20 jun, 2024 - 18:37 • Lusa
O PSD e o CDS saudaram esta quinta-feira o diálogo do Governo com os partidos para a elaboração das medidas de combate à corrupção, enquanto o líder do Chega, André Ventura, reclamou vitória ao abordar várias das propostas apresentadas.
Em declarações aos jornalistas na Assembleia da República, em reação às medidas da agenda anticorrupção apresentadas pelo Governo, o líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, saudou o executivo pela iniciativa, sublinhando a "grande capacidade de diálogo com os partidos" na elaboração destas propostas.
O deputado social-democrata confirmou também o anúncio do primeiro-ministro, Luís Montenegro, em relação à intenção das bancadas parlamentares que apoiam o Governo de criarem uma comissão eventual para debater "todas as medidas de combate à corrupção".
Sobre se várias destas propostas são cedências ao Chega, como André Ventura afirmou esta tarde, Hugo Soares disse não saber "se é uma cedência" por não conhecer as propostas do Chega, mas acrescentou que mesmo quando "a ideia é do Chega" não tem "problema nenhum em saudá-la".
Em relação ao mecanismo de perda alargada de bens aprovado, o social-democrata lembrou que "no âmbito de processo de investigação criminal, ainda antes da acusação, é já hoje possível fazer apreensão de bens".
"Isso acontece todos os dias. Eu não queria ir mais longe, mas os senhores conhecem várias operações e investigações em curso, cujo resultado das buscas originou a apreensão de bens", afirmou.
André Ventura, líder do Chega, defendeu que o "confisco de bens pela corrupção e crimes associados é uma grande vitória do Chega", bem como a regulamentação do lóbi e o alargamento do "número de anos em que as pessoas não se podem candidatar ou ocupar cargo depois de serem condenadas".
"Seria hipócrita da nossa parte e da minha parte enquanto presidente do Chega não registar hoje estas boas intenções de se aproximarem do programa do Chega numa área tão fundamental e decisiva não para o Chega, não para o PSD, mas para o país, que é o combate à corrupção sem tréguas", frisou.
Ventura criticou o Governo por apresentar estas medidas "sem calendarizar" e sem especificar "como é que vai concretizar", defendendo que o executivo "está a procurar ganhar tempo numa matéria em que não se deve procurar ganhar tempo".
Para o líder do Chega, sem esses detalhes, as medidas do Governo são "um caderno vago de intenções que não acrescentam nada".
Afirmou ainda que o partido não se oporá à formação de uma comissão eventual, mas que o "país não precisa de mais comissões eventuais para analisar diplomas", mas sim "leis concretas, rápidas, que permitam lutar contra a corrupção de forma mais efetiva".
Paulo Núncio, do CDS, saudou o executivo pelo diálogo mantido com os partidos ao longo da elaboração destas propostas e também pelo conjunto de medidas apresentadas, destacando os avanços para a regulamentação do lóbi e o "combate ao enriquecimento ilícito permitindo o confisco de bens aos autores dos crimes de corrupção".
"Duas medidas, uma do lado da prevenção, outra do lado da penalização e repressão que consideramos fundamental para combater mais eficazmente a corrupção em Portugal", concluiu.
PS e IL manifestaram fortes reservas sobre a eventual perda alargada de bens "independentemente de condenação", com toda a esquerda parlamentar a afirmar que o plano do Governo é vago e que vai aguardar por mais pormenores.
Em reação às medidas "anticorrupção", a líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, considerou que o pacote tem um "caráter algo genérico e vago" e reforça medidas já implementadas por anteriores governos socialistas, ainda que tenha saudado todas as iniciativas que visem combater a corrupção.
Sobre o "novo mecanismo de perda alargada de bens" em alguns casos sem condenação, anunciado pelo Governo, Alexandra Leitão salientou que ou se trata da "perda ampliada que já existe e então não é nada de novo" ou então "é algo que ocorre no âmbito do processo penal mas independentemente de condenação".
"E este "independentemente de condenação" naturalmente deixa-nos com algumas dúvidas, quer relativamente à presunção de inocência quer relativamente ao que acontece se a pessoa é absolvida e, portanto, é um aspeto que já tínhamos referido que consideramos linha vermelha", criticou.
Sobre os mecanismos premiais, Alexandra Leitão manifestou também dúvidas sobre o seu eventual alargamento à fase de inquérito, lembrando que esta fase "não tem intervenção de um juiz e não tem contraditório".
"Assim como a questão da fase de instrução, a instrução são as garantias, achamos bem que seja reequacionada, mas sem que o juiz das garantias perca poder no âmbito do processo", defendeu.
Interrogada sobre se o novo mecanismo de perda alargada de bens anunciado pode significar uma aliança do Governo com o Chega, que defende esta medida, a socialista alertou que "ceder ao populismo seria um péssimo serviço feito ao estado de direto e com essa cedência o PS nunca compactuará".
A socialista saudou a intenção do executivo de regulamentar o lóbi acusando, contudo, o PSD de ter bloqueado uma lei sobre esta matéria em 2019 e 2024 no parlamento.
A líder parlamentar da Iniciativa Liberal, Mariana Leitão, manifestou-se totalmente contra "o confisco de bens ainda antes da acusação", considerando que "atenta diretamente contra a presunção de inocência e atenta também contra o direito à propriedade privada, porque estamos a falar de arrestar bens sem se ter julgado ainda, ou terminado o julgamento de uma determinada pessoa e sem se ter considerado que essa pessoa é culpada pelos crimes dos quais está a ser acusada".
Na ótica da liberal, "só poderá haver este confisco de bens depois de, obviamente, a pessoa ser julgada e de ser condenada pelos crimes que é acusada".
A coordenadora do BE, Mariana Mortágua, defendeu que as propostas do Governo são "um conjunto de títulos de intenções, de promessas, sem qualquer tipo de concretização ou calendário".
A bloquista considerou que "é impossível combater a corrupção sem combater os "offshores"" e criticou o Governo por prometer "arrestar bens que não tem como identificar", defendendo ainda uma auditoria aos "vistos gold".
Pelo Livre, o deputado Paulo Muacho considerou que o Governo apresentou um conjunto de "boas intenções, algumas delas pouco concretas", apesar de acompanhar medidas como a regulamentação do lóbi ou o aumento de proteções para denunciantes.
Sobre o arresto de bens, o Livre irá aguardar pela concretização da proposta. .
O PCP, pelo deputado António Filipe, insistiu que a regulamentação do lóbi não é "uma medida de combate à corrupção" e apelou a um reforço dos recursos humanos das autoridades judiciárias.
O comunista pediu também mais detalhes sobre a proposta de perda alargada de bens considerando-a "muito questionável" e manifestando dúvidas sobre se é "compatível com o ordenamento constitucional e legal" português.
A porta-voz do PAN, Inês Sousa Real, alertou que este pacote pode ser um "tiro de pólvora seca" por não ter medidas de combate aos paraísos fiscais.
A deputada única considerou ainda que é necessário clarificar o mecanismo de confisco de bens: "Ou vai ser muito restritivo para poder caber nos limites da constitucionalidade ou temos sérias dúvidas se não é fogo de vista e se efetivamente esta medida do governo não se vai traduzir numa inaplicabilidade".