Tempo
|
A+ / A-

Fornos de Algodres

Antigo Seminário em obras para acolher refugiados. Toda a ajuda é bem-vinda

18 abr, 2022 - 06:20 • Liliana Carona

Chegou a estar à venda na internet por dois milhões de euros, mas um grupo de cerca de duas dezenas de ex-seminaristas decidiu recuperar com fundos próprios e ajuda da Diocese de Viseu e de outros parceiros, o edifício do antigo Seminário Menor de Fornos de Algodres, com vista a acolher refugiados ucranianos. As obras decorrem a bom ritmo, mas é preciso equipar o interior e, por isso, pedem ajuda a quem possa contribuir.

A+ / A-
Seminário de Fornos de Algodres recuperado - reportagem de Liliana Carona

Com apenas nove anos, a voluntária de palmo e meio, Adriana Cruz, ajuda na requalificação do edifício do antigo Seminário Menor de Fornos de Algodres. Veio pela mão dos pais.

Adriana explica a presença, realçando que está a “fazer um lugar para os ucranianos, vai ser um hotel para eles viverem”, declara, enquanto pega na trincha de pintar, na companhia do ‘Jubas’, o cão que a segue para todo o lado.

“Eu sinto que se eu precisasse, também gostava que me ajudassem, se nós precisarmos algum dia também nos ajudam, eu estou a retribuir um favor que um dia nos podem fazer igual”, defende a jovem voluntária, inspirada pelo pai, arquiteto e antigo seminarista.

André Serrano, 38 anos, é um dos ex-alunos do Seminário de Fornos de Algodres que decidiram deitar mãos à obra. São cerca de duas dezenas de antigos seminaristas que frequentaram aquele espaço e quiseram recuperá-lo para acolher refugiados ucranianos.

André Serrano frequentou aquele espaço, entre 1996 e 1998, e confessa que nunca gostou do destino a que foi votado. “Nós vivíamos aqui, estudávamos na escola preparatória de Fornos de Algodres, mas fazíamos a vida toda aqui, estudar, rezar, tratar da casa, íamos uma vez por mês a casa, éramos cerca de 70 pessoas na altura, mas chegou a ter 130, éramos uma família, muito unidos”, recorda.

“Era uma pena o espaço estar fechado, um edifício com três mil metros quadrados que alberga muita gente e então falámos entre colegas e pedimos o espaço à diocese, falámos também com a Câmara para ajudar quem precisa”, acrescenta André Serrano.

“Não é realidade dizer que existe mais oferta que procura”

Convencido de que ainda faltam espaços para acolher refugiados, André Serrano reparou num padre amigo, “o padre Leitão, que foi à Ucrânia e trouxe famílias de lá e não é a realidade que existe mais oferta que procura, a nível do alojamento”, observa.

“Queremos arranjar um autocarro para trazer mais pessoas para cá, sabemos que há pessoas lá para vir, é preciso um trabalho de ir até à fronteira buscá-los. Todas essas pessoas serão identificadas pelo governo ucraniano e SEF”, garante o arquiteto, que aproveita todas as folgas na recuperação do edifício.

“Tínhamos telhas partidas, com infiltrações, caleiras e sarjetas entupidas, janelas e pinturas danificadas, que se soltaram com o tempo. Estamos a fazer um pouco de tudo, remodelação da canalização existente, tratamento das paredes, temos tido patrocínios, o edifício precisava de tudo.”

André Serrano conta que a recuperação do Seminário de Fornos de Algodres, para receber os refugiados da guerra na Ucrânia, é um grande trabalho de equipa.

“Os colegas e outros voluntários têm aproveitado as folgas e os fins de semana para vir para aqui, os meus filhos vêm para aqui ajudar, todos os dias há pessoas diferentes a trabalhar”, revela.

Trinta casas de banho para reparar e tudo por equipar

Vasco Tembe, de 43 anos, é carpinteiro. Está a trocar fechaduras e a consertar as portas do antigo seminário. Natural de Moçambique, chegou há uma semana a Portugal. “Está muito difícil mesmo em Moçambique, a gasolina subiu, o pão subiu. Se fosse por mim, parava com a guerra”, desabafa.

Para André Serrano, o objetivo é ter numa primeira fase capacidade para 50 a 70 pessoas e insiste que quer ver as obras concluídas até ao final do mês, “porque há pressa em ir buscar famílias à Ucrânia e por isso toda a ajuda é bem-vinda”.


O edifício tem capacidade para mais de 100 pessoas, mas numa primeira fase, conta o arquiteto, haverá seis camaratas com capacidade para 50 a 70 pessoas e cerca de 20 quartos individuais.

“Estamos a preparar as 30 casas de banho, não é fácil reparar um edifício assim”, assume o arquiteto, admitindo outras vagas, caso seja necessário. “Temos vários salões que podem ser adaptados para camaratas, tem uma cozinha enorme, refeitório, capela, tudo vazio, estamos por isso a fazer um peditório”, alerta.

Toda a ajuda é bem-vinda

Fogões, arcas, móveis, torradeiras, micro-ondas, termo-acumuladores, colchões e até alimentação, “tudo o que vier para ajudar é bem-vindo”, refere André Serrano, lamentando que “o fogão e outros equipamentos tenham sido vandalizados e roubados por causa do cobre, ao longo destes anos”.

Quem quiser ajudar pode entregar diretamente os bens no Seminário ou nas paróquias locais. Fica ainda disponível o correio eletrónico: antigoseminariodefornos@gmail.com com a certeza de que “o pouco que puderem dar é muito para esta causa. O edifício precisava de tudo, hoje são eles, mas amanhã podemos ser nós”, afirma o arquiteto, antigo seminarista.

O edifício e a quinta do Seminário Menor de Fornos de Algodres correspondem a uma área 650 mil metros quadrados, com árvores de fruto, campo de futebol e um parque infantil em construção.

“Até ao final deste mês esperamos ter isto pronto para receber as primeiras pessoas”, garante André Serrano, na presença da filha Adriana que sonha com o fim da guerra. “Só digo uma coisa, o Putin não devia ter começado esta guerra, ele já tem muita coisa, para que é que ele quer mais? Que fique com as coisas dele e a Ucrânia fica com as dela”, diz Adriana, enquanto encolhe os ombros.

O edifício do Seminário Menor de Fornos de Algodres funcionou como local de formação para seminaristas até 2006, altura em que se tornou um espaço vazio à espera de um novo destino, apenas a quinta circundante era aproveitada para produção agrícola.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

Destaques V+