Um ano passou e o Observatório de Violência Doméstica não saiu do papel
11-03-2019 - 07:05
 • Marina Pimentel

Organismo tinha como missão analisar as decisões judiciais em matéria de violência de género e doméstica.

A decisão é de 6 de fevereiro de 2018. O Conselho Superior da Magistratura (CSM) criou há mais de um ano um Observatório de Violência Doméstica, mas acabou por nunca sair da gaveta.

O organismo foi anunciado na sequência da polémica criada na opinião pública com o controverso o acórdão de Neto de Moura que desculpabilizou as agressões contra uma mulher adúltera.

O observatório tinha como objetivo analisar as decisões judiciais em matéria de violência de género e doméstica. Depois, devia “propor ações de formação para os juízes e alterações legislativas ou regulamentares, de forma a agilizar e aumentar a prevenção e combate ao crime”, pode ler-se no despacho do CSM, onde é anunciada a criação do novo organismo.

O observatório seria presidido pelo vice-presidente do órgão disciplinar dos juízes, o conselheiro Mário Belo Morgado, o Diretor do CEJ (a escola dos Juízes) e por representantes dos vários Tribunais da Relação, entre outra entidades.

Foi na altura convocada uma reunião para o dia 2 de maio. Mas nunca chegou a acontecer. Não se conhece qualquer iniciativa do organismo que devia estudar as decisões dos juízes sobre violência doméstica e com base nelas propor mudanças na lei, na formação dos juízes e na administração da Justiça.

A Renascença sabe que a situação “incomodou” algumas das pessoas que foram convocadas pelo CSM para participar, as quais pediram explicações.

Em nota envidada à redação o Conselho Superior de Magistratura informa que” está a articular trabalho com a secretaria de Estado da Cidadania e Igualdade de Género”, estando “a instituição do observatório está em curso”.

Decisões polémicas

Joaquim Neto de Moura, desembargador no Tribunal da Relação do Porto, foi castigado em fevereiro com uma advertência pelo Conselho Superior de Magistratura na sequência de uma polémica sentença de outubro de 2017, em que o juiz faz censura moral a uma mulher de Felgueiras, vítima de violência doméstica, minimizando este crime pelo facto de esta ter cometido adultério.

O magistrado invocou a Bíblia, o Código Penal de 1886 e, até, civilizações que punem o adultério com pena de morte, para justificar a violência cometida contra a mulher com uma moca de pregos.

Noutro caso noticiado recentemente, o juiz decidiu retirar a pulseira eletrónica a um homem condenado a pena suspensa por agressão violenta à mulher. Neto de Moura alegou que os juízes que condenaram o agressor não pediram autorização para lhe aplicar a medida. O agressor rebentou um tímpano à mulher ao soco. De acordo com o relato do advogado da vítima, a mulher “vive escondida, aterrorizada” e teve já de trocar de casa.

O juiz foi alvo de condenação pública por parte de personalidades de vários quadrantes e decidiu avançar com ações em tribunal contra deputados, humoristas, jornalistas e comentadores que “ultrapassaram” a linha vermelha das críticas sobre as polémicas decisões do magistrado em casos de violência doméstica.

O juiz desembargador foi transferido da secção criminal para a secção cível do Tribunal da Relação do Porto e deixa de julgar casos de violência doméstica.