06 ago, 2024 - 07:00 • Henrique Cunha
A diretora nacional da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), Catarina Bettencourt Martins, alerta em entrevista à Renascença para “a discriminação” que os cristãos continuam a sofrer e para “uma forma de perseguição mais light” que se verifica na Europa.
"A forma de estar politicamente correta acaba por não nos dar a liberdade para expressarmos, para professarmos livremente a nossa fé”, aponta a dirigente da AIS nesta terça-feira em que se assinala o Dia de Oração pelos Cristãos Perseguidos.
Este Dia de Oração pelos Cristãos Perseguidos assinala a data de 6 de agosto de 2014, em que teve início um dos mais violentos ataques contra as comunidades cristãs do Iraque.
Neste dia, há dez anos, milhares de cristãos foram forçados a fugir, quando as terras onde sempre viveram, as suas aldeias e vilas na Planície de Nínive, no Iraque, foram invadidas pelo Daesh, os jihadistas do auto-proclamado Estado Islâmico.
A Fundação Ajuda à Igreja que Sofre afirma que a "data que não pode cair no esquecimento" e, por isso convoca "os portugueses, uma vez mais, para rezarem pelos Cristãos perseguidos.
Terça-feira, 6 de agosto, é dia de oração pelos Cristãos perseguidos. Dez anos depois do episódio que a motivou, continua a justificar-se esta iniciativa?
Não podemos deixar que o mundo esqueça o que aconteceu há dez anos no Iraque, com a ocupação desta zona historicamente cristã, em que houve a expulsão da comunidade cristã, em que milhares e milhares de pessoas perderam o pouco que tinham, as coisas que tinham, os seus bens, as suas casas, os seus trabalhos. Ficaram a viver numa condição de deslocados dentro do seu próprio país. Passaram a ser refugiados dentro do seu próprio país, a necessitar de ajuda para poder sobreviver e, por isso, dez anos depois, apesar do Daesh não estar presente e não ter esta ocupação de território no Iraque é importante não esquecer o que se passou.
É necessário continuar a denunciar esta forma de pensar, este extremismo de pensar que uma terra é só para quem professa uma determinada religião. Isto continua a existir no Iraque e, infelizmente, em muitos outros países do mundo e, por isso, assinalarmos estes dez anos. É necessário continuarmos ano após ano a lembrarmos, de facto, deste dia, porque marca uma diferença também na forma como o mundo olha para todos estes grupos terroristas, da forma como estes grupos terroristas também começaram a atuar, a aterrorizar várias pessoas. Temos de relembrar sempre este acontecimento terrível que marcou a vida de milhares de pessoas.
Que tipos de perseguição acontecem por estes dias?
Temos vários tipos de perseguição. Temos a perseguição provocada por estes grupos jihadistas, terroristas. Temos também a perseguição feita pelos próprios governos, que é também uma das formas de perseguir as populações. E temos também uma forma de perseguição mais "light" que se verifica aqui na Europa, onde há esta forma de estar politicamente correta, esta forma de falar politicamente correta, que acaba por não nos dar a liberdade para expressarmos, para professarmos livremente a nossa fé.
Sei que é difícil medir este tipo de fenómenos, mas entende que são os cristãos aqueles que mais sofrem perseguição no mundo?
Não é fácil nós respondermos, porque, de facto, não é fácil ter acesso a todos os dados, mas a Fundação AIS edita regularmente um relatório sobre a liberdade religiosa no mundo. E o que nós verificamos, quando publicamos de dois em dois anos este relatório, o que nós verificamos é que há um agravamento da situação da liberdade religiosa no mundo. O que nós também sabemos é que a comunidade religiosa mais perseguida atualmente também é a comunidade cristã. Expressar isto em termos de números é muito difícil, como é óbvio, mas sabemos, que tendo em conta as situações de perseguição e, tendo em conta os países onde incidem estas maiores perseguições; se olharmos para isso, conseguimos perceber que a comunidade cristã é uma das mais perseguidas no mundo.
A cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos causou polémica. Revesse de alguma forma nas críticas de muitos setores, em particular da Igreja Francesa? É também uma forma de perseguição dos cristãos?
Revejo-me em algumas das críticas que foram feitas, pois não percebi o porquê de usar aquela imagem e que se olharmos, é uma imagem que é associada à comunidade cristã. E se olharmos para a cerimónia percebemos que não houve outras imagens de outras religiões a serem usadas e associadas. Por isso acho que é uma forma de discriminação, pelo menos, ou de perseguição muito sutil que existe aqui, de facto, na Europa.
E continuo a não perceber o porquê de usar esta imagem, o porquê de usar toda esta imagem à volta da última ceia, porque toda a cerimónia foi muito à volta da inclusão, de todos, independentemente da cor, da raça, da orientação sexual, do género, em que todos estavam incluídos. Penso que haveria outras formas mais simpáticas ou mais cordiais para com todas as religiões, sem ofender qualquer que seja religião. Por isso revejo-me um pouco nas críticas que foram feitas à cerimónia, nomeadamente esta da imagem da última ceia.