtual enquanto utilizador da internet.

Foi uma semana horrível. Um ataque informático destruiu o site do meu jornal, Expresso. O jornal foi roubado. Fui roubado, fui assaltado, fomos assaltados. Fiquei sem o espaço onde trabalho e escrevo todos os dias. Se aplicarmos isto à rádio, seria o mesmo que alguém bloquear a emissão da Renascença. Só ouviríamos a estática. Sim, a estática. Foi este o som desta semana: estática. Este é um ataque à liberdade e ao modo de vida dos jornalistas e cronistas, é um ataque direto à minha vida: acordo sempre cedo para escrever a crónica do dia na fronteira entre a madrugada e a manhã; sinto-me agora no vazio sem este começo de dia. E, já agora, este é um ataque direito ao ganha pão das minhas filhas. Mas tenhamos calma. No Pasa Nada! O Expresso tem 49 anos e fará mais 49. Daremos a volta por cima mais fortes. A Impresa voltará mais forte e consciente dos riscos, tal como todos os outros grupos de comunicação.

Mas este caso leva-me a uma ideia paradoxal, uma ideia que me assusta. Nós vivemos numa grande desordem paradoxal: estamos a perder liberdade todos os dias no mundo real, mas no mundo virtual campeia a total libertinagem, a liberdade total e não ordenada pelo estado de direito, ou seja, não é liberdade, é a lei da selva. O mesmo indivíduo pode ser como cidadão um 8 securitário na realidade física e um 80 libertino no mundo virtual enquanto utilizador da internet. Eu, como cidadão, perco liberdades todos os dias para um clima cada vez mais securitário e censório por várias razões; mas, se for para a opacidade virtual, tenho uma liberdade total e anárquica e posso lançar ódio e caos à minha volta com enorme impunidade. Repare-se na pressão para se retirar o direito de voto a quem está com teste positivo à covid. O quê? Mas já elegemos a Graça Freitas para alguma coisa? Ainda somos uma democracia ou já somos uma monarquia médica nas mãos de três ou quatro médicos de saúde pública?

É esta a grande desordem. Na vida real, a pessoa x perde liberdades para o estado e para as burocracias como a DGS; essa mesma pessoa não consegue expressar no espaço público uma opinião válida e heterodoxa contra as ortodoxias vigentes; expressar a liberdade heterodoxa de pensamento é cada vez mais difícil, seja em que tema for, na gestão da covid, no racismo, no ambientalismo, etc, há uma pressão cada vez maior para se seguir uma única narrativa. Mas, na vida virtual, a pessoa y pode ser um canalha, um pirata, um odiador através de uma liberdade absoluta que obviamente deixa ser liberdade e passa a ser anarquia.

Voltarmos a ter a liberdade que já tivemos nas nossas vidas implica corrigir esta desordem.