Num país que tem vivido sob a ameaça de extremismos e onde só no dia 9 deste mês foram mortos dezenas de cristãos, o Papa Francisco foi muito claro na recusa de qualquer extremismo violento.
“Deus só aprecia a fé professada com a vida, porque o único extremismo permitido aos crentes é o da caridade. Qualquer outro extremismo não provém de Deus nem lhe agrada”, afirmou Francisco, já quase a terminar a homilia da missa que celebrou no Cairo, capital do Egipto, e na qual voltou a condenar a hipocrisia dos crentes.
O Papa começou o dia com a celebração desta missa no estádio da Força Aérea e voltou à ideia-chave que já na sexta-feira tinha estado no centro dos seus discursos: nenhuma religião pode defender a violência.
Aliás, a paz é o mote desta visita papal que tem decorrido sob grandes medidas de segurança, tal como nesta missa, que juntou cerca de 30 mil pessoas e contou com a presença do próprio Presidente egípcio.
Se no primeiro dia, os discursos foram mais políticos, a homilia desta manhã foi mais pastoral, partindo do Evangelho que conta o caminho e a conversa da Jesus com os discípulos de Emaús. Uma leitura que, como disse o Papa, se pode resumir em três palavras: morte, ressurreição e vida.
Morte, porque aqueles homens voltavam a sua casa cheios de desânimo e desilusão; o seu Mestre tinha morrido e, portanto, era inútil esperar. “Quantas vezes o homem se autoparalisa, recusando-se a superar a sua ideia de Deus, um deus criado à imagem e semelhança do homem! Quantas vezes se desespera, recusando-se a crer que a omnipotência de Deus não é a omnipotência de força de autoridade, mas é apenas omnipotência de amor, de perdão e de vida”, exclamou o Papa.
Francisco lembrou que os discípulos reconheceram Jesus, que tinha vindo a caminhar com eles, ao “partir do pão”. O que, continuou, mostra que, “se não deixarmos romper o endurecimento do nosso coração e dos nossos preconceitos, nunca poderemos reconhecer o rosto de Deus”.
Ressurreição, porque “Jesus transforma o desespero em vida, porque quando desaparece a esperança humana, começa a brilhar a divina”. Mas, para chegar à alegria e à ressurreição, lembrou o Papa, é preciso passar pela cruz.
“Quem não faz a travessia desde a experiência da Cruz até à verdade da Ressurreição, autocondena-se ao desespero. Com efeito, não podemos encontrar Deus, sem crucificar primeiro as nossas ideias limitadas de um deus que reflecte a nossa compreensão de omnipotência e do poder”, afirmou Francisco perante representantes políticos e religiosos que se quiseram juntar a este momento da visita papal.
Vida, porque o encontro com Jesus transforma a vida daqueles discípulos, transforma a vida de quem se cruza com ele. Depois de o reconhecerem, Jesus desaparece da vista dos discípulos de Emaús “para nos ensinar que não podemos reter Jesus na sua visibilidade histórica”, continuou o Papa.
“A Igreja deve saber e acreditar que Ele está vivo com ela e vivifica-a na Eucaristia, na Sagrada Escritura e nos Sacramentos”, concluiu
“Deus detesta a hipocrisia”
Nesta homilia, o Papa condenou uma vez mais de forma veemente a hipocrisia dos crentes.
“A experiência dos discípulos de Emaús ensina-nos que não vale a pena encher os lugares de culto se os nossos corações estiverem vazios do temor de Deus e da sua presença; não vale a pena rezar se a nossa oração dirigida a Deus não se transformar em amor dirigido ao irmão; não vale a pena ter muita religiosidade se não for animada por muita fé e muita caridade; não vale a pena cuidar da aparência porque Deus vê a alma e o coração e detesta a hipocrisia”, afirmou.
“Para Deus, é melhor não acreditar do que ser um falso crente, um hipócrita”, condenou o Papa, acrescentando que a verdadeira fé leva à prática das obras de caridade e a proteger os direitos dos outros com o mesmo entusiasmo com que defendemos os nossos.
A terminar, Francisco exortou os participantes desta missa a voltarem às suas casas, à sua vida diária, às suas famílias cheios de alegria, coragem e fé.
“Não tenham medo de amar a todos, amigos e inimigos, porque no amor vivido está a força e o tesouro do crente”, concluiu o Papa, que este sábado à tarde regressa a Roma, depois de uma visita de pouco mais de 24 horas ao Cairo.
A Renascença com o Papa Francisco no Egipto. Apoio: Santa Casa da Misericórdia de Lisboa