Vaticano denuncia “trabalho forçado”, “tráfico de pessoas” e “mortos atirados ao mar”
20-11-2020 - 16:07
 • Olímpia Mairos

Na mensagem que assinala o Dia Mundial da Pesca, o cardeal Turkson alerta para as condições de trabalho dos pescadores e a sua segurança no mar que foram afetadas pelo encerramento dos portos de pesca, devido à pandemia, e pede aos governos legislação que melhor “as condições de vida e de trabalho dos pescadores e suas famílias”.

O prefeito do Dicastério para a Promoção do Desenvolvimento Humano Integral alerta para as dificuldades que enfrentam os pescadores em todo o mundo, em consequência da Covid-19.

Na mensagem que assinala o Dia Mundial da Pesca, que se celebra no sábado, dia 21, o cardeal Turkson, refere que “o caminho para a proteção integral dos direitos humanos e de trabalho de todas as categorias de pescadores ainda é longo e tortuoso” e pede um maior empenho por parte dos governos na busca de soluções.

“Mais uma vez, levantamos as nossas vozes para apelar a um esforço renovado das organizações internacionais e governos para fortalecerem o seu compromisso com vista à adoção de legislação para melhorar as condições de vida e de trabalho dos pescadores e suas famílias e para fortalecerem a luta contra o trabalho forçado e o tráfico de pessoas”, escreve o cardeal Turkson.

As condições dos pescadores e a Covid-19

O prefeito do Dicastério para o Desenvolvimento Integral e presidente da Comissão vaticana para a Covid-19 considera que as “condições de trabalho dos pescadores e a sua segurança no mar foram afetadas pelo encerramento dos portos de pesca devido à pandemia e à impossibilidade de mudança de tripulação”.

O Cardeal Peter Turkson afirma ainda que a “falta de equipamentos de proteção individual aumenta o risco de transmissão do vírus”, uma vez que os pescadores “trabalham em espaços confinados e confinados”.

Como resultado direto, “vários membros de tripulação de navios de pesca foram infetados e, porque impedidos de receber cuidados médicos imediatos, morreram e foram imediatamente atirados ao mar pelos seus companheiros preocupados. Muitas vezes as famílias não sabem o destino de seus entes queridos”, assinala.

O prefeito do Dicastério para a Promoção do Desenvolvimento Humano Integral alerta ainda para os pescadores migrantes que são privados da oportunidade de trabalhar e que não têm dinheiro para sustentar suas famílias e saldar as dívidas.

[Os pescadores migrantes] “correm cada vez mais o risco de ser vítimas de tráfico humano ou trabalho forçado. Além disso, também podem ficar presos em países estrangeiros e forçados a viver amontoados em campos de refugiados / migrantes, em condições precárias de saneamento”, alerta.

O ‘crime da pesca’, um “problema crónico”

Além dos efeitos da pandemia no setor pesqueiro, o cardeal Turkson nota que existem problemas crónicos que assolam a indústria.

“Estes problemas crónicos, que constituem o ´crime da pesca’, são os problemas da pesca intensiva e da pesca ilegal, não regulamentada e não declarada (INN), que continuam em todo o mundo sob todos os tipos de bandeiras, por grupos que têm frotas poderosas e melhores recursos, e que violam as leis e os regulamentos nacionais e internacionais”, explica o prefeito do Dicastério para o Desenvolvimento Integral.

Segundo o cardeal Turkson, este estado de situação penaliza os pescadores regulares e as comunidades piscatórias com a concorrência desleal e esgota os stocks pesqueiros a uma taxa que não permite a recuperação da espécie.

“É uma prática que não é sustentável e que envolve a diminuição das populações de peixes e a redução da produção futura. Os danos causados pela INN e pela pesca intensiva não afetam apenas a população costeira, já que bilhões de pessoas precisam de peixe para o seu suplemento de proteína, e a pesca é a principal fonte de sustento para milhões de pessoas em todo o mundo”, alerta.

Solução para os pescadores detidos na Líbia

A finalizar a sua mensagem, o cardeal Turkson lembra os “dezoito pescadores de diversas nacionalidades, provenientes de Mazara del Vallo, na Sicília, que estão detidos na Líbia, desde 2 de setembro, sem possibilidade de comunicação com as suas famílias”, e apela aos “governos e autoridades nacionais competentes para resolverem esta dolorosa situação e encontrarem uma solução positiva, através de um diálogo aberto e sincero”.

O Dia Mundial da Pesca é comemorado anualmente para destacar a importância do setor da mão de obra marítima, que é fonte de emprego para aproximadamente 59,5 milhões de pessoas, sendo que um em cada dois trabalhadores é mulher.

A Ásia concentra o maior número de trabalhadores neste setor, com aproximadamente 85% da mão-de-obra mundial e possui 3,1 milhões de embarcações, que representam 68% da frota pesqueira mundial.

A comemoração do dia dedicado à pesca ocorre em um período muito anómalo, em que os efeitos da pandemia de Covid-19 continuam à escala mundial, com consequências dramáticas para a economia de muitos países e com um grave impacto nos setores mais vulneráveis, como o da pesca.