UE-Turquia
02-04-2018 - 06:17

A Turquia chegou a negociar uma futura adesão à UE. Hoje o problema é outro.

Realiza-se hoje uma “mini-cimeira” entre a União Europeia e a Turquia na cidade búlgara de Varna. A Bulgária detém a presidência rotativa da UE durante o primeiro semestre deste ano. Não será um encontro fácil aquele que oporá David Tusk, presidente da UE, e Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, ao Presidente da Turquia, Recip Erdogan.

Os dirigentes turcos consideram que o seu país é europeu, embora só uma pequena parte do seu território, incluindo Istambul, se situe na Europa.

Em 1963, dois anos depois da Grécia, a Turquia assinou um acordo de associação com a então CEE. O acordo com a Grécia desembocou em adesão, em 1981, o que não aconteceu com a associação turca. Mas os governantes turcos continuaram a pugnar pela entrada do seu país na UE. Em 1987 a Turquia apresentou o pedido formal de adesão à UE. Mas só no final de 1999 o Conselho Europeu reconheceu a candidatura turca, em pé de igualdade com outros candidatos.

As negociações começaram e até levaram a Turquia a mudar certas leis e práticas não compatíveis com os valores europeus. Foi o caso, por exemplo, da abolição da pena de morte em 2002. Mas dentro da União vários países não mostravam grande disposição para integrar a Turquia, um país de mais de 75 milhões de habitantes. Era o caso da Áustria, por razões históricas (o império otomano atacou várias vezes o império austro-húngaro), da França de Sarkozy e da própria chanceler alemã – Merkel – que receava o aumento da entrada de imigrantes turcos no seu país, nessa altura já muito numerosos.

Depois de governar dez anos a Turquia como primeiro-ministro, Erdogan tornou-se em 2014 Presidente da República. Nessa posição, Erdogan acentuou a sua viragem de muçulmano moderado não só para um crescente autoritarismo como para um islamismo afirmativo, em aberta contradição com a tradição turca de Estado laico, iniciada por Ataturk após o fim da I Guerra Mundial (que desmantelou o império otomano, dando origem à Turquia). Para isso teve que vencer a oposição dos militares, fiéis à herança de Ataturk.

Os militares turcos nem sempre respeitaram a democracia, desencadeando vários golpes de Estado. Mas nos últimos anos Erdogan fez pior: islamizou o país, instaurou uma repressão brutal, acabou com a liberdade de expressão e encheu as prisões de alegados oponentes ao seu regime. Parte desta situação decorre, segundo Ankara, da rebelião dos curdos que vivem na Turquia e aspiram à autodeterminação.

Há anos parecia próximo o sucesso de um processo de paz com os curdos, mas tudo voltou à estaca zero. Naturalmente que a prevista adesão à UE, se até aí era duvidosa, se tornou impossível. A via autoritária de Erdogan e o seu desrespeito pelos direitos humanos impedem-na. Erdogan já quer voltar à pena de morte…

Mas a UE e em particular a Alemanha precisam que a Turquia retenha no seu solo muitos dos refugiados que fogem às guerras do Médio Oriente e pretendem chegar à Europa. Em 2016 foi celebrado um acordo no qual as autoridades turcas se dispuseram a reter esses refugiados, em troca de uma grossa maquia europeia. Recentemente a Turquia recebeu da UE 3 mil milhões de euros suplementares para acolher refugiados sírios. Ironicamente, parte deles vítima de ataques do exército e da aviação da Turquia aos curdos sírios em Afrin. Para complicar ainda mais as coisas, Erdogan ameaça a França por este país apoiar as milícias curdas.

Os dirigentes turcos continuam a falar na pretensão de aderir à UE. Mas é uma manobra negocial para receberem mais dinheiro da UE. Na “mini-cimeira” de hoje o tema central da discussão será a retenção na Turquia dos refugiados.