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Papa pede a cristãos que sejam profetas contra a guerra e as armas nucleares

24 nov, 2019 - 07:46 • Aura Miguel , Filipe d'Avillez

Francisco dedica este domingo a visitar Hiroxima e Nagasáqui, as duas cidades que foram destruídas pelo uso de armas nucleares durante a II Guerra Mundial.

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O Papa Francisco pediu este domingo aos cristãos que sejam profetas contra a guerra e contra as armas nucleares, que classificou como fenómenos que “bradam aos céus”.

Francisco dedicou este segundo dia da sua viagem ao Japão a visitar as cidades de Nagasáqui e de Hiroxima, que foram destruídas no final da Segunda Guerra Mundial, sendo ainda hoje as únicas duas cidades atingidas pelo uso de armas nucleares.

Em Nagasáqui Francisco visitou o local preciso onde a bomba atómica explodiu, conhecido como o hipocentro, que é hoje um parque e leu uma mensagem sobre o horror da guerra nuclear em que evocou a imagem de Nossa Senhora que foi encontrada na catedral depois da explosão.

“Este lugar torna-nos mais conscientes do sofrimento e do horror que nós, seres humanos, somos capazes de nos infligir. A cruz bombardeada e a estátua de Nossa Senhora, recentemente descobertas na Catedral de Nagasáqui, lembram-nos mais uma vez o horror indescritível que sofreram na própria carne as vítimas e suas famílias.”

O Papa não se limitou a denunciar o uso das armas nucleares, mas criticou também a própria corrida aos armamentos, negando a eficácia do argumento da dissuasão nuclear, que defende que a simples ameaça de aniquilação mútua impede a guerra entre ou contra países que possuem este tipo de armas.

“Aqui nesta cidade, que é testemunha das catastróficas consequências humanitárias e ambientais dum ataque nuclear, nunca serão demais as tentativas de erguer a voz contra a corrida aos armamentos. Esta desperdiça recursos preciosos que poderiam, ao contrário, ser utilizados em benefício do desenvolvimento integral dos povos e para a proteção do meio ambiente natural.”

“No mundo atual, onde milhões de crianças e famílias vivem em condições desumanas, o dinheiro gasto e as fortunas obtidas no fabrico, modernização, manutenção e venda de armas, cada vez mais destrutivas, são um atentado contínuo que brada ao céu. Um mundo em paz, livre de armas nucleares, é aspiração de milhões de homens e mulheres em toda a terra. Tornar realidade este ideal requer a participação de todos”, disse ainda Francisco.

Antes de conduzir os presentes na recitação da oração de São Francisco, pela Paz, o Papa fez ainda um apelo dirigido mais diretamente aos políticos. “Com a convicção de que é possível e necessário um mundo sem armas nucleares, peço aos líderes políticos para não se esquecerem de que as mesmas não nos defendem das ameaças à segurança nacional e internacional do nosso tempo. É preciso ter em consideração o impacto catastrófico do seu uso, sob o ponto de vista humanitário e ambiental, renunciando ao aumento dum clima de medo, desconfiança e hostilidade, promovido pelas doutrinas nucleares.”

Mais tarde o Papa ainda celebrou missa em Nagasáqui, partindo da leitura do Evangelho sobre o “bom ladrão”, que ao lado de Cristo crucificado opta por não gozar com ele, como fazem alguns dos transeuntes e mesmo o outro criminoso crucificado com eles, pedindo antes a Jesus “lembra-te de mim quando entrares no teu reino”.

“Estas terras experimentaram, como poucas, a capacidade destrutiva a que pode chegar o ser humano. Por isso, como o bom ladrão, queremos viver o instante em que se possa erguer as nossas vozes e professar a nossa fé em defesa e ao serviço do Senhor, o Inocente sofredor. Queremos acompanhar o seu suplício, sustentar a sua solidão e abandono, e ouvir mais uma vez que a salvação é a palavra que o Pai deseja oferecer a todos”, disse, deixando um apelo para que os cristãos saibam ser profetas da paz.

“Nagasáqui carrega na sua alma uma ferida difícil de curar, sinal do sofrimento inexplicável de tantos inocentes; vítimas atingidas pelas guerras de ontem, mas que sofrem ainda hoje com esta terceira guerra mundial aos pedaços. Levantemos, aqui, as nossas vozes numa oração comum por todos aqueles que hoje estão a sofrer na sua carne este pecado que brada ao céu e para que sejam cada vez mais aqueles que, como o bom ladrão, sejam capazes de não se calar nem zombar, mas de profetizar, com a sua voz, um reino de verdade e vida, de santidade e graça, de justiça, amor e paz.”

Memória dos mártires

Entre a mensagem no hipocentro da bomba atómica em Nagasáqui e a celebração da missa, o Papa visitou o monumento aos mártires cristãos que existe naquela cidade.

Foi precisamente na região de Nagasáqui que se formou a maior comunidade cristã na altura em que os primeiros missionários chegaram ao país. O monumento evoca a memória de São Paulo Miki, um de muitos cristãos japoneses que preferiram dar a vida do que abandonar a fé.

Francisco aproveitou o momento para rezar pela liberdade religiosa também nos dias de hoje, em todo o mundo.

“Irmãos, neste lugar, unimo-nos também aos cristãos que hoje, em tantas partes do mundo, sofrem e vivem o martírio por causa da fé. Mártires do século XXI, que nos interpelam com o seu testemunho a seguir corajosamente o caminho das Bem-aventuranças.”

“Rezemos por eles e com eles, e ergamos a voz para que a liberdade religiosa seja garantida a todos nos vários cantos do planeta; e ergamos a voz também contra toda a manipulação das religiões ‘pelas políticas de integralismo e divisão, pelos sistemas de lucro desmesurado e pelas tendências ideológicas odiosas, que manipulam as ações e os destinos dos homens’”, disse o Papa, citando o documento sobre a fraternidade humana que foi assinado em Abu Dhabi com representantes da comunidade islâmica, em fevereiro de 2019.

Ainda este domingo o Papa viaja para Hiroxima, onde vai participar num encontro pela paz no memorial daquela cidade. Volta depois para Tóquio.

Na segunda-feira o Papa tem novamente um dia cheio, que inclui um encontro com as vítimas do sismo, tsunami e desastre nuclear de 2011, um encontro privado com o novo imperador do país, Naruhito, um encontro com jovens na Catedral de Santa Maria, missa campal e um encontro com as autoridades civis.

A visita de Francisco termina na terça-feira, dia em que regressa a Roma.

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