07 dez, 2022 - 15:30 • Maria João Costa
“É a vidinha, mas a vidinha é de todos nós”. Assim descreve Bruno Vieira Amaral o conteúdo das crónicas literárias que agora reúne no livro “Segundo Coração” (Ed. Quetzal), que é apresentado esta quarta-feira, na Bertrand do Chiado, em Lisboa.
Em entrevista ao programa Ensaio Geral da Renascença, o livro junta as crónicas que escreveu para a revista GQ e mais tarde para a edição digital do Expresso. Apesar dos textos percorrerem um amplo arco temporal, Bruno Vieira Amaral identifica uma “unidade nestas crónicas”.
“São crónicas sobre o passado e a memória. Mais do que isso, diria, acaba por haver uma ligação, quanto a mim muito evidente, aos dois primeiros romances. Sinto que há uma continuidade temática e de tom entre esses livros. É como se constituíssem uma trilogia, sendo que os outros são romances e este é um livro de crónicas.”
“Segundo Coração” é assim, na visão do escritor vencedor dos Prémios Saramago e Fernando Namora, um fecho da trilogia que iniciou com o seu romance de estreia “As primeiras Coisas”, ao qual se seguiu “Hoje Estarás Comigo no Paraíso”. Em ambos livros fala das suas memórias de infância e adolescência, bem como da sua família.
“São crónicas que têm mais que ver com o passado desta quase ‘personagem’, deste eu”, explica o autor, referindo-se a si e ao sujeito das suas crónicas compiladas no livro agora editado. Mas há mais a juntar estes três livros. Há um mergulho nas memórias que nem sempre é fácil.
Bruno Vieira Amaral assume que já não está a escrever “este tipo de crónicas”, porque diz ter chegado a uma altura em que sente que está já “a rapar o fundo do tacho” e, como tal, precisa de espaço.
De acordo com as suas palavras, reviver o passado é “um exercício de alguma violência emocional”. “Estar constantemente a escavar as nossas próprias memórias e a reviver certos acontecimentos” é algo de que o autor se quer agora afastar.
Contudo, Bruno Vieira Amaral explica que nestas crónicas literárias tenta “sempre partir do pessoal, para chegar a um lugar-comum, com o qual os leitores se possam identificar. É a vidinha, mas a vidinha é de todos nós, e os outros também se podem identificar com essa vidinha. Esse é o propósito das crónicas”, explica.
Cada crónica tem também uma porta de entrada para várias referências culturais, seja um livro, um filme, uma música. “É natural que essas referências, a livros, a músicas, filmes sejam também das pessoas daquela época e não só. Essas referências são parte de mim e das minhas memórias, podem parecer menos pessoais, porque são referências culturais mais vastas”, detalha o escritor.
Embora alguns textos de “Segundo Coração” tenham como “ponto de partida algum acontecimento ou alguma notícia, Bruno Vieira Amaral não se prende à espuma dos dias. A sua intenção, conta nesta entrevista ao programa Ensaio Geral, é “estabelecer pontes com os leitores”.
“Podemos ter crónicas mais literárias, umas mais ligadas à atualidade, outras mais culturais, outras mais políticas, se bem que depois haja alguma confusão entre o que é a crónica e o que é a coluna de opinião! Eu escrevo crónicas literárias. O facto de em algumas destas crónicas, e não são todas, ser possível ligá-las a um determinado momento, por exemplo as crónicas que se referem à Covid e aos confinamentos, isso não me perturba. Pelo contrário, acho que acaba por ser um testemunho de um tempo”, afirma o autor.