Todos amigos e todos contestatários, os jovens vinham maturando uma militância literária e estética que era também um combate cívico e ético contra o panorama de incerteza – financeira, económica, política, institucional, social, até – que parecia atravessar o Portugal do tempo. Rumando contra a “paz podre” da Regeneração e o adormecimento dos portugueses no “pão e circo” dos melhoramentos materiais do fontismo, a Geração de 70 queria “acordar tudo aquilo (o país) a berros”, como escreveu Eça, renovando o pensamento, a cultura, a educação e a energia nacionais com as ideias novas que agitavam a Europa de então – a democracia, o racionalismo, o positivismo, o realismo ou o republicanismo. Era a essa Europa que Antero e os amigos queriam que o velho Portugal se juntasse.
Na primavera de 1871 decidiram agir, montando uma tertúlia intelectual no Casino Lisbonense, localizado no Largo da Abegoaria, no coração do Chiado.
O programa das conferências foi divulgado a 16 de maio, visando “agitar na opinião pública as grandes questões da filosofia e da ciência moderna” e “estudar as condições da transformação política e económica da sociedade portuguesa”. Dali até à terceira semana de junho, Antero falou duas vezes, a segunda das quais para proferir a celebérrima conferência sobre as «Causas da decadência dos povos peninsulares”, um agudo tópico identitário nacional ainda hoje não desvanecido; seguiram-se as intervenções de Augusto Soromenho, de Eça de Queirós, de Salomão Sáragga, de Jaime Batalha Reis e de Augusto Fuschini, sobre a literatura e o realismo, o ensino e os Jesuítas ou a “dedução positiva da ideia democrática”. A novidade e o brilho dos debates atraíram as atenções da imprensa lisboeta e os olhares das elites e dos políticos. Em Paris, entretanto, a Comuna lavrava, furiosa, contra a ordem estabelecida, reificando um novo terror jacobino. Temendo que por cá pudesse acontecer algo de semelhante, o governo, ao tempo presidido pelo marquês de Ávila e Bolama, resolveu “cancelar” os conferencistas, expedindo, a 26 de junho de 1871, uma portaria que mandava encerrar as portas do Casino Lisbonense. Num país onde os intelectuais eram livres e a imprensa escrevia o que queria, o gesto de Ávila teve dois efeitos: tornou instantaneamente famosos, e quase “mártires”, os jovens da Geração de 70 que, de facto, queriam revolucionar o país; e colou-lhe, a Ávila, a imagem de um censor reacionário, mesmo que apoiado pela generalidade das vozes parlamentares, assustadas com o vigor com que a juventude dera em demolir as certezas do Portugal burguês, ordeiro, monárquico e católico do tempo.
A portaria governamental que extinguiu as conferências manchou a reputação de Ávila e marcou-lhe para sempre a biografia. Hoje, interessará menos recordar o ato censório (censurável que ele seja…), do que lembrar a extraordinária energia intelectual e o empenho e compromisso cívicos dos jovens da Geração de 70, que ousaram querer (re)pensar Portugal e pôr os portugueses a olhar para si mesmos, discutindo as razões do atraso nacional e os caminhos de convergência em relação à Europa. Nessa exata dimensão, a sua iniciativa não perdeu razão de ser – aliás, é hoje talvez tão urgente e, pelo que se tem visto, tão polémica como o era em 1871.