09 dez, 2024 - 17:40 • Susana Madureira Martins
Entrevista no Forte de Peniche
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Carlos Carvalhas, ex-secretário-geral do Partido Comunista Português (PCP), reafirma a versão oficial do partido e garante que a cúpula da direção comunista não deu qualquer ordem aos militares paraquedistas para avançarem ou recuarem nas movimentações do dia 25 de novembro de 1975.
Numa entrevista exclusiva à Renascença, em conjunto com Jerónimo de Sousa e Paulo Raimundo, Carlos Carvalhas assume que Álvaro Cunhal, à altura o líder do partido, nas vésperas do 25 de novembro, telefonou ao Presidente da República, Costa Gomes, a dizer que o Partido Comunista Português “não estava metido em golpes nenhuns e que condenava qualquer golpe”.
Carvalhas defende que “quem conhece o camarada Álvaro Cunhal, sabe que ele não avançaria com esta palavra para depois de manhã dizer, ‘olhem, avancem’", assumindo ainda como “falso” que tenha tido qualquer participação no desenrolar das movimentações dos militares.
Questionado várias vezes pela Renascença sobre a participação do PCP no 25 de novembro e se houve ordem aos militares para avançar, Carvalhas defende o partido que liderou: “Isso serve àqueles que tinham preparado o golpe, e, portanto, para se justificar, avançam com isso”. E para travar o golpe também não houve? “Não houve para travar”, garante o ex-secretário-geral comunista.
“Qual recuar, recuar era se tivéssemos participado, quando dizem ‘recuar’, estão, naturalmente, a dizer que isto não é neutro, quando se diz a recuar é porque tínhamos avançado”, justifica Carvalhas. E “não, não tínhamos avançado nada”, acrescenta.
PCP
Nas vésperas do XXII Congresso do PCP, a Renascenç(...)
O ex-líder comunista refuta o conteúdo do relatório “secreto” escrito por um militar do PCP, Luís Pessoa, recentemente divulgado pelo jornal Expresso e que conta que terá sido este partido a dar a ordem aos militares para avançar e depois para recuar para “evitar uma guerra civil”.
Curiosamente, na entrevista conjunta que deu à Renascença, ao mesmo tempo que recusa a participação dos comunistas no espoletar do 25 de novembro, Carvalhas usa exatamente a expressão usada no referido relatório de Luís Pessoa para explicar as movimentações do PCP nesse dia de 1975.
“O que houve foi a preocupação de evitar uma guerra civil e houve a preocupação, naturalmente, do Partido Comunista, sabendo que estavam tantas tropas em movimento, defender também os seus centros de trabalho”, justifica o antigo secretário-geral e ex-secretário de Estado do Trabalho.
Garantindo que não houve dedo da cúpula do PCP nas movimentações militares do 25 de novembro, Carvalhas admite, por outro lado, que, naquela altura, o controlo do partido sobre os militantes não era total.
“O partido não tinha uma organização tão estreita e tão próxima como tem hoje e como teve depois à frente”, começa por justificar Carvalhas. “Na altura havia muitos militantes mais desgarrados e que muitas vezes também jogavam por conta própria”, diz o ex-líder do partido, reforçando que na altura não era dirigente do PCP.
O ex-secretário-geral do PCP brinca ainda com a situação ao reforçar que não houve qualquer ordem de Cunhal aos militares via Jaime Serra, à altura dirigente comunista com ligações ao Movimento das Forças Armadas.
“Nessa altura, creio, não havia WhatsApp, mas havia escutas e não eram poucas, estávamos num período de grande convulsão, portanto, não havia WhatsApp, mas havia escutas e nós estamos mesmo a ver dois ingénuos na luta clandestina a falarem para o Luís Pessoa e o Jaime Serra a dizer, ‘olhe, Luís Pessoa, tenho aqui ao meu lado o camarada Álvaro Cunhal’, ironiza Carvalhas.
Carvalhas é também referido pelo Expresso como tendo contactado Luís Pessoa a pedir-lhe para se entregar à Presidência da República, mas não tem memória de alguma vez ter contactado o antigo militar por alturas do 25 de novembro.
“Tive contactos com o Capitão Pessoa ou o Engenheiro Pessoa antes do 25 de Abril, foi ele que, por intermédio da mulher, que trabalhava comigo na Profabril, me disse que iam sair no dia 25. No dia 24 disse-me isso”, garante Carvalhas. “A seguir ao 25 de Abril, nunca mais contactei com ele, não me lembro de ter contactado com ele, francamente”, acrescenta.
Puxando a fita do tempo atrás, o ex-líder do PCP assume mesmo nada teve a ver com a situação. “Quando ele disse que eu o convenci a entregar-se, francamente, creio que isso é falso, era um facto relevante que eu me lembraria, não está na minha memória e nem percebo porque seria eu, não era do círculo próximo dos seus amigos, não tinha uma ligação partidária com ele”, justifica ainda Carvalhas que questiona: “Porque aparece, posteriormente, o meu nome?”
Carvalhas garante que a “preocupação” do PCP foi “unir as correntes militares que estavam em confronto, porque sabiam perfeitamente que a divisão levaria ao fracasso, levaria a quebrar a perna principal”, ou seja, a “perna militar”.
“A revolução marchava, naquela altura, em duas pernas, a perna militar e a perna popular, quebrou-se a perna militar”, resume Carvalhas, garantindo, de novo que, a “preocupação do Partido foi evitar sempre a guerra civil”.
Este é um excerto de uma longa entrevista aos três secretários-gerais do PCP, Paulo Raimundo, Jerónimo de Sousa e Carlos Carvalhas – que ocupou o cargo depois de Álvaro Cunhal.
Ficha técnica: Cristina Nascimento e Susana Madureira Martins (entrevista), Ana Kotowicz (textos), Ricardo Fortunato, Beatriz Pereira e Catarina Santos (imagem e edição), José Ferreira, Diogo Rosa e José Loureiro (som), Diogo Casinha (edição de som), Tomás Anjinho Chagas (rádio e textos), Pedro Leal, Arsénio Reis e Maria João Cunha (coordenação)