Semana de quatro dias arranca no privado sem cortes salariais
29-10-2022 - 17:42
 • Ana Carrilho

A experiência-piloto da semana de quatro dias, a decorrer em 2023, vai ser aberta a todas as empresas do setor privado, mas não vão receber qualquer contrapartida financeira.

Na quarta-feira, a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho vai discutir com os parceiros sociais a proposta sobre a experiência-piloto da “Semana de quatro dias”.

Segundo o documento a que a Renascença teve acesso, aderem as empresas privadas que quiserem, sem qualquer apoio financeiro do Estado. Não podem cortar os salários e número de horas semanais de trabalho tem de baixar, efetivamente. Se correr bem, o teste é alargado à Administração Pública.

O objetivo é que se registem ganhos de qualidade de vida para os trabalhadores e de competitividade, para as empresas. A proposta do governo inspirou-se em modelos internacionais já em vigor.

Experiência-piloto avança com os privados genuinamente interessados

O objetivo da experiência-piloto é a avaliação credível dos impactos que a semana de trabalho de quatro dias tem nas empresas, trabalhadores e nas suas famílias. E por isso é que, num primeiro momento, não se pretende chegar a um grande número de organizações, justifica o governo no documento de oito páginas que já fez chegar aos parceiros sociais e quer discutir dia 2 na Concertação Social.

Flexível, adaptável, que seja capaz de recolher o máximo de informação, com o mínimo de custos é o que se pretende deste modelo, que vai ser testado em três fases.

Primeiro, para todas as empresas do setor privado que o desejarem, durante seis meses. Sem contrapartidas financeiras do Estado; apenas com apoio técnico e administrativo para apoiar a transição.

Durante três a quatro meses, estão previstas sessões de esclarecimento sobre o processo. No final, as empresas que o desejarem, registam-se para participar no projeto -piloto da semana de quatro dias durante seis meses, de forma voluntária e reversível e com o apoio expresso dos trabalhadores. É nesta fase que o Executivo espera algumas desistências.

A experiência não pode envolver corte salarial e implica uma redução do número de horas de trabalho semanais. O tempo a garantir deverá ser definido entre a empresa e os trabalhadores, abrangendo a sua grande maioria. Só nas grandes empresas é que poderá ser testado apenas em alguns estabelecimentos ou departamentos.

No final do período, está previsto um mês de reflexão, para as administrações decidirem se vale a pena apostar na semana de quatro dias, se voltam a trabalhar cinco dias ou adotam um modelo híbrido.

Para o Executivo, o facto de não haver qualquer ajuda financeira, faz com que apenas as empresas que estão genuinamente interessadas na solução adiram. Ainda assim, o documento refere que se as aderentes forem menos de 40, a experiência-piloto é feita com todas e a avaliação irá comparar resultados antes-durante-depois. Se a adesão for grande, as empresas serão divididas em dois grupos, um de tratamento e outro de controlo.

Experiência-piloto vai avaliar benefícios para os trabalhadores e empresas

Efeitos no bem-estar dos trabalhadores, qualidade de vida, saúde mental e física, nível de compromisso com a empresa, satisfação com o trabalho e intenção de permanecer na organização, são alguns dos parâmetros que vão ser tidos em conta na avaliação à experiência-piloto. No entanto, a proposta considera que também é importante estudar o uso que os trabalhadores dão aos seus dias de descanso, para perceber como e onde é usado o tempo não trabalhado e se há redução nos custos com transportes.

Do lado das empresas, o foco estará na produtividade, competitividade, custos intermédios e lucros, mas também nos efeitos nas taxas de absentismo de curta e longa duração, na capacidade de recrutamento, na organização de processos internos, nos indicadores financeiros e não financeiros de desempenho, na incidência de acidentes de trabalho e consumo de bens intermédios, quer matérias-primas quer gastos de energia.

A avaliação será feita através de inquéritos: antes, durante e depois de concluída a experiência.

O processo começa agora com a manifestação de interesses e prolonga-se até ao primeiro trimestre de 2024, com o inquérito pós-conclusão.

Enquanto decorre a experiênca-piloto, o governo quer fazer uma discussão alargada sobre a duração e a organização do tempo de trabalho, assim como do uso do tempo em Portugal.

Se correr bem no setor privado, experiência alarga-se à Administração Pública

Numa segunda fase, se a evolução da experiência-piloto no setor privado for satisfatória, poderá ser alargada ao setor público. No entanto, o Governo alerta que será necessária uma adaptação de instrumentos de avaliação dos impactos e estará sujeita a condicionantes jurídicas e orçamentais.

E finalmente, num terceiro momento, o governo manifesta vontade de testar um modelo mais ambicioso, em que um grupo de empresas adotam as mudanças e outro serve de controlo. É semelhante ao que está a ser testado em Espanha, mas fica mais caro, exige apoios às empresas e só poderá ser testado se houver condições de exequibilidade tiver suficiente adesão.