​A presidência portuguesa da UE
25-11-2020 - 06:55

Fazer uma presidência semestral da UE em plena pandemia não será fácil. Mas as presidências europeias raramente são fáceis. E agora a UE poderá contar com uma administração americana muito mais europeísta do que a anterior, de Trump.

A presidência semestral portuguesa da UE começa no início de 2021. Será inevitavelmente marcada pela pandemia e pelos problemas que, segundo tudo indica, ainda estarão em aberto nessa altura – como a relação entre o recebimento de fundos europeus e o respeito pelo Estado de direito ou o próprio Brexit. É positivo que Portugal vá receber, juntamente com outros Estados membros, um pagamento antecipado (37,5 milhões de euros, no nosso caso) para apoiar o combate à Covid-19.

As presidências semestrais da UE perderam alguma da sua importância quando o Tratado de Lisboa criou o cargo de presidente permanente; agora é Charles Michel quem ocupa esse cargo. Mas ainda são relevantes.

A primeira presidência portuguesa da UE, no primeiro semestre de 1992, ficou marcada pelo inesperado recuo da Dinamarca quanto à prevista adesão ao euro. O recuo, determinado por um referendo, exigiu da presidência portuguesa um suplementar e exigente esforço para reencaminhar as coisas nas últimas semanas da presidência.

Agora temos o bloqueio da Hungria e da Polónia ao princípio de condicionar a canalização de fundos de Bruxelas ao respeito pelo Estado de direito. Aos dois países juntou-se a posição contrária da Eslovénia a esse princípio, mas sem bloqueio. Curiosamente, a Eslovénia segue-se a Portugal na presidência semestral da UE.

António Costa evocou a possibilidade de os Estados membros que concordam com aquela condicionalidade avançarem com uma “cooperação reforçada”, isto é, irem para a frente, num acordo intergovernamental que deixaria de fora os que discordam. Pelo menos como ameaça talvez funcione, porque a Hungria e a Polónia recebem muito dinheiro de Bruxelas, que não querem perder. Mas, a concretizar-se, a cooperação reforçada será uma solução trabalhosa e demorada, não sendo certo que juridicamente abranja, além do Fundo (a “bazuca”), a fixação do orçamento plurianual da UE.

Já a ideia inicialmente avançada por A. Costa – separar os fundos do respeito pelos valores democráticos - parece inviável, além de eticamente criticável. O Parlamento Europeu nunca a aceitaria.

Outro problema que, pelo menos em parte, deverá cair na presidência portuguesa é o Brexit. A UE tem sido por vezes acusada de intransigência nestas intermináveis negociações. Pelo contrário, a UE aceitou novas negociações depois de Boris Johnson ter deitado ao lixo um acordo que ele próprio havia assinado há menos de um ano...

Talvez a posição de Boris J. se tenha tornado recentemente mais flexível, por três motivos. Porque a sua popularidade caiu muito, porque o seu “guru” David Cummings bateu com a porta do n.º 10 de Downing Street (ele era o ideólogo do Brexit) e porque a posição, já declarada, da nova administração Biden é de os EUA não fazerem qualquer acordo comercial com o Reino Unido se o Brexit levar ao encerramento da fronteira entre o Ulster (Irlanda do Norte) e a República da Irlanda.

Mas a UE tem muito a ganhar com a nova administração americana, que tenciona repor a cooperação entre Washington e a Europa comunitária. E os nomes já conhecidos para ocupar postos-chave nessa administração são de gente moderada, com experiência e conhecedora do funcionamento da política nos EUA. Não se confirma o fantasma de, atrás de Biden, tomar o poder em Washington o radicalismo de esquerda do partido democrático.

Este conteúdo é feito no âmbito da parceria Renascença/Euranet Plus – Rede Europeia de Rádios. Veja todos os conteúdos Renascença/Euranet Plus