Vereadora Laurinda Alves diz que obras já começaram e "prazos vão todos ser cumpridos"
16-04-2022 - 09:00
 • Ana Carrilho

Em entrevista à Renascença, a vereadora da Câmara de Lisboa Laurinda Alves defende que a Jornada Mundial da Juventude de 2023 é um acontecimento com impacto nacional, que deixará um "legado para as cidades, país e cidadãos que seria impossível de conseguir sem uma forte motivação, como já aconteceu com a Expo 98”.

Falta menos de ano e meio para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ Lisboa 2023), que deverá reunir em Lisboa e Loures, de 1 a 6 de agosto, mais de um milhão de jovens de todo o mundo. A presença do Papa Francisco marca este evento.

Até lá muito há a fazer para preparar o espaço que vai acolher a Jornada. Em entrevista à Renascença, a vereadora Laurinda Alves, responsável na Câmara de Lisboa pela organização do evento, revelou que as obras já começaram, com a construção da ponte que une os dois municípios, sobre o rio Trancão. Todos os prazos serão cumpridos, mesmo que isso implique” algum stress e trabalho em contrarrelógio”, diz a responsável autárquica.

Entretanto, nos próximos dias, Igreja, Governo e os municípios de Lisboa e Loures deverão assinar um memorando de entendimento que esclarece” quem faz o quê e quem paga o quê”. Laurinda Alves diz que isso é muito importante para o bom andamento do processo, até porque esta é uma realização “muito cara”. Ao mesmo tempo, frisa que “deixa um legado para as cidades, país e cidadãos que seria impossível de conseguir sem uma forte motivação, como já aconteceu com a Expo 98”.

Falta menos de ano e meio para a Jornada Mundial da Juventude. Já começaram as obras? Falava-se em março.

Já começou o movimento e isso é muito importante porque quando cá chegámos (à CML, sucedendo ao Executivo de Fernando Medina) só havia o processo de intenções e, neste momento, as coisas já estão a acontecer. E muito, muito em breve vai haver uma tomada de decisão pelo Conselho de Administração da SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana sobre o concurso de concessão e de construção para a reabilitação de todo aquele aterro sanitário de Beirolas. Aquilo vai ser um parque intermunicipal - Parque Intermunicipal Tejo-Trancão - o que implica uma ponte pedonal, implica a circulação das pessoas. Esta ponte está a ser construída pela EMEL.

Já está a ser construída?

Já está a ser construída e vai ligar os dois municípios, de Lisboa e de Loures. Estamos a menos de ano e meio do grande acontecimento, mas as coisas estão a andar e sobretudo estão bem coordenadas. Temos um coordenador, uma espécie de vice-almirante [Gouveia e Melo], que é o engenheiro Jorge Oliveira e Carmo. Cobre todas estas áreas e faz a coordenação técnica de todo o projeto, que exige uma articulação muito grande entre quatro entidades: os dois municípios, a Igreja (que é a dona da obra) e o Governo.

Era mesmo importante ter uma coordenação muito afinada, muito ao dia. É o que estamos a fazer. Temos reuniões semanais para fazer o ponto de situação, mas mais do que isso, há um avançar na obra que já se começa a ver. E sobretudo que tem de nos deixar descansados – a nós, à Igreja, ao Governo, ao Vaticano, ao Papa. Tenho a certeza que vai correr bem, mas também sei que vamos ter stress e muito, muito, esta noção de estar sempre a trabalhar em contrarrelógio.

Mas os prazos vão ser todos cumpridos.

Ai vão, vão. Os prazos vão todos ser cumpridos, é uma questão de princípio, de profissionalismo. Mas tem que haver um memorando de entendimento entre as quatro partes (Loures, Lisboa, Igreja e Governo) e é isso que vamos tentar já na segunda-feira, dia 18: ver quem faz o quê, quem paga o quê. Isto é muito importante para o bom andamento de todo o processo.

Há muitas coisas em que pensar: desde o próprio Parque, a ponte, o aterro, as questões da mobilidade, os écrans gigantes, as torres de som, a construção do palco, a sustentabilidade do projeto. Tudo isto envolve muitas pessoas. Não são só estas quatro entidades, implica muita gente na retaguarda a pensar, a desenhar, a fazer e refazer o que é preciso ir afinando. Implica também uma coordenação muito grande com Roma. Também temos feito consultas (informais) com pessoas que estiveram na organização de outras edições da Jornada Mundial da Juventude. Tudo isso ajuda e vai fazer com que os prazos sejam cumpridos.

Nós, portugueses, temos esta tradição de fazer, fazer bem feito, mas fazer em contrarrelógio. Não há muito tempo, mas há o tempo suficiente para que corra tudo bem.

Na sua opinião, qual é a parte mais complexa de gerir e de resolver? É a questão da descontaminação dos solos?

Essa parte está controlada e há estudos feitos, muito detalhados.

Há segurança absoluta.

Há segurança absoluta e total. Esses estudos foram, inclusive, mandados para Roma. É preciso que o Papa e toda a sua comitiva, todos nós, todos se sintam seguros. A questão da segurança está assegurada com todos os estudos do LNEC, que são “finos”. Foram feitos muitos estudos em muitas camadas; não é só um estudo genérico a dizer que há segurança. São estudos muito complexos, com relatórios muito detalhados, que foram enviados para Roma e que mostram que não há problemas de segurança. Essa parte, que seria complexa, está tratada.

Depois é moldar aquele terreno. Agora vão ser postas camadas e camadas de terra que vêm das obras do Metro e do Plano Geral de Drenagem de Lisboa. É muita terra que vai ser posta em cima daquele aterro. E depois, é tudo aquilo que é preciso fazer em termos de circulação das pessoas, também do Papamóvel, a construção do palco e do altar. Tudo isso nos ocupa neste momento e é o centro das nossas preocupações, não no sentido de estarmos inquietos, mas de estarmos desafiados a fazer o melhor.

Em termos de custos, já há alguma verba orçamentada?

Já está orçamentada e a ser gasta. A questão dos custos é importante porque a Igreja, o Governo e os dois municípios vão ter de os repartir. Nós temos de pensar que a Jornada Mundial da Juventude não é um acontecimento de Lisboa ou de Loures, é um acontecimento da Igreja, de Portugal.

A Portugal vão chegar mais de um milhão de jovens vindos de todo o mundo e mais do que isso, há muitas organizações (católicas e não católicas) que vão aproveitar esta JMJ para, antes ou depois, terem atividades no nosso país. Podem ser budistas, muçulmanos ou pessoas sem credo, mas que estão ligadas à juventude e que sabem que Portugal vai ser o centro mundial da juventude durante essa semana.

Portanto, temos de pensar na JMJ desta forma: é um país que acolhe, não são só duas cidades. Isto faz com que a aposta do Governo seja receber bem. Isso sempre nos foi comunicado, a aposta de Loures é fazer a sua parte e, em Lisboa, faremos a nossa parte. A Igreja pode contar com todos nós, mas temos de chegar a este memorando de entendimento.

Neste momento, quanto é que a Câmara de Lisboa já tem orçamentado?

Neste momento, 7 milhões mais 4 milhões, já estamos a pagar. A ponte da EMEL são quatro milhões (a ponte entre os municípios sobre o Rio Trancão). Nesta ponte, o que está também a ser pedido é a inclusão, por baixo, das tubagens de água, energia e de sinal. Os 7 milhões de euros são para a concessão, construção e modelação do terreno e para infraestruturas.

Tudo isto custa muito dinheiro e nós estamos muito conscientes que a JMJ é um acontecimento que nos envolve (Governo e municípios) e é uma obra da Igreja. Precisamos todos de contribuir, não só com o trabalho, mas também com o orçamento


Até porque vai ser um investimento para a cidade e para o país. Inicialmente é para a Jornada, mas fica para depois.

Exato, é um legado como a Expo 98. Toda aquela zona do Parque das Nações e da Expo, hoje, não seria o que é se não tivesse havido um motivo que fez com que se dinamizasse aquela zona. Aqui vai acontecer o mesmo, não em termos de edificado, de construção…

Aqui não vai haver urbanização?

Não, aqui o que é suposto fazer é um grande parque que serve as duas cidades e que as pessoas podem usar, usufruir com aquela proximidade do rio. Pode haver alguma construção que permaneça, ainda não vimos a versão final do palco. Mas imagine que tem uma parte que pode também servir, depois, para eventos, festivais. Esse será o tipo de construção que pode ficar, mas não uma construção como na Expo, com urbanização. Será um imenso jardim.

E o que é que tem de ficar mesmo pronto até à Jornada?

A ponte da EMEL, a reabilitação do aterro sanitário, a vedação para o rio (para segurança), a armazenagem desta terra que vem do Metro e do Plano de Drenagem de Lisboa; é preciso os assentamentos do aterro, o acompanhamento e monitorização, a construção do palco, a construção/infraestruturação do Parque Tejo, contratar os écrans. Os écrans gigantes são talvez dos elementos mais caros desta empreitada. É impressionante!

Mas parece que o Governo poderá comparticipar significativamente esta parte dos écrans, de som, multimédia e de infraestruturação.

Sim, até porque tem mais capacidade orçamental e, sobretudo, está mais habituado a este tipo de organizações que os municípios.

Como disse, é um evento muito caro. E ainda por cima, estamos numa altura em que os preços aumentam de dia para dia. Já sente esse aumento?

Onde se sentem os custos elevados e não é de agora … é de sempre, é em relação às torres multimédia e aos écrans. Em relação aos outros custos, ainda não se sente.

Mesmo na construção…

Não, ainda não se sente. Esperamos não sentir, mas há aqui um propósito comum de tentar construir bem, fazer o melhor possível, dentro dos orçamentos que foram sendo acertados.

Acha que é preciso algum regime de excecionalidade, como chegou a acontecer para a Expo, uma vez que os concursos públicos, em regra, demoram muito tempo? Acha que vai ser necessário para algumas das obras? E vê disponibilidade do Governo?

Acho que sim. Acho que se justifica porque a obra é grande e muito exigente, implica muitas camadas geológicas de trabalho. Tenho a certeza que haverá abertura do Governo para essa excecionalidade, sob pena de sem esse regime de exceção, os processos demorarem tanto, tanto que a Jornada podia acontecer e as coisas não estavam feitas. Portanto, tenho a certeza absoluta que essa abertura existe, assim como a compreensão.

Fica um legado: sem a Jornada Mundial da Juventude nada aconteceria com esta velocidade. Os lisboetas, os cidadãos de Loures, os portugueses também não teriam esta possibilidade de legado deste Parque Intermunicipal Tejo-Trancão. Tudo justifica, não só o acontecimento, mas tudo o que está ali a ser feito.

Mas tem sentido da parte do Governo a disponibilidade para ir mais além do que estava previsto inicialmente, de alguma forma, também para aliviar o fardo económico dos municípios e da Igreja? Porque, na prática, vai ser um momento enorme de promoção do país.

Sim, por isso eu dizia que esta JMJ não é de uma cidade, de Lisboa ou Loures ou das duas. É de um país inteiro. O que eu tenho sentido é uma vontade muito grande e uma abertura muito grande do Governo participar e de se corresponsabilizar. E também de partilhar todos estes custos que são muito grandes e muito expressivos. É isso que esperamos também ver refletido no memorando de entendimento.

Isto é um acontecimento de uma relevância extrema, não é de crentes para crentes, é ecuménico. Vão chegar jovens que nem sequer estão ligados a qualquer religião, vão acontecer muitas atividades antes e depois. Há organizações que já marcaram o mês antes da Jornada, aproveitam vir a Portugal e estar, depois, na Jornada. E são organizações que vão estar fora de Lisboa, em Tomar, no Algarve, no Porto, no Alentejo. Isso é muito interessante. Tenho a certeza que o Governo sabe isso e que sente isso como “seu”. Portanto, é só uma questão de nos entendermos.

A JMJ custa muito dinheiro. Por mais sustentável, por mais que queiramos fazer as coisas a poupar nos custos, não é possível quando falamos de segurança, de mobilidade (é uma cidade que vai estar sobrecarregada de pessoas e, portanto, as questões da mobilidade têm que estar resolvidas) e também não se pode poupar no custos quando estamos a falar de visibilidade. O Papa gosta de falar e de ver as pessoas, mas nem todas as pessoas vão conseguir vê-lo porque vai acabar por ser um pontinho lá ao longe. Por isso, estas torres multimédia com os grandes écrans têm de estar montadas, ser visíveis.

Também não se pode poupar custos nas casas de banho, nos pontos de água, não sabemos se vai estar um calor extremo mas é agosto, mesmo que haja vento, está calor e não há sombras. É uma obra em que, por mais que nós queiramos não gastar em excesso, aquilo em que é imperativo gastar, é caro. Portanto, tem de ser dividido, tem de ser repartido e vai acontecer, com certeza.

Esse memorando vai ser assinado dia 18?

Vamos conversar numa reunião agendada para segunda-feira, dia 18 e se possível, chegar a um entendimento nesse dia. Tem corrido muito bem. Estamos todos apostados em fazer o melhor, é um objetivo nacional e vai ser um tempo muito transformador.

Porque é um tempo pós-pandemia e, agora, desta guerra devastadora que não sabemos onde é que nos vai levar, quando é que vai acabar e como é que vai acabar.

Daqui a ano e meio o mundo já ia estar muito diferente só com a pandemia, mas vai estar muito diferente com esta guerra. Portanto vai ser uma possibilidade de pacificação interior e individual, mas também um tempo coletivo de pensar a paz, de pensar a forma de ir ao encontro do outro, de ver quem anda mais frágil à nossa volta. E o tema da Jornada é exatamente este: sair de nós para ir ao encontro do outro. E ali penso que vai ser como sempre foi na JMJ: um momento de grande exaltação, de grande comunhão, de grande transformação. As pessoas que vão a uma Jornada Mundial da Juventude dizem sempre que é um tempo que marca um “antes” e um “depois” na sua vida.

Que legado é que gostaria que ficasse da sua parte?

O meu legado… de ter sido uma pessoa facilitadora, que cumpriu com as suas responsabilidades e que conseguiu tornar possível tudo. Às vezes essa mediação é importante, ser feita com sentido de compromisso, mas também com bom senso, não cada um a puxar para o seu lado. Eu gosto de ouvir os outros e gosto de consensos e co- construir. Gostava muito que o meu legado fosse esse.

Mas também gostava que a partir deste momento grande para a juventude, Lisboa passasse a ser mais intergeracional e mais próxima, em que os mais jovens e os menos jovens se sentissem mais unidos e capazes de olhar uns para os outros, de se ajudarem mutuamente sem aquele abismo que, por vezes, vemos entre gerações. Gostava de ser alguém que esteve numa atitude de promover essa ligação.

E aquele Parque, pode também ser facilitador dessa ligação intergeracional?

Acho que pode porque as pessoas mais velhas vão querer estar lá, mesmo sabendo que é a Jornada Mundial da Juventude. Até podemos criar aqui uma espécie de “buddy system”, como se faz no mergulho. Ninguém faz sem um amigo. Podíamos fazer isso aqui. Não digo com um milhão de jovens a serem “buddies de um milhão de pessoas mais velhas, mas em alguns grupos podia ser feito. Seria também um grande caminho para uma pacificação interior, para uma paz de que estamos a precisar. Esse protegermo-nos mutuamente e ajudarmo-nos mutuamente e sobretudo, entre gerações, seria muito bom.

Sente que a população da cidade de Lisboa já está sensibilizada para a Jornada? Ou é preciso fazer trabalho?

A população que tem jovens em casa ou que de alguma forma está ligada à organização, seja de uma forma voluntária ou ligada a uma paróquia, já se começa a preparar e é uma preparação feliz.

O resto da população ainda “não caiu na conta” que em 2023, de 1 a 6 de agosto, a cidade vai ter mais um milhão ou um milhão e meio de jovens e de outras pessoas, vindas de diversas partes do mundo.

Vai haver comunicação, informação. Penso o que é que poderá acontecer. É um mês de verão, muitas das pessoas que trabalham ou vivem em Lisboa, não estão cá e acho que vai haver a possibilidade de estar ou não estar. E isso é bom porque quem não quiser estar naquilo que acha que pode ser uma grande confusão, pode tirar as suas férias ou sair de Lisboa.

Os que cá estão, penso que vão ser muito sensíveis a uma vibração muito boa. Quando vamos a um sítio onde há muitos jovens, há sempre alegria, há sempre descontração, também pode haver desarrumação e um bocado mais de lixo nas ruas, mas há uma vibração completamente diferente. Isso vai trazer uma alegria natural e uma abertura.

Aliás, há muitas famílias, muitos lisboetas, que já estão inscritos para receber em casa jovens que vêm de todo o mundo. As pessoas vão misturar-se muito, não apenas nas ruas, mas também, nas famílias. Isso vai ser muito bonito.