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Papa recorda “alegria no rosto e adrenalina no sangue” por ver futebol ao vivo

02 jan, 2021 - 20:37 • Filipe d'Avillez

Francisco concedeu uma entrevista ao principal jornal desportivo de Itália em que recorda Maradona como um poeta no campo, mas um homem frágil, ao contrário dos atletas paralímpicos, que lhe recordam a força da vida.

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O Papa Francisco recorda a “alegria no rosto e a adrenalina no sangue” das idas ao futebol quando era mais novo e seguia com os seus familiares e amigos as sortes do San Lorenzo, na Argentina.

Numa longa entrevista o jornal “Gazzeta dello Sport”, um dos principais desportivos de Itália, Francisco falou das suas memórias de Diego Armando Maradona e de como o desporto pode ser uma escola para a vida e uma forma de chegar aos mais novos.

Sobre os seus tempos nas bancadas, diz que “lembro-me muito bem e com prazer quando, em criança, a minha família ia ao estádio El Gasómetro. Lembro-me, em particular, do campeonato de 1946, que o meu San Lorenzo venceu. Lembro-me daqueles dias que passei vendo os jogadores e da nossa alegria quando voltávamos para casa: a alegria no rosto, a adrenalina no sangue.”

“Tenho outra memória, a da bola de trapos, da pelota de trapo: o couro era caro e éramos pobres, a borracha ainda não era tão habitual, mas bastava uma bola de trapos para nos divertirmos e quase fazer milagres brincando na praça perto de casa”, diz Francisco, acrescentando todavia que pela sua falta de jeito acabava quase sempre relegado para a baliza, o que não deixou de ser uma excelente “escola de vida”.

“O guarda-redes deve estar pronto para responder aos perigos que podem vir de qualquer lugar”, diz.

Sem grandes dotes futebolísticos, o Papa diz que gostava de jogar basquete, tal como o seu pai, que jogou pelo San Lorenzo.

Fé desportiva? Sim, de certa forma

A sua familiaridade com a linguagem do desporto permite ao Papa entender que se usem termos religiosos para falar das vivências dentro e fora de campo.

“De alguma forma o desporto é a experiência das pessoas e de suas paixões, marca a memória pessoal e coletiva. Talvez sejam precisamente esses elementos que nos permitem falar de 'fé esportiva’”, considera.

“A Igreja sempre teve um grande interesse pelo mundo do desporto. Podemos dizer que no desporto as comunidades cristãs identificaram uma das gramáticas mais compreensíveis para falar aos jovens”, diz ainda Francisco na entrevista ao Gazzeta dello Sport.

Poetas, frágeis e fortes

Sendo argentino, o Papa admite que vibrou com a vitória da sua seleção no Mundial de 86, apesar de esta ter chegado numa altura difícil da sua vida e de nem sequer ter podido ver o jogo.

Sobre o herói desse campeonato, e ídolo do futebol argentino, o Papa recorda um “poeta em campo”, mas que era também “um homem fraco”.

“Conheci Diego Armando Maradona por ocasião de uma partida pela Paz em 2014: Lembro com prazer tudo que Diego fez pela Scholas Occurrentes, a Fundação que cuida dos necessitados em todo o mundo.”

“Em campo foi um poeta, um grande campeão que deu alegria a milhões de pessoas, tanto na Argentina como em Nápoles. Ele também era um homem muito frágil”, afirma o Papa.

Pelo contrário, diz na entrevista, há atletas que parecem representar a força da vida, nomeadamente os portadores de deficiência.

“Quando vejo do que certos atletas são capazes, que têm algumas deficiências gravadas em seus corpos, fico maravilhado com a força da vida.”

Em nenhum lado isto se revela mais do que nos Jogos Olímpicos, conclui o Papa. “No desporto, gosto da ideia de inclusão, esses cinco círculos que se juntam e acabam por se sobrepor: é uma imagem esplêndida de como o mundo poderia ser.”

Sete palavras, sete ideias sobre desporto

Na entrevista ao Gazetta dello Sport Francisco refere sete conceitos que considera fundamentais sobre o desporto.

Lealdade – O doping no desporto não é apenas um engano, um atalho que anula a dignidade, mas é também querer roubar de Deus aquela centelha que, por seus misteriosos desígnios, deu a alguns de maneira especial e maior.

Empenho – No desporto, não basta ter talento para vencer: é preciso guardá-lo, moldá-lo, treiná-lo, vivê-lo como uma oportunidade de buscar e mostrar o melhor de nós.

Sacrifício – O atleta é um pouco como o santo: conhece o cansaço, mas não pesa porque, no esforço, consegue vislumbrar algo mais além.

Inclusão – Certamente as Olimpíadas, das quais sempre apreciei o desejo inato de construir pontes em vez de muros, também podem representar simbolicamente o sinal de um novo começo com um novo coração.

Espírito de Grupo – O espírito de equipa é essencial na lógica do desporto, e também na vida quotidiana.

Ascese – É o exercício que faz os ascetas e é através de exercícios constantes e cansativos que algumas habilidades são refinadas.

Redenção – É por isso que o desporto está cheio de gente que, com o suor da testa, vence os que nascem com o talento no bolso. Os pobres têm sede de redenção.

A entrevista concedida pelo Papa ao “Gazzeta dello Sport” foi publicada este sábado e pode ser lido no italiano original em três partes aqui, aqui e aqui.

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