"Corremos o risco de o resultado eleitoral não ser fiável”
15-01-2022 - 13:10
 • Marina Pimentel

A questão do voto dos eleitores que vão estar confinamento nas eleições legislativas é o tema em debate no Em Nome da Lei. O problema não é se os isolados podem votar, mas como garantir segurança de todos, concordam os intervenientes no programa desta semana.

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O voto dos 400 mil eleitores que no dia 30 podem estar em isolamento obrigatório, por causa da Covid-19, pode fazer a diferença na luta pelo poder entre os dois maiores partidos, defende o bastonário da Ordem dos Advogados, no programa Em Nome da Lei, da Renascença.

Menezes Leitão argumenta que, “sendo essa a diferença de votos que separa o PS do PSD, segundo as sondagens, então se os eleitores infetados não poderem deslocar-se até às urnas de voto, corremos o risco de o resultado eleitoral não ser fiável”.

Por seu turno, o bastonário da Ordem dos Médicos considera incompreensível que estejamos perante este problema num mundo já tão digitalizado.

Miguel Guimarães lembra que” várias instituições, nomeadamente a Ordem dos Médicos e a dos Advogados, usam o voto eletrónico, o que resolveria o problema das pessoas que estão em confinamento”. Não tendo a questão sido acautelada pela classe política, “a melhor alternativa seria que essas pessoas pudessem votar depois de todos os outros, no final do dia 30”, sugere.

Menezes Leitão está de acordo. Mas adverte que deixar para o período entre as 18h00 e as 19h00 o voto dos eleitores em isolamento "pode ser pouco praticável e representar até um risco para os que apenas tiveram contactos de risco porque para numa hora poderem votar 400 mil pessoas, isso levará necessariamente a grandes filas, em que vão estar misturados os que testaram positivo e os que apenas estão sob vigilância”.

Em declarações ao programa Em Nome da Lei, tanto Menezes Leitão, como o constitucionalista Jorge Pereira da Silva e o professor da Faculdade de Direito de Lisboa, Miguel Prata Roque, entendem que a questão do direito ao voto dos infetados, sujeitos a isolamento, não merece qualquer dúvida jurídica, porque se trata de um direito constitucionalmente garantido.

O próprio bastonário da Ordem dos Médicos reconhece esse direito e admite “não ser expectável que haja um aumento exponencial dos infetados”, por causa das eleições legislativas antecipadas marcadas para o próximo dia 30”.

Nenhum dos três juristas ouvidos pelo Em Nome da Lei entende, por isso, que o Governo tenha pedido sobre a matéria um parecer ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República.

Jorge Pereira da Silva, constitucionalista da Universidade Católica, diz que “teria sido mais importante que tivesse sido pedida uma posição à Direção-Geral da Saúde porque a questão não é se as pessoas podem ir votar, porque isso está decidido constitucionalmente, mas antes como é que as pessoas podem votar em segurança”.

Defendendo que a questão é sobretudo logística e não jurídica, o constitucionalista Jorge Silva Pereira da Silva entende que “o Governo devia clarificar a situação através de uma resolução do Conselho de Ministros”. De qualquer forma, mesmo que não haja essa clarificação,” se nada for feito, “as pessoas podem ir votar e se forem intercetadas na rua não vão cometer crime de desobediência porque estão no exercício de um direito fundamental”.


Na mesma linha de raciocínio, também Miguel Prata Roque, que foi membro da Comissão Nacional de Eleições (CNE), espera que “o Governo clarifique, através de resolução do Conselho de Ministros, que a votação por parte de quem está em isolamento é admissível e que seja estabelecida uma hora recomendável para que os eleitores possam exercer o seu direito de voto”.

E depois “é o cumprimento das orientações que certas autoridades de saúde nos irão dar e que passarão pela manutenção de distância nas filas entre os eleitores para as seções de voto e a utilização dos materiais de proteção individual que foram referidos pelo bastonário da Ordem dos Médicos. E estou certo que será garantida essa segurança pública”, afirma Miguel Prata Roque.

Menezes Leitão revela que têm chegado à Ordem dos Advogados alertas de membros de mesas de voto que temem ser infetados. O bastonário diz que” é obrigação de qualquer Governo criar condições de segurança quando as pessoas se deslocam para votar”.

“A situação não é muito diferente de termos, por exemplo, motins em frente às assembleias de voto que implicassem que as pessoas tivessem medo de ir votar. Aí teríamos de ter uma polícia que repusesse a ordem. Neste caso, é exatamente a mesma tarefa que é exigida à da Administração Interna.”

O bastonário considera que é preciso “criar uma logística adequada, para que as pessoas se desloquem em condições de segurança, que tenham máscaras, que usem também viseiras, mas especialmente que haja a garantia de que não há uma multidão que se junta”.

Menezes Leitão mostra-se preocupado com a segurança sanitária dos membros das assembleias de voto. “Já sabemos que vão receber uma dose de reforço da vacina. Mas a vacina não chega, é preciso que seja garantido que têm equipamentos de proteção adequados para que não sejam colocados em risco”, conclui o bastonário da Ordem dos Advogados ao programa Em Nome da Lei da Renascença, que este sábado põe nos pratos da balança o direito ao voto e a proteção da saúde pública.