O andaime e a casa
09-05-2016 - 07:59

O tempo que vivemos satisfaz-se – equivocadamente, a meu ver – com a preocupação em criar consumidores e utilizadores mais ou menos competentes das tecnologias e das redes. Porém, esta hipervalorização das destrezas instrumentais é semelhante a alguém que mete pés ao caminho, mas que não sabe para onde quer ir.

A comunicação humana é uma ponte e, na medida em que o é, ela “tem o poder de criar pontes, favorecer o encontro e a inclusão, enriquecendo assim a sociedade”. Esta é uma primeira proposta da mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial das Comunicações Sociais, que ontem se celebrou, mas cuja riqueza não cabe em um só dia.

A capacidade de escutar o outro é o segundo desafio colocado pela mensagem. Para escutar, não é bastante que a voz e o olhar do outro cheguem até nós, não basta ouvir. A escuta supõe o acolhimento e a partilha.

Estreitamente ligada com a escuta está – e este seria o terceiro ponto a sublinhar - a proximidade enquanto fruto da comunicação. “Uma proximidade que cuida, conforta, cura, acompanha e faz festa”.

Para quem reduz a comunicação à informação ou ao mero uso das ferramentas da comunicação, estamos aqui perante um desafio de enorme alcance cultural e humano. Ligar o que está separado, escutar quem precisa de atenção e aproximar-se dos que andam perdidos e descartados ou são como “lugares mal situados” (como no poema de Daniel Faria) supõe uma aprendizagem que começa em casa e se prolonga ao longo da vida toda. Exige atenção e cultivo permanentes.

Por estes dias, vieram a público resultados de (mais) um estudo que evidenciava quão dependentes estão os mais jovens relativamente aos ecrãs. Para muitos deles, o smartphone é como uma prótese do próprio corpo, manuseado com destreza e sem o qual já não conseguem viver. Há quem se satisfaça com isso, tomando o andaime pela construção. Falta, porém, o mais importante, que é dar sentido e horizonte àquilo que as tecnologias permitem, mas que de per si não garantem.

A pastoral da comunicação social da Igreja carece, entre nós, de um cuidado nesta formação e de um investimento com este horizonte. O tempo que vivemos satisfaz-se – equivocadamente, a meu ver – com a preocupação em criar consumidores e utilizadores mais ou menos competentes das tecnologias e das redes. Porém, esta hipervalorização das destrezas instrumentais é semelhante a alguém que mete pés ao caminho, mas que não sabe para onde quer ir. Cuida de montar os andaimes, mas, em tal azáfama, esquece-se de construir a casa. São precisos e iniciativas que procurem as pessoas que se escondem por detrás dos consumidores.