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“É importante o Papa escutar as Igrejas Católicas de rito oriental”

27 out, 2016 - 18:12 • Filipe d'Avillez

O líder da Igreja Greco-Católica da Ucrânia, que conheceu bem Francisco de quando vivia na Argentina, sublinha a proximidade do Papa às tradições orientais.

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O arcebispo-maior Sviatoslav Shevchuk sente-se confortável com o nível de autonomia de que goza a igreja a que preside, no seio da Igreja Católica.

Vários líderes das mais de 20 igrejas de rito oriental que estão em comunhão com Roma queixam-se de não terem autorização da Santa Sé para cuidar dos seus fiéis fora dos seus territórios tradicionais. Até há cerca de dois anos não lhes era permitido ordenar homens casados ao sacerdócio em países ocidentais e ainda hoje não têm liberdade de nomear bispos para as dioceses que ficam fora dos seus países.

Mas o líder da Igreja Greco-Católica da Ucrânia, que com mais de cinco milhões de membros é a maior das igrejas católicas orientais, não partilha das críticas de alguns dos seus pares e prefere ver o lado positivo da questão.

Em Portugal para participar num encontro de bispos católicos de rito oriental na Europa, que discutiu precisamente o cuidado pastoral de fiéis imigrados em países ocidentais, Sviatoslav Shevchuk, de 46 anos, falou com a Renascença sobre este e outros assuntos, incluindo a posição da sua igreja como obstáculo às relações entre Roma e Moscovo.

Alguns membros de igrejas orientais queixam-se de que Roma não lhes dá autonomia suficiente. Concorda?

Eu prefiro enfatizar não tanto a questão da autonomia, mas mais a da colaboração e comunhão. No caso dos emigrantes orientais a viver no Ocidente, o bispo católico local tem a sua responsabilidade, mas a Igreja-mãe oriental também. Como é que podemos colaborar? Como é que podemos ajudar-nos uns aos outros a sermos bons pais para os migrantes na Europa?

Mas não é verdade que no caso da nomeação de bispos para fora dos vossos territórios tradicionais, dependem de Roma?

Quando precisamos de eleger um bispo fazemo-lo no nosso sínodo. Mas para a diáspora é suposto elegermos três candidatos que apresentamos ao Santo Padre e ele tem autoridade para escolher um de entre esses três, de acordo com a sua visão e tendo em conta quem seria mais apto para essa responsabilidade.

E esse é um processo com o qual se sente confortável? Ou preferia poder nomeá-los directamente?

Até agora sentimo-nos confortáveis, porque a eleição de um novo bispo não é apenas uma questão interna e privada. Um novo bispo é um bispo para a Igreja Católica toda. E é deste modo que conseguimos estar não só em diálogo, partilhando informação, mas em comunhão com o Santo Padre.

Para o Santo Padre também é muito importante ter esta possibilidade de poder escutar as decisões dos diferentes sínodos das Igrejas Católicas de Rito Oriental.

Tornou-se líder da sua Igreja durante o pontificado de Bento XVI, mas antes disso esteve na Argentina, de onde conhece bem o actual Papa Francisco. É sabido que ele conhece bem as tradições católicas orientais. Isso tem-se reflectido no seu pontificado?

Creio que sim. Na Argentina ele era o bispo ordinário para os católicos orientais que não tinham a sua própria estrutura eclesiástica, o que fazia dele o responsável pelo acompanhamento pastoral dos católicos orientais naquele país.

Acresce que a eparquia [diocese] católica ucraniana na Argentina faz parte da Arquidiocese de Buenos Aires, por isso ele era o meu superior directo e eu tive a oportunidade de me encontrar muitas vezes com ele para discutir a situação da Igreja Greco-Católica Ucraniana a nível global, por isso ele conhece bastante bem a nossa espiritualidade e a nossa identidade. Mais, o padre salesiano que era o seu director espiritual na escola em Buenos Aires era ucraniano e por isso ele costuma cumprimentar os nossos bispos em ucraniano.

Mas penso que a visão da Igreja Universal de uma perspectiva latino-americana traz novos horizontes e perspectivas, mesmo para os católicos orientais na Europa.

Muitos dos seus fiéis referem-se a si como patriarca, mas na verdade não tem esse título, mas sim o de arcebispo-maior. Consta que isso é para não irritar a Igreja Ortodoxa da Rússia…

O Patriarcado é uma fase normal e orgânica de uma Igreja Católica de Rito Oriental e nós já atingimos essa fase de desenvolvimento. Os nossos fiéis estão a rezar pelo Patriarcado. Nas nossas relações com o Santo Padre estamos a tentar ser bons católicos, de acordo com a nossa tradição, mas em plena comunhão com o sucessor de Pedro, à imagem do que acreditamos ter sido a Igreja no primeiro milénio.

Claro que os nossos irmãos ortodoxos têm uma eclesiologia diferente. Eles entendem o papel do sucessor de Pedro de outra forma e negariam qualquer forma de supremacia do Papa na Igreja Universal. Em todo o caso, estamos a tentar ser nós próprios, estamos a tentar testemunhar e revelar a realidade da Igreja indivisa do primeiro milénio.

A vossa existência é invocada muitas vezes pelos ortodoxos como um obstáculo ao aprofundamento das relações ecuménicas. Teme que a Igreja Greco-Católica da Ucrânia venha a ser sacrificada em nome da melhoria das relações com Moscovo?

De todo. Estamos a tentar ser nós próprios e falar em nome do nosso povo. Se sentirmos que as coisas não estão a ser bem interpretadas, então tentamos transmitir a realidade do que se passa no nosso país hoje.

A Ucrânia continua em guerra. Quando é que vai haver paz?

Nós rezamos pela paz. Trabalhamos pela paz. Defendemos a paz. E penso que Deus abençoará a nossa nação e o nosso povo com a sua bênção divina, e essa bênção trará a paz.

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