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Livro conta histórias de vida que se cruzam com o estudo da teologia

31 dez, 2019 - 09:21 • Ana Lisboa

A obra foi feita a partir de cerca de 40 conversas com antigos e atuais alunos e professores da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. O autor do livro, António Marujo, procurou “refletir o interesse das pessoas pela teologia”.

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Chama-se “Teologia como resistência” e assinala os 50 anos da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. Foi recentemente lançado por dois jornalistas: António Marujo escreveu e António Pedro Ferreira fotografou.

A partir de cerca de 40 conversas com antigos e atuais alunos e professores da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, António Marujo procurou desde logo “refletir o interesse das pessoas pela teologia”.

Para muitos, a mera existência de cursos universitários cujo objeto de estudo é Deus é desconcertante. O Papa Bento XVI conta num livro-entrevista como um colega ateu, professor na Universidade de Ratisbona, se mostrou perplexo pelo facto de lá existirem não uma mas duas faculdades dedicadas a algo que não existe, uma protestante e outra católica.

Contudo, ontem como hoje não há falta de candidatos para estudar teologia, e não são apenas seminaristas. A partir de cerca de 40 conversas com antigos e atuais alunos e professores da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, o jornalista António Marujo procura “refletir o interesse das pessoas pela teologia”.

Em seu entender, as conversas fizeram-se “entre a reflexão das pessoas, as razões de se aproximarem desta área de estudos e as suas histórias de vida e o modo como elas se cruzam com o estudo da teologia”.

O livro “procura ser o reflexo disso, portanto, não é simplesmente um repositório das conversas de perguntas e respostas. É antes um cruzamento de olhares a partir de sete áreas diferenciadas e, por isso, surge organizado em sete capítulos. E foi esse o itinerário”.

O título do livro, “Teologia como resistência”, “expressa essa ideia da teologia ajudar a ser um fator de resistência numa sociedade e num tempo em que estamos a perder essa capacidade, ou pelo menos a dar atenção a essa capacidade do pensar. E depois também como um fator de resistência para a própria reflexão sobre a questão de Deus, ou seja, para não reduzir a questão de Deus a dados adquiridos, a lugares comuns, a construções já feitas, mas ser permanentemente um questionar daquilo que a tradição trouxe e de, nessa tradição, ser capaz de refletir e de colocar novas questões e novas perguntas, sobretudo tendo em conta que as sociedades vão mudando e, portanto, também as perguntas das pessoas vão mudando”.

As perspetivas dos testemunhos foram muito diferentes, há uma grande diversidade de olhares, daí o livro estar dividido em sete capítulos que abordam diversas formas de teologia.

António Marujo admite que é diferente “estarmos a falar com um professor de teologia que dedica a isso praticamente o seu tempo todo ou estar a falar com um antigo aluno que, entretanto, trabalha numa empresa de transportes, ou dá aulas de moral, ou já foi ou ainda exerce funções de autarca ou trabalha na área de desporto”.

Assim, há capítulos, sobretudo o primeiro e o segundo, “mais voltados para essa ideia que está expressa no título. Depois há capítulos mais voltados para a intervenção social e política ou para as questões morais, eclesiais e teológicas em sentido estrito. Um capítulo mais dedicado, por exemplo, àquilo que foi a própria construção da faculdade em termos históricos e em termos práticos. E um também, que é o final, que é dedicado sobretudo à questão das mulheres, porque me pareceu – pelo facto de haver aqui algumas mulheres a falar e esse tema apareceu nas conversas – pareceu-me também que fazia sentido construir um dos capítulos e partir desse olhar e dessa questão concreta”, justifica o autor do livro.

Os testemunhos recolhidos trouxeram surpresas a Marujo. O próprio reconhece que “as pessoas que eu conhecia e muitas outras que eu desconhecia, à partida foram uma grata surpresa, porque todas elas trouxeram contributos muito interessantes e olhares muito diferenciados. Portanto, a riqueza do trabalho foi perceber que toda a gente tinha coisas muito interessantes para contar e para dizer”.

Estudar as coisas de Deus para pensar a condição humana

Mas afinal o que é que a teologia traz à vida dos nossos dias? O jornalista afirma que “traz desde logo essa capacidade de nos ajudar a pensar, a pensar a condição humana, porque a teologia não existe sem a condição humana. E depois pensar essa condição na perspetiva da relação com o transcendente”.

Há cada vez mais pessoas interessadas nesta área. “A Faculdade de Teologia tem tido um crescimento a esse nível nas últimas duas ou três décadas. Em Portugal obviamente não temos uma realidade semelhante à de outros países, ou seja, há países onde o debate teológico, onde o número de teólogos e teólogas que não são clérigos a fazer teologia tem crescido exponencialmente. E hoje há grandes teólogos que não são clérigos pela Europa fora, nos Estados Unidos, na América Latina, e não só. Em Portugal ainda não chegámos a isso. Penso que apesar de tudo, o caminho que se tem feito aponta nessa direção”, confessa António Marujo.

O prefácio do livro foi escrito pelo cardeal patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, que admite que a cultura portuguesa “está cheia de referências teológicas, em sinais, alusões e decorrências”.

E acrescenta “os verbos que demarcam as frases, os tópicos que mobilizam o espírito, a própria organização dos espaços, têm muita teologia por dentro. Tudo derivado de séculos em que os púlpitos eram quase toda a oratória e os sermões provinham de casas onde se estudava teologia. Na universidade desde o século XV, mas antes e depois em mosteiros e conventos”.

Referindo-se à Faculdade de Teologia da UCP, D. Manuel Clemente faz ainda um “agradecimento aos que conseguiram fundá-la e aos que lhe deram e dão vida: professores, alunos e colaboradores. São muitos já e presentes em vários setores, dentro e fora do país”.

Reconhece ainda que “a quantidade e a qualidade dos diplomados que formou, das publicações que editou, dos centros de investigação que mantém, é muito considerável em termos portugueses e até reconhecida nos meios internacionais”.

O Patriarca termina o seu texto dizendo que “hoje e em Portugal só não obtém conhecimento seguro sobre algum tema teológico quem não o queira ter, porque não sabe ou não quer saber. (…) Em Braga, Lisboa ou Porto e em todo o tempo e lugar via internet, a Faculdade de Teologia aí está, franca e disponível, para servir a Igreja e para que a Igreja sirva qualificadamente a sociedade e a cultura portuguesas”.

As fotografias que ilustram o texto de António Marujo são do fotojornalista António Pedro Ferreira. “Quem vir o livro perceberá também a forma como o António Pedro captou tão bem os diversos entrevistados”, diz o jornalista e autor do livro.

Marujo sublinha que esta “será uma leitura estimulante, as pessoas irem lendo o texto e olharem depois para a fotografia e perceber que essa fotografia diz muito daquilo que a pessoa transmite nos textos. Portanto, acho que nesse pormenor o António Pedro captou muito bem esse olhar e a reflexão que cada uma das pessoas fez e o seu próprio modo de ver a teologia e as propostas de reflexão que fez sobre ela”.

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