Paulo Mota Pinto quer Estado a devolver o que recebeu a mais "se execução orçamental correr melhor que o previsto"
28-04-2022 - 21:30
 • Susana Madureira Martins (Renascença) , Sofia Rodrigues (Público)

Líder parlamentar do PSD, que faz parte da direção alargada de Rui Rio, admite que o partido deveria ter sido mais “claro” a comunicar as “linhas vermelhas” ao Chega.

Paulo Mota Pinto defende, em entrevista ao programa Hora da Verdade, da Renascença e do jornal 'Público', que, caso a execução orçamental corra bem, o Governo deve aplicar um mecanismo para devolver poder de compra às famílias.

Em relação ao Chega, antes das legislativas disse na Renascença que o PSD podia ter um governo minoritário viabilizado pelo partido de André Ventura sem que isso tivesse um preço político para o PSD. Continua a achar que uma aproximação ao Chega não tem custos políticos para o seu partido?

Uma coisa é um preço, outra coisa é um custo. Um preço é algo acordado e que se paga. O PSD nunca pagaria nenhum preço em troca disso e foi o que quis dizer. Saber se isso tem custos políticos, eu acho que pode ter. Aliás, de certa forma, o resultado eleitoral também mostra isso. A ideia de que o PSD só conseguiria chegar ao poder viabilizado pelo Chega é algo que terá levado votantes do Bloco e PCP a votar no PS.

Pelo que percebi das suas palavras, a estratégia do PSD nas legislativas falhou ao não clarificar totalmente qual seria a posição sobre o Chega.

A estratégia do PSD nas legislativas de posicionamento político do partido ao centro, a meu ver, foi correta. Há aspectos do discurso político que deviam ter sido mais clarificadores. Se quiser dizer que foi um falhanço, muito bem.

A falta de clareza em relação ao Chega.

Reconheço que essa distinção pode ser um pouco subtil, na política essas subtilezas não são fáceis de passar. A perceção de que o governo PSD teria de ser viabilizado pelo Chega, uma perceção objetiva independentemente do que nós disséssemos, resultava dos dados numéricos das sondagens, era difícil de a contrariar, mas admito que talvez pudéssemos ter sido mais claros em afirmar que sim, há linhas vermelhas. Claro que há linhas vermelhas com propostas inaceitáveis, xenófobas.

Essa posição de não colocar um cordão sanitário ao Chega é totalmente contrária à posição de Jorge Moreira da Silva, um dos candidatos à liderança do PSD. Pergunto-lhe se se veria a trabalhar com ele se for eleito?

Não é tão contrária como está a dizer. Sou sempre contrário a excluir pessoas ou grupos de pessoas em si mesmos, mas não sou contrário a excluir ideias, propostas e pessoas enquanto defendem essas propostas. Há uma base comum bastante próxima desse discurso. Com certeza, o candidato que referiu não quer excluir pessoas ou o partido em si mesmo se mudar de discurso. Admito que haja uma necessidade política de afirmar, isso é uma questão de tática e de estratégia política, estou disponível para aceitar esse tipo de posicionamento tático do PSD.

O modelo dos debates quinzenais com o primeiro-ministro vai ser repensado. Deviam passar a ser mensais?

A experiência mostrou que a abolição dos debates quinzenais foi mal recebida na opinião pública, na opinião publicada, que se sente falta de um regresso de um debate com uma periodicidade maior. A minha opção pessoal seria instituir debates mensais porque a periodicidade quinzenal perturba o trabalho do Governo e pode até dar margem a uma espécie de política-espetáculo, que é pouco esclarecedora. Depois, de acordo com a experiência, podíamos regressar aos quinzenais ou manter.

Em relação ao Orçamento do Estado, em que áreas o PSD vai apresentar alterações?

Globalmente, o Orçamento do Estado é um mau orçamento. É o mesmo que António Costa mostrou no fim do debate com Rui Rio e o mundo mudou entretanto, uma guerra, alteração nos preços dos combustíveis, etc, e mais 4 ou 5% de inflação sem que isso esteja refletido nas dotações orçamentais e nos salários. Com certeza apresentaremos propostas de atualização de escalões do IRS, o englobamento das mais-valias.

Depois, também na área da Defesa, pensamos que é fundamental não só corresponder ao apelo do Presidente da República mas a uma necessidade nacional e internacional. Apresentar a mesma dotação para a Defesa, e até com menos 800 mil euros, é algo incompreensível. É talvez o exemplo mais claro que o dr. António Costa e quem fez este Orçamento não considerou a evolução do mundo desde outubro de 2021. Não apresentaremos propostas de redução de receita ou aumento de despesa desmesurado sem explicar contrapartidas.

Vão ter algo sobre aumento de salários?

António Costa é que prometeu a subida do salário médio e a do salário mínimo para 2026 para 900 euros. Com as perspetivas de inflação, 900 euros nessa altura vão ser mil e tal euros, o que ele deve responder é se aumentará para esse valor. Ao referir-se apenas a um valor nominal, com uma inflação muito menor em termos reais, está a assumir que engana os portugueses com uma ilusão monetária.

Não queremos alimentar a espiral inflacionista mas temos de ver como é que a conseguimos mitigar.

Há mecanismos para assegurar que as pessoas não perdem poder de compra. Por exemplo, se a execução orçamental correr melhor do que o previsto, tal como tem acontecido nos últimos anos, o Estado que se comprometa a devolver então, a posteriori, o que recebeu a mais. Porque se não temos o Estado a receber a mais num ano em que, afinal, as pessoas receberam menos, a enriquecer-se com a inflação à custa da perda de poder de compra dos cidadãos. Isso nós não queremos. Não vemos esses mecanismos no Orçamento.