Este mês de março faz 48 anos que regressei a Portugal, vindo de Moçambique, com 13 anos e dois irmãos de 10 e 7 anos. Os meus pais ficaram mais uns meses a preparar o regresso. Quando cheguei tive a família de cá que nos acolheu com todo o amor e carinho, num país em convulsão pós-revolução, mas que nos soube integrar e acolher. As marcas ficaram e durante muito tempo recordávamos com emoção e comoção estes momentos traumatizantes, de perda, de recomeço de vida, nos espaços, nas relações, no estudo e na profissão, mas que também marcou, no nosso coração, uma profunda gratidão e reconhecimento para toda a vida. Desde crianças que nos habituamos diariamente a agradecer de forma ampla e generosa, a não dar nada por adquirido ou perdido, a apreciar cada momento, no pouco ou no muito, a olhar o futuro com confiança. E, como forma de expressar tudo isto, a questionarmo-nos em cada dia “Hoje, o que posso fazer pelo meu país?”, numa divida que não se salda, por muito que se devolva.
Uma pergunta que ganha particular significado neste mês de março depois das eleições democráticas nos deixarem pela frente novos desafios e novas realidades. Uma pergunta que me toca pessoalmente e não quero, nem posso delegar em alguém que não eu mesmo.
Cabe-me, por isso, saber ler os sinais, de um povo que tomo por sábio, e fazer aquilo que está ao meu alcance, em particular enquanto líder, fazendo acontecer e ajudar a construir.
Acredito convictamente que ainda não somos a sociedade nem o país que poderíamos ser e que está ao nosso alcance almejar. Quero ter um olhar de maior ambição na promoção de uma economia de bem comum, centrada em valores como a criação e justa distribuição de riqueza, que seja contributo de bem-estar e de prosperidade para todos. Uma sociedade mais justa que promova a dignidade da pessoa e das famílias, retirando-as da pobreza. Em que a liderança é exercida como serviço, numa agenda que não é nem tática nem auto-centrada, e está atenta ao curto, ao médio e ao longo prazo. Onde os compromissos são para cumprir, os pagamentos são para se fazer e, com isso, saber que vale a pena investir pois as relações são de confiança.
Acredito que as empresas desempenham um papel fundamental no desenvolvimento económico e social devendo ser lugar de esperança, de realização pessoal e profissional, lugar de inovação, onde os riscos são ponderados com ambição, para uma maior competitividade. O nosso tecido empresarial precisa de se fortalecer e a qualidade do que fazemos tem de ser reconhecida na sua origem, seja na agricultura, na indústria, ou na prestação de serviços. Temos um enormíssimo desafio de produtividade, base imprescindível para melhores e mais justos salários.
Não podemos ser um povo “em vias de extinção”, uma sociedade cada vez mais envelhecida, vivendo um inverno demográfico que tornará insustentável o Estado Social e o sistema de segurança social. Os mais jovens têm de sentir confiança quando abraçam o desafio de crescerem por cá, de formarem uma nova família e de viverem a sua vocação enquanto pais.
Esta é uma responsabilidade de cada um e que não posso delegar em alguém mais, abdicando, mas sabendo que é um desígnio coletivo, no contributo para um Portugal mais forte e coeso.
Por tudo isto me pergunto em cada dia, “E hoje, o que posso fazer pelo meu país?”.
*João Pedro Tavares é presidente da ACEGE, Associação Cristã de Empresários e Gestores