Nada indica que tenham terminado as execuções em massa na prisão de Saydnaya, na Síria. No dia em que a Amnistia Internacional lançou um relatório indicando que até 13 mil pessoas podem ter sido executadas numa só prisão controlada pelo regime de Bashar al-Assad, a Renascença falou com um dos autores do estudo.
Ao telefone a partir de Beirute, no Líbano, Lynn Maalouf explica como se chegou à estimativa de 5 mil a 13 mil vítimas de enforcamento e acrescenta que, apesar da proximidade com a Síria, os funcionários da Amnistia não temem repercussões.
O vosso relatório diz que podem ter sido executadas 13 mil pessoas. Como chegaram a estes números? Existe margem de erro? O valor real pode ser maior ou mais baixo?
O que dizemos é que os números estarão entre os 5 mil e os 13 mil. E estes números baseiam-se numa estimativa que por sua vez se baseia nas conclusões e na informação que recolhemos ao longo da investigação.
O que averiguámos foi que houve um processo de execuções extra-judiciais que tiveram lugar uma a duas vezes por semana. Calculámos com base nessa informação e na informação de que cada vez que havia execuções eram grupos de 20 a 50 pessoas.
Foi com base nisso que chegámos à estimativa de 5 mil a 13 mil pessoas que poderão ter sido mortas.
Já pedimos uma investigação independente sobre estas execuções em massa, para determinar os factos.
Como é que entrevistaram as pessoas? Estamos a falar de pessoas que fugiram da Síria ou ainda lá se encontram?
A Amnistia Internacional não tem acesso à Síria há algum tempo. Por isso todas as entrevistas foram conduzidas na Turquia, algumas na Europa e noutros lugares.
Portanto, é tudo entrevistas a pessoas que fugiram da Síria. São ex-reclusos, juízes, funcionários da prisão ou guardas prisionais que trabalharam em Saydnaya durante o período a que diz respeito o nosso relatório. Recolhemos ainda dados de peritos em detenção e de outras organizações com as quais colaboramos.
Tanto quanto sabe, estas execuções ainda se mantém?
Não temos informação sobre isso. A informação de que dispomos cobre o período de 2011 até 2015, altura em que algumas das principais testemunhas com quem falámos deixaram de trabalhar em Saydnaya.
Por isso, não temos informação de que isto se mantenha, mas o que dizemos é que não temos qualquer razão para acreditar que os enforcamentos pararam.
Trabalham em Beirute, bem perto da Síria. Não temem repercussões da parte do Estado sírio ou dos seus aliados libaneses?
O escritório regional da Amnistia Internacional começou a trabalhar no Verão passado. Não temos sofrido quaisquer ameaças até agora e não vemos qualquer razão para deixar de fazer o trabalho que estamos a fazer.
O que fazemos é documentar estes factos e emitir recomendações. É indiferente se o fazemos daqui de Beirute ou de Londres. Esperamos poder colaborar com as autoridades para abordar de forma significativa as recomendações que fazemos.
Mas já antes de nós houve outras organizações que publicaram relatórios bem mais graves que este e tanto quanto sabemos não houve qualquer preocupação de segurança.
Tanto quanto sabem, são só as forças armadas da Síria que estão envolvidas ou há também envolvimento de milícias aliadas que, como sabemos, combatem ao lado das forças pró-regime?
Estamos a falar de violações que ocorrem em Saydnaya, uma prisão controlada pelo Governo. E dizemos que estas práticas não poderiam ter ocorrido sem o conhecimento das autoridades ao mais alto nível.
Mas tanto quanto sabemos, não há milícias a operar nesta prisão, nem aliados do Governo sírio. Estamos a pedir aos aliados do Governo sírio, nomeadamente à Rússia, Irão e agora aos Estados Unidos, para exercerem toda a pressão possível sobre o Governo sírio, de forma a permitir a entrada de investigadores independentes nas prisões sírias.