Paulo Morais. "A governação de Sócrates nas PPP rodoviárias foi marcada pela corrupção"
10-05-2018 - 14:00
 • Sérgio Costa

O antigo candidato presidencial e dinamizador da associação Frente Cívica não tem dúvidas das ilegalidades cometidas no processo das PPP, restando "apurar quem foram os responsáveis".

Paulo Morais, um dos dinamizadores da associação Frente Cívica e antigo candidato presidencial, considera que as ilegalidades no processo das parcerias público-privadas (PPP) rodoviárias são "claras", restando ficar a saber-se com rigor quem as promoveu.

De acordo com a revista "Sábado", os ex-ministros Mário Lino e António Mendonça e o ex-secretário de Estado Paulo Campos são visados na investigação e estiveram sob escuta telefónica e Sérgio Azevedo lembra que o relatório final da comissão de inquérito já apontava para indícios preocupantes.

A revista diz que estão em causa 11 parcerias publico-privadas referentes à construção e concessão da exploração de auto-estradas, de norte a sul do país.

Acredita que a investigação em curso possa vir a envolver, judicialmente, altos responsáveis políticos e governamentais?

Sobre esta matéria, não haja quaisquer dúvidas: a governação de Sócrates, relativamente aos processos das PPP rodoviárias, foi uma governação marcada pela corrupção. Por diversas razões. Em primeiro lugar, as PPP são ruinosas, como, aliás, toda a gente diz. Pessoas de todos os partidos e quadrantes têm assumido as PPP como ruinosas e elas são ruinosas porque, desde logo, os contratos assinados conferiram aos concessionários rendas com taxas internas de rentabilidade na ordem dos 14/15/16 por cento. É obsceno que o Estado português assine contratos com privados em que lhes garante taxas de rentabilidade desta dimensão. É evidente que contratos tão prejudiciais ao Estado só podem ser assinados pelo Estado ou se os órgãos do Estado forem completamente incompetentes e loucos ou, então, se forem corruptos.

Mas essa taxa de rentabilidade, por si só, é uma ilegalidade?

Não é ilegalidade, mas há, claramente, indícios de crimes - que os procuradores terão de investigar - de prevaricação, na medida em que alguém no Estado utiliza um lugar, um mandato confiado pelo povo para benefício particular. Mas, a acrescer a isto, todos os anos também houve, para além destas taxas de rentabilidade, indemnizações compensatórias aos concessionários, que, por sua vez, também configuravam centenas de milhões de euros. Ou seja, ao abrigo de um mecanismo a que pomposamente se chama "acordos para o reequilíbrio financeiro", o Estado concedeu aos privados mais centenas de milhares de euros. Ora, na época dos governos de Sócrates, assinava-se estes contratos e, na medida em que ninguém conhecia a dimensão dos pagamentos, também não se podia refletir isto nos Orçamentos dos anos subsequentes. E isto vai até 2035, 2036. À época, ninguém sabia as responsabilidades que o Estado ia ter.

As PPP são ruinosas porque as rendas são obscenas e permitem taxas de rentabilidade enormes aos concessionários privados. Além disso, são dadas compensações de milhares de milhões ao longo dos anos. Acresce a tudo isto que são ilegais, porque têm anexos confidenciais, não cumprem a lei de enquadramento orçamental, não têm comprador público como a lei exige. Obviamente, as ilegalidades deste processo são imensas e, felizmente, parece que vão ser, finalmente, constituídos arguidos, com as acusações que, naturalmente, o Ministério Público entender. Mas é fundamental que haja julgamentos justos, passe a redundância, e que se perceba o crime económico que as PPP constituíram e que representam, ainda hoje, para as finanças públicas portuguesas.

Estamos a falar ainda de suspeitas e, enfim, de fortes indícios que acabou de descrever...

Deixe-me dizer-lhe: isto não são indícios, isto são ilegalidades. Não está é claro quem é que é o responsável, quem é o culpado. Há que apurar quem foram os responsáveis primeiros por estas ilegalidades, que são objetivas e que foram cometidas durante a governação do engenheiro Sócrates.

Perante as ilegalidades que descreveu, é reforçada a necessidade de acabar de forma imediata com as PPP rodoviárias?

Naturalmente. Há um provérbio português que diz que "o que nasce torto tarde ou nunca se endireita" e, de facto, as PPP rodoviárias já não têm outra solução que não seja a extinção definitiva dos contratos, porque as consequências destes maus negócios feitos há mais de dez anos refletem-se ainda hoje. Hoje mesmo, em 2018, as PPP rodoviárias rodoviárias estão avaliadas em 5,5 mil milhões de euros e os contratos prevêem que o Estado português venha a pagar, por 5,5 mil milhões, 18 mil milhões. Isso é, obviamente, inconcebível.

Qual é a forma de resolver este problema? Extinguir os contratos de parceria público-privada, sendo naturalmente entregues ao Estado os contratos e sendo indemnizados os concessionários pelo valor justo do património ao momento em que a lei entra em vigor.