Vinte anos de Missão País. "Somos chamados a liderar pelo exemplo"
10-01-2023 - 06:07
 • Ângela Roque

De 15 de janeiro até meados de março, mais de quatro mil jovens universitários vão fazer missão em 64 localidades do país. A Renascença conversou com os chefes nacionais da edição 2023, que assinala duas décadas do projeto e que este ano servirá também de preparação para a Jornada Mundial da Juventude.

A Missão País (MP) é uma das iniciativas mais emblemáticas e marcantes da Igreja em Portugal. Nasceu em 2003, com apenas 21 estudantes, e duas décadas depois continua a crescer em termos de inscrições. Este ano vai envolver mais de quatro mil estudantes universitários, espalhados em 64 missões, mas os que queriam participar eram muitos mais.

“Recebemos mais de 5.500 candidaturas, e temos acima de 4.000 inscritos… O diferencial são pessoas em lista de espera, o que só demonstra a vontade grande que há em fazer missão, mas ainda não conseguimos dar resposta à quantidade de missionários que quer participar”, contam à Renascença os chefes nacionais, Tomás Rodrigues e Mafalda Correia de Sá.

Alunos de mestrado – a Mafalda em Psicologia Social e Cognitiva e o Tomás em Direito Forense - falam da “experiência marcante” que foi para ambos fazer MP, que “é mais do que um simples projeto de voluntariado”. Como chefes nacionais, admitem que é uma “responsabilidade acrescida” assumir o comando num momento tão especial: celebram o aniversário da Missão País em ano de Jornada Mundial da Juventude (JMJ), e já com normalidade. “O ano passado foi ainda tudo a meio gás, por causa da pandemia, mas este ano estamos muito contentes por podermos partir sem restrições (sanitárias), pelo menos até ao momento”, sublinham.

A escolha do lema para cada edição da Missão País é um processo refletido e “rezado”. O deste ano é “Alegra-te! Ele está contigo”, e foi inspirado no Evangelho da Anunciação. “Tem tudo a ver, não é? Esta alegria do encontro que vai ser a JMJ, a ideia do caminhar está muito presente”, refere Mafalda.

Tomás lembra que “muita da beleza da Missão País está na simplicidade daquilo que fazemos”, este ano com a JMJ no horizonte, e conscientes do contexto difícil em que o mundo se encontra, com a guerra na Ucrânia. “Somos constantemente chamados à liderança, à ideia de sermos líderes católicos, não no sentido político, mas da liderança pessoal e diária, seja na escola, no trabalho, ou connosco mesmos. Somos chamados a liderar pelo exemplo, a darmos testemunho”.

Mafalda lembra que o Papa Francisco pediu aos jovens que na preparação para a JMJ fossem missionários. “É bom sentir que esse contributo podemos dar”.

Uma marca na Igreja em Portugal

Para assinalar os 20 anos da Missão País foi criado um podcast que dá a conhecer as histórias de vida de quem já participou no projeto.

“Começámos em novembro, está para sair o quinto episódio”, conta Mafalda Correia de Sá. A ideia é dar a conhecer as “histórias de quem fez missão nestas duas décadas”, e há bons testemunhos do impacto que o projeto tem na vida dos jovens. Tomás dá o exemplo de uma estudante que “quando era mais nova foi missionada na localidade onde vivia, a Missão País foi lá, e gostou tanto que quando entrou na faculdade fez missão, e este ano é Chefe de Oração, o que é bonito. Mostra como a MP impacta gerações”.

Este ano a tradicional Missa de envio não vai decorrer só em Lisboa. “Num exercício de unidade nacional, dividimos os símbolos da Missão País (Mãe Peregrina, Cristo Sorriso, a Cruz e os Terços missionários) pelo Porto, Coimbra, Lisboa e Madeira, e no dia 12 de janeiro, à mesma hora (19h30) irá celebrar-se a Missa de envio nesses locais”. No caso de Lisboa, irá decorrer no Santuário de Shoenstatt, no Restelo, “para poderem conhecer o sítio de onde partiu originalmente a missão (em 2003), e onde está a Mãe Peregrina que nos acompanha”, explica Mafalda.

A Missão País decorre sempre nesta altura de pausa letiva, entre semestres. De janeiro até meados de março, consoante a faculdade, os jovens partem por uma semana para uma localidade diferente, onde desenvolvem ações de evangelização e solidariedade. O objetivo é que façam missão no mesmo local por três anos consecutivos.

Durante a missão estão em contacto direto com a população, através da atividade ‘porta a porta’, mas vão também a escolas, lares e centros de dia. “Levamos a Mãe Peregrina, conversamos com as pessoas, fazemos companhia”, explicam. No final apresentam à comunidade uma peça teatral. “É o ponto alto da semana, muito aguardado quer pela comunidade, quer pelos missionários”, afirma Tomás, que para além de estudar Direito, faz Stand Up Comedy. Em 2022 chefiou área do teatro na Missão País, e garante que também é um “instrumento de oração”.


Um projeto católico, mas aberto a todos

A capacidade que a Missão País tem tido de chegar mesmo a quem não é católico, é destacada pelos dois chefes nacionais da edição 2023. “Acho que é um dos grandes desafios do projeto, dar-se a conhecer ao mundo universitário e permitir aos jovens continuarem a ser missionários no seu dia a dia e em ações concretas”, sublinha Tomás Rodrigues, que fala da importância das “relações que se criam” para lá da missão, e das amizades que ficam para a vida. “Fiz grandes amigos! Costumo dizer que, se me casasse hoje, estariam no meu casamento”.

Um relação, diz, que “muda por completo a vivência de cada um na faculdade, pelas pessoas que se conhece, com quem se está, pelas experiências que se partilham depois desta semana, que é sempre intensa!”.

Da Missão País, em que participam vários movimentos juvenis da Igreja (como as Equipas de Jovens de Nossa Senhora, o movimento de Shoenstatt, o Comunhão e Libertação, etc), nasceram os Núcleos de Estudantes Católicos (NEC) em várias faculdades. “Temos tido capacidade de mostrar aos estudantes que existem alternativas para quem tem diferentes níveis de caminhada na fé”. E têm chegado a muitos não crentes.

“É uma coisa que sempre me fascinou, no sentido em que a semana da missão retira sempre dias de férias aos estudantes. Na passagem de semestres há uma semana de pausa, e é aí que a missão encaixa. E fisicamente é esgotante, é puxado, mas mentalmente é muito enriquecedor. Ver católicos com predisposição para fazer isto, já é bonito. Ver não crentes que são desafiados a retirar esta semana de férias e vão, é uma coisa que mexe connosco!”, afirma Tomás.

Para Mafalda Correia de Sá este é mesmo um projeto “muito marcante”, que mostra que a Igreja “não é antiquada, ou só de pessoas mais velhas. A Igreja é jovem, a Igreja somos todos nós, e acho que é um testemunho mesmo bonito ver mais de 4.000 jovens a terem esta vontade de partir em missão”. Tomás concorda. “Esta semana proporciona que se viva Cristo, e tenho a certeza de que isso impacta a vida de qualquer um”.