Nunca em Portugal uma investigação histórica tinha recebido um apoio tão elevado. O Conselho Europeu de Investigação acaba de atribuir 1,6 milhões de euros a Maria de Lurdes Rosa, uma historiadora portuguesa que se dedica ao estudo dos morgados nos séculos XIV ao século XVII, numa perspetiva comparada, em Portugal, no espaço atlântico e nas sociedades da Europa do sul.
Durante os próximos cinco anos, a bolsa vai permitir a contratação de cinco investigadores com a missão de estudar arquivos públicos e privados, dispersos por todo o país, especialmente os que ainda são propriedade de famílias e que nunca foram estudados pelos historiadores.
O projeto tem como tarefa central a constituição de uma enorme base de dados documental, que ficará disponível, em acesso aberto. Aliás, Maria de Lurdes Rosa, que é professora da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, coordena já o portal Arquivos de Família, que estuda esta documentação no âmbito do inventário histórico, da defesa do património e do impacto social na ciência. É também responsável por uma base de dados que reúne as descrições dos inventários dos arquivos de família
Só 10% das candidaturas são distinguidas
O objetivo do trabalho, iniciado em 2008, é, simultaneamente, realizar estudos históricos a partir do material recolhido de forma a traçar um retrato da organização da sociedade daquela época através dos morgados, uma forma de organização social extinta no século XIX.
Maria de Lurdes Rosa é professora da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e investigadora do Instituto de Estudos Medievais. Esta bolsa é a primeira atribuída pelo Conselho Europeu de Investigação a uma cientista portuguesa, na categoria de investigadores com 7 a doze anos de experiência após o doutoramento, na área da História.
Estas bolsas apoiam cientistas de topo, selecionados pelas suas ideias inovadoras e pela qualidade do seu trabalho. O processo de avaliação dura vários meses e só 10 por cento das candidaturas são aprovadas. O Conselho Europeu de Investigação é um organismo criado pela Comissão Europeia para estimular a excelência científica na Europa.
7 mil morgadios à espera de serem descobertos
Entre os séculos XIV e XVII terão sido fundados cerca de sete mil morgados em Portugal continental e nas colónias. O morgado ou morgadio era uma forma institucional e jurídica de base territorial da nobreza. Não podia ser objeto de partilha e era transmitido ao primogénito varão ou, na ausência de um filho, à filha mais velha. Isso permitia perpetuar a linhagem e manter o território íntegro. Só com autorização do rei era possível vender ou trocar parte desses bens, ou extinguir o morgadio.
A instituição de morgados desenvolveu-se a partir do século XIII, mas as leis mais importantes surgiram bastante mais tarde, no século XVI. No século XVIII, começaram a ser vistos como entraves ao desenvolvimento do país e fonte de graves problemas sociais, em boa parte devido ao empobrecimento dos filhos não primogénitos.
Os morgados foram extintos no reinado de D. Luís I, em1863, subsistindo, no entanto, o vínculo da Casa de Bragança, destinado ao herdeiro da Coroa e que viria a perdurar até 1910.