Teletrabalho. Quais os direitos e deveres de quem trabalha a partir de casa?
23-09-2020 - 11:51
 • Marina Pimentel

O Código de Trabalho já prevê o regime de teletrabalho, mas não de uma maneira que abranja um recurso mais intensivo a este modo de trabalho. Saiba que alterações quer o Governo (e o PS) introduzir nesta área.

Trabalhar em casa não significa menos direitos do que para os colegas que trabalham no regime presencial. Mas também não significa mais benefícios. Levar o escritório para casa pode poupar custos às empresas e permite maior flexibilidade aos trabalhadores, mas há condições que têm de estar garantidas.

Hoje, face à necessidade de impor distanciamento social também no local de trabalho, muitas empresas optaram pelo teletrabalho, seja parcial seja na totalidade.

E é esta boa adesão dos trabalhadores a esta modalidade de trabalho – que antes era residual – leva agora o PS e o Governo a querem introduzir alterações no regime previsto no Código do Trabalho. Além de que, como se tem dito, a Covid-19 veio para durar.

O processo está ainda no princípio. O que se seguirá é ouvir os parceiros sociais e só depois, dizem fontes da bancada da maioria à Renascença, se avançará para um projeto legislativo, que vai mexer nos pontos sensíveis, nomeadamente nas situações mistas ou híbridas – os casos em que o trabalhador ora está presencialmente ora trabalha a partir de casa, que é uma situação que não está regulamentada.

Mas vamos por pontos.

1. Propriedade dos meios usados no teletrabalho

Muitos trabalhadores estão a trabalhar a partir de casa com os seus próprios meios de trabalho, mas o Código Laboral é bem claro: a não ser que o contrato de trabalho assinado entre a entidade patronal e o trabalhador (porque é obrigatório haver um contrato para o teletrabalho) estipule coisa diferente, a propriedade dos meios informáticos e de comunicação usados é da entidade patronal e os custos da sua manutenção também.

Estas normas não são só a benefício do trabalhador, são também da empresa. Pense-se nas questões de cibersegurança: um computador privado sem os sistemas de segurança pode rebentar com a segurança de uma empresa num ápice.

2. Os custos consumíveis

Com a internet e a eletricidade é a mesma questão – está, de resto, no mesmo artigo do Código Laboral. As despesas inerentes às tecnologias de informação e comunicação pertencem à entidade patronal, a não ser que o contrato de teletrabalho diga coisa diferente. E pode dizer. Pode, por exemplo, prever uma verba mensal destinada a que o trabalhador pague as despesas inerentes ao teletrabalho.

Mas se isso não acontecer, uma percentagem do custo da internet e eletricidade na casa de cada trabalhador pertence ao empregador.

3. Subsídio de refeição

Aqui, a doutrina divide-se, mas é uma questão que será também mexida. O subsídio de refeição não faz parte da retribuição – é um complemento dado ao trabalhador para pagar os custos de uma refeição tomada no exterior da sua casa, pensada para o trabalho presencial.

Mas há quem entenda que o trabalhador em teletrabalho não pode ser discriminado, até porque muitas vezes o horário não lhe permite confecionar as suas refeições, obrigando à aquisição de comida já confecionada.

Atualmente, há muitas empresas que não estão a pagar o subsídio de refeição a quem está em teletrabalho.

4. A privacidade do trabalhador e o controlo da entidade patronal

É uma das questões mais sensíveis. O Código do Trabalho reconhece o direito do trabalhador à sua vida familiar, ao descanso, no fundo, o direito a ter um horário de igual ao dos trabalhadores presenciais.

E não são permitidas intrusões na casa do trabalhador, quer para controlo do cumprimento do horário quer para manutenção do seu material de trabalho.

As visitas da entidade patronal apenas são autorizadas entre as 9h00 e as 19h00, com a assistência do trabalhador ou de alguém por ele designado.

Mas faltam mecanismos de controlo e fiscalização. De maneira a evitar abusos de parte a parte, é preciso criar um mecanismo de registo da jornada de trabalho – até para que tudo o que vá para lá do horário estabelecido seja pago como trabalho extraordinário. O que não está a acontecer em muitos casos.

Importa ainda referir que são completamente ilegais todos os meios intrusivos de vigilância – com câmaras, por exemplo – para verificar se o trabalhador está a trabalhar ou a distrair-se.

Um dos aspetos em que garantidamente se irá legislar é sobre o direito a desligar, que foi chumbado na sessão legislativa anterior, mas que agora volta a entrar no debate por via do teletrabalho.