D. António Marto preocupado com o abandono das eucaristias
08-09-2020 - 10:02
 • Olímpia Mairos

Bispo da Diocese de Leiria-Fátima alerta que a pandemia veio servir como “sinal de alarme” para o abandono da missa. Na carta pastoral “A Eucaristia, Encontro e Comunhão com Cristo e os Irmãos’, D. António Marto exorta a uma “Igreja em saída, próxima das pessoas, sobretudo das que mais sofrem”.

D. António Marto mostra-se preocupado com o abandono das eucaristias. O bispo de Leiria-Fátima alerta, na sua última carta pastoral, que a pandemia veio servir como “sinal de alarme” para o abandono das celebrações dominicais da missa.

“Notamos que bastantes pessoas ainda estão reticentes em participar na celebração dominical, dominadas pelo medo ou pelo comodismo. Sentimos tristeza e preocupação, particularmente com a ausência de pais, crianças e jovens”, escreve o prelado, questionando-se se tal “não será o sinal de alarme e alerta de que a pandemia veio pôr a descoberto e acentuar o que já estava a acontecer”, isto é, o abandono da celebração dominical por parte das novas gerações.

O bispo de Leiria-Fátima constata que “o longo período do confinamento abalou profundamente” as comunidades cristãs, referindo que “nunca tínhamos imaginado ver as igrejas vazias, suspensas as celebrações comunitárias, a catequese e tantas atividades”.

“A impossibilidade de aceder aos sacramentos, de receber a comunhão sacramental, de se encontrar com os irmãos e irmãs em comunidade, de celebrar um funeral religioso digno aos entes queridos falecidos, de viver confinados a Quaresma, a Páscoa e todo o tempo pascal, tudo isto constituiu uma dura provação”, exemplifica.

O prelado sublinha também que o confinamento foi caminho para a “criatividade pastoral para alimentar a fé e manter vivo o sentido de comunidade nos fiéis, nesta situação excecional”.

“A crise não significa só perigo, é também oportunidade. Neste caso, fez-nos descobrir outras coisas belas da experiência cristã. Talvez a mais significativa tenha sido, a meu ver, a de viver, como nunca, a experiência da fé em família e como família, qual pequena Igreja doméstica. Foi impressionante ver famílias que (re)começaram a rezar e a partilhar a própria fé nas suas casas. Eis uma dimensão a cuidar melhor na ação pastoral”, realça o bispo de Leiria-Fátima.

O confinamento, enfatiza D. António Marto, “evidenciou a necessidade da personalização da fé (não mais de tradição ou rotina), de revigoramento da espiritualidade, para dar sentido à vida, mesmo nos momentos de crise, e de acolhimento e acompanhamento face à solidão e às feridas existenciais”.

“Mostrou-nos quanto são essenciais o encontro, o afeto, a ajuda, a comunidade, a comunhão com Deus e entre nós. Daí o desafio a uma pastoral de proximidade da Igreja em saída, próxima das pessoas, sobretudo das que mais sofrem”, alerta D. António Marto.

Situação de emergência eucarística

A Diocese de Leiria-Fátima está a iniciar um novo ciclo pastoral, que se vai estender por dois anos, dedicado à Eucaristia.

Na carta pastoral ‘A Eucaristia, Encontro e Comunhão com Cristo e os Irmãos’, D. António Marto descreve o tempo que vivemos como um tempo “de emergência eucarística” marcada, sobretudo, “pela indiferença e consequente abandono da celebração dominical como se fosse algo meramente opcional” e exorta a uma “Igreja em saída, próxima das pessoas, sobretudo das que mais sofrem”.

No documento orientador para a atividade da diocese nos próximos tempos identificam-se três partes bem distintas e complementares. Na primeira parte, é feita uma abordagem ao sacramento no seu contexto atual. Na segunda, é apresentada uma perspetiva teológica da Eucaristia. Na terceira, são enunciadas as linhas de orientação pastoral para o biénio. Num anexo à carta pastoral, está esquematizado o plano pastoral 2020-2022 e são disponibilizadas tabelas com as atividades a desenvolver nos três níveis geográficos: diocesano, vicarial e paroquial.

No início da carta, o bispo de Leiria-Fátima justifica a pertinência do documento a partir da experiência dos encontros vicariais de jovens, onde, recorrentemente surgia a pergunta “para ser católico é preciso ir à Missa?”. Sendo um tema que, “na sua amplitude, aponta para o essencial da fé cristã”, é também referido o tempo da pandemia como espaço e oportunidade em que este sacramento fez levantar ainda mais novas questões, nomeadamente a da criatividade.

Depois, D. António Marto, aborda a Eucaristia como “mistério admirável” e serve-se do episódio evangélico dos discípulos de Emaús, como inspiração para um breve tratado sobre a Eucaristia.

“A Eucaristia é o pão e o sacramento da fraternidade e isto deve aparecer na estrutura da celebração e na vida quotidiana. Onde há divisão, desinteresse recíproco, incapacidade de partilha, fechamento em si mesmo, desrespeito da dignidade humana, descarte dos pobres e frágeis, a Eucaristia é profanada, como nos mostram as palavras duras que brotam do coração amargurado do apóstolo Paulo face ao comportamento incoerente dos cristãos de Corinto”, alerta o bispo de Leiria-Fátima.

Como promover uma maior participação

Dada a centralidade da Eucaristia na vida do cristão, D. António Marto apela à promoção da qualidade das celebrações, que passa pelo “respeito das normas litúrgicas” e que se concretiza com a “participação consciente, ativa e devota, interior e exterior, íntima e visível de toda a assembleia na celebração”.

As linhas de orientação pastoral na Diocese de Leiria-Fátima vão no sentido de “promover uma maior participação e, sobretudo, uma participação mais consciente na celebração eucarística”.

Outro aspeto importante, refere D. António Marto, “é a valorização da dimensão comunitária” indicando que “a Missa deve ser um ato preparado pela comunidade, dando uma atenção especial às diversas equipas: da liturgia, leitores, de acolhimento, de ministros da comunhão”.

Mesmo os aspetos estéticos dos espaços e dos momentos celebrativos devem ser considerados com atenção “sem deixar lugar a improvisações”, realça o prelado.

Dirigindo-se aos sacerdotes, o bispo de Leiria-Fátima lembra que “a eucaristia realça a identidade do presbítero como serviço de comunhão na comunidade, que deve também configurar o seu perfil”.

“De facto, o estilo de comunhão há de manifestar-se nas suas palavras e atitudes, nos gestos e modo de vida. Leva a cultivar uma relação próxima, afável e compreensiva, a atitudes de acolhimento, à aproximação de todos sobretudo dos mais frágeis e dos afastados, à atenção às feridas e aos problemas humanos”, escreve o prelado.

Também a catequese é importante “como alicerce da vida cristã” e supõe a centralidade da Eucaristia devendo, por isso, “proporcionar uma iniciação gradual e progressiva ao mistério da Eucaristia, prestando maior e melhor atenção aos temas eucarísticos e levando a conhecer e a viver a linguagem dos espaços, símbolos, gestos, palavras e cânticos litúrgicos”, assinala D. António Marto.