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O que diz o relatório sobre a privatização da TAP? “Nada há a esconder”, diz Pinto Luz

03 set, 2024 - 10:49 • João Malheiro , Diogo Camilo com Lusa

Ministro era secretário de Estado e esteve envolvido no processo de privatização da companhia aérea em 2015. IGF conclui que a TAP foi comprada com a garantia da própria TAP. Livre critica "chico-espertice" e Bloco de Esquerda diz que Pinto Luz “não tem idoneidade”.

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O ministro das Infraestruturas e Habitação recusou-se a comentar a auditoria da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) que refere que a TAP foi comprada com dinheiro da empresa em 2015.

Na altura, Pinto Luz era secretário de Estado e esteve envolvido no processo de privatização da companhia aérea. Agora, o governante não quis comentar o caso. No entanto, quando questionado se ainda teria condições para se manter no Governo, Pinto Luz aponta que a sua "legitimidade compete ao primeiro-ministro".

O ministro das Infraestruturas e Habitação falava aos jornalistas à chegada a uma reunião na sede da Área Metropolitana do Porto (AMP),

"Continuarei a exercer o meu cargo com toda a competência, com toda a seriedade e com todo o comprometimento para com os portugueses", garantiu Miguel Pinto Luz, após ser questionado sobre a legitimidade para exercer o cargo e liderar nova privatização da TAP.

O Governo já enviou o relatório da IGF sobre a TAP ao Ministério Público e à Assembleia da República após o ter recebido na semana passada, disse também o governante.

"Nada há a esconder, foi tudo transparente, é por isso que este Governo se pugna. Pugna por transparência, por total abertura dos processos. Foi isso que fizemos, aguardaremos os resultados", afirmou.

Miguel Pinto Luz foi secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações do segundo governo de Pedro Passos Coelho (PSD/CDS-PP), que durou apenas 27 dias em 2015 e finalizou o processo de privatização da TAP, sendo depois derrubado por uma moção de censura da maioria parlamentar de esquerda.

O que está em causa?

No relatório da Inspeção-Geral das Finanças, é detalhado que a compra de 61% da companhia aérea ao Estado, em 2015, por um consórcio de David Neeleman e Humberto Pedrosa, a Atlantic Gateway, foi financiada com um empréstimo de 226 milhões de dólares que tinha como contrapartida a compra de 53 aviões da empresa à TAP e a própria companhia aérea a servir de garantia pelo crédito.

Ou seja, a IGF conclui que a TAP foi comprada com a garantia da própria TAP.

Segundo o jornal Público, a IGF afirma que a operação era do conhecimento da Parpública, que junta as participações empresariais do Estado, e dos titulares das Finanças e das Infraestruturas do então Governo liderado por Pedro Passos Coelho.

Na altura, Maria Luís Albuquerque era ministra das Finanças e Sérgio Monteiro era secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações.

As suspeitas sobre o negócio da privatização em 2015 são públicas pelo menos desde fevereiro de 2023.

O que consta do relatório?

Além da garantia para o financiamento ser a própria TAP, a IGF acredita que as remunerações dos gestores da TAP, no período em que foi parcialmente privatizada, foram pagas recorrendo a um contrato de prestação de serviços "simulado", esquivando-se de responsabilidades fiscais.

Segundo o relatório, “não foram encontradas evidências do pagamento” a administradores, mas sim um contrato celebrado a 18 de janeiro de 2016 entre a TAP e a Atlantic Gateway, o consórcio de David Neeleman que comprou a maioria do capital da TAP, através de um contrato de prestação de serviços de planeamento, estratégia e apoio à reestruturação da dívida financeira, incluindo a negociação com as entidades bancárias", sendo a faturação efetuada mensalmente e baseada numa estimativa apresentada até ao dia 31 de janeiro de cada ano, "o qual terá tido por objetivo suportar o pagamento das remunerações aos referidos gestores".

No entanto, os valores remuneratórios (cerca de 3,5 milhões de euros) são inferiores ao do contrato cobrado pela Atlantic Gateway, de 4,26 milhões de euros, para uma diferença de quase 740 mil euros, justificada pela TAP como o resultado da aplicação da Taxa Social Única (TSU) aos valores.

A IGF indica que, mesmo considerando a TSU, o valor “é ainda inferior em 26.134 euros relativamente ao faturado". A IGF detalhou ainda as remunerações de três administradores, com David Pedrosa a receber, entre 2015 e 2020, entre remuneração fixa, prémios e outros itens, mais de 2,6 milhões de euros. Humberto Pedrosa recebeu 436,8 mil euros, um valor igual ao de David Neeleman.

A estes juntam-se mais de 8,5 milhões de euros de remunerações, prémios e prestações de serviço que recebeu o antigo presidente da TAP, Fernando Pinto, entre 2007 e 2020 e incluíram os 175 dias de férias não gozadas que representaram 326 mil euros.

Ao todo, a Inspeção-Geral das Finanças encontrou contratos de prestação de serviços na TAP, de 11,7 milhões de euros, nos quais há "dúvidas" quanto ao beneficiário efetivo.

O que dizem os partidos?

Em reação, o Bloco de Esquerda direciona as suas críticas ao ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, que era secretário de Estado na altura do processo de privatização da TAP, no qual esteve diretamente envolvido.

Mariana Mortágua considera o governante um “ativo tóxico” que tem um currículo que "às vezes parece um cadastro".

"Cabe ao primeiro-ministro decidir o que fazer relativamente a este ativo tóxico", afirmou a líder do BE, considerando que Pinto Luz “não tem idoneidade” para gerir o processo de privatização da TAP.

Já o Livre quer chamar Pinto Luz ao Parlamento, bem como a ministra das Finanças na altura, Maria Luís Albuquerque, que foi escolhida recentemente por Luís Montenegro para comissária europeia.

Para Isabel Mendes Lopes, a líder parlamentar do Livre, a compra da TAP com o próprio dinheiro da empresa é uma “chico-espertice de um empresário".

"Isso é grave, é lesivo para o interesse público e da TAP", defendeu a deputada, que considerou que os responsáveis públicos à altura da privatização "sabiam e foram cúmplices deste esquema".

A deputada do Livre defendeu também que "é muito importante que a investigação do Ministério Público seja feita o mais rápido possível" e que o Ministério Público "seja muito ágil na investigação".

Já a Frente Cívica fala mesmo num “assalto” de David Neeleman no processo de privatização. João Paulo Batalha avisa que os factos conhecidos "mostram, no mínimo, uma negligência criminosa" e que é preciso estar atento "às relações entre o Estado português e as instituições privadas".

No quadro das responsabilidades políticas, o vice-presidente da Frente Cívica entende que o atual ministro das Infraestruturas, na altura secretário de Estado, Miguel Pinto Luz, deve explicações ao país.

Já sobre o papel da então ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, agora indicada pelo Governo para o cargo de comissária europeia, João Paulo Batalha defende que a ligação ao processo deixa a antiga governante fragilizada.

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  • Anastácio Lopes
    03 set, 2024 Lisboa 10:12
    São estas as formas de assumir as responsabilidades inerentes ao cargo que ocupa e pelo qual é pago pelo erário público português? Foi para assim fingir assumir as responsabilidades que este ou qualquer outro ministro assumiu sê-lo? É ou não é ele que tem a tutela da TAP neste momento? Como podem as instituições pertencentes ao Ministério por este ministro tutelado agir de formas diferentes do que quem as tutela e nos dá este vergonhoso exemplo? Só mesmo em Portugal, em pleno século XXI é que o país continua a ter políticos que nunca nada souberam fazer em prol do país e da sociedade, que só se lembram dos cidadãos quando do voto deles necessitam, porque até lá se limitam a gerir as suas carreiras políticas, usando e abusando do povo e das instituições que tutelam, nunca assumindo as responsabilidades que têm em tudo o que as mesmas fazem e não devem fazer e no muito que não fazem e deveriam ter feito, o que só acontece pelas incompetência e irresponsabilidade de quem os tutela. Que vergonha.

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