Centeno. Pressão sobre a dívida pública é culpa do anterior Governo
18-01-2017 - 19:07

Governante esteve esta quarta-feira no Parlamento a ser ouvido na comissão de orçamento e finanças.

O ministro das Finanças atribuiu a pressão existente sobre a dívida pública "em grande medida" ao facto de o anterior Governo não ter feito o devido trabalho no sistema financeiro português.

"Há uma pressão sobre a dívida portuguesa em grande medida porque o trabalho sobre o sistema financeiro estava todo por fazer", disse Mário Centeno na comissão de orçamento e finanças, na Assembleia da República, em Lisboa.

O responsável pela pasta das Finanças considera que, ao invés de Portugal, já na Irlanda e em Espanha - "países com os quais comparam as nossas taxas de crescimento e taxas de juro" - foi feito esse trabalho, o que permite à dívida pública ter preços mais altos e, logo, pagar juros mais baixos do que a dívida pública portuguesa.

"Os sistemas financeiros são uma peça importantíssima dos nossos sistemas modernos e o nosso tinha Banif, Novo Banco", afirmou Centeno, o que levou o deputado do CDS João Almeida a recordar, num aparte, que o Banif já tem mais de um ano pelo que não justifica pressões recentes sobre os títulos soberanos.

"Faça o senhor deputado o gráfico dos 'spreads' e veja quais as consequências que tiveram", respondeu o governante.

Mais à frente na comissão parlamentar, Centeno voltou a falar das taxas de financiamento do Estado português, considerando que são um "bom indicador daquilo que é a leitura desses fundamentos" da economia e considerou que o Governo tem cumprido o seu objectivo de mostrar trabalho e resultados aos mercados.

O ministro das Finanças destacou que o Governo tem cumprido "os compromissos dentro do semestre europeu" e que a política seguida tem conduzido a uma "aceleração da economia portuguesa", acrescentando que isso irá beneficiar também "o balanço dos bancos".

Mário Centeno não deu indicações, contudo, de como está o processo de emissão de até 1.000 milhões de euros de obrigações da Caixa Geral de Depósitos - que faz parte do plano de recapitalização do banco público -, nem deu indicações de como poderá correr essa operação de financiamento do banco público.

Os deputados tinham-no questionado sobre o impacto da pressão sobre a dívida soberana portuguesa nessa operação de emissão de dívida da Caixa.

A semana passada, Portugal emitiu três mil milhões de euros em dívida a 10 anos com as taxas de juro a superarem os 4%, tendo os analistas contactados pela Lusa considerado que o custo não surpreendeu, mas a pedirem cautela relação às finanças públicas.

Já esta quarta-feira Portugal colocou 1.750 milhões de euros em Bilhetes do Tesouro a seis e 12 meses a taxas de juro negativas e inferiores às dos anteriores leilões comparáveis.

Centeno e a Caixa

O ministro das Finanças destacou a importância que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) teve nos últimos anos, marcados pela grave crise económica e financeira, na manutenção da confiança dos depositantes e do financiamento à economia.

"Parece hoje ainda mais clara para todos a importância de ter um banco público. Nos últimos anos a Caixa provou o seu papel como âncora da estabilidade do sistema", afirmou Mário Centeno.

Segundo o governante, num contexto difícil a nível internacional para a generalidade do sector bancário, a CGD provou ser uma "instituição de referência e confiança, que recebe depósitos", e que desempenha um importante "papel no crédito, dando estímulo ao crescimento português".

E reforçou: "É nessa leitura daquilo que é o sistema financeiro hoje que a necessidade de haver um banco público é ainda mais clara".

Centeno sublinhou que a manutenção da CGD 100% pública está inscrita no programa do Governo, que desde que tomou posse "tratou das questões" do banco, ao nível da sua reestruturação e da aprovação do novo plano de capitalização, "sem esquecer a sua função pública e a sua função bancária".

O ministro vincou que a CGD "actua em regime de concorrência muito alargada, mesmo a nível europeu, numa área económico-financeira muito vasta e com processos de integração que estão em construção e para os quais Portugal tem que estar preparado" e que "é nesse contexto que se coloca a recapitalização" do banco estatal.

Segundo Centeno, em causa está "um processo de capitalização muito desafiante que era preciso enfrentar e tudo isto num ambiente regulatório que é mais exigente, e ainda bem".

Demissão de Domingues

O ministro das Finanças admitiu hoje que foi um "choque" o pedido de demissão da administração da Caixa Geral de Depósitos (CGD) liderada por António Domingues, mas garantiu que importante é que não foi posta em causa a recapitalização.

"Obviamente a substituição da administração no mês de Dezembro foi um choque do ponto de vista do processo, mas não teve nenhum impacto no processo de capitalização", disse Mário Centeno, que foi ouvido pelos deputados na comissão de orçamento, finanças e modernização administrativa.

De acordo com o governante, as fases do processo de recapitalização, num montante superior a 5.000 milhões de euros, "estão a ser cumpridas" e estão a ser acompanhadas pelo Banco Central Europeu, Comissão Europeia (através da Direcção-Geral de Concorrência) e Mecanismo Único de Supervisão.

O ministro respondia ao deputado do PSD Leitão Amaro, que acusou Mário Centeno de não responder directamente às questões colocadas, interpelando mesmo a presidente da Comissão para recordar que o governante evitou falar sobre o montante do aumento de capital, o aumento do nível de imparidades do banco público, a excepção ao estatuto do gestor público dado à administração de António Domingues (que provocou uma acesa polémica, que levou à demissão da equipa em Dezembro) e ainda o eventual uso de informação privilegiada pelos ex-administradores.

O ministro das Finanças não concordou com a avaliação feita pelo PSD e garantiu: "Respondi às questões todas, não faltou uma".