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TAP. Comissão de inquérito arranca centrada na indemnização a Alexandra Reis

27 mar, 2023 - 09:23 • Lusa

Os partidos querem que todas as responsabilidades sejam apuradas na comissão parlamentar de inquérito à TAP, mas PS e PSD alertam para a necessidade de prejudicar o mínimo possível a empresa, em processo de privatização.

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A comissão de inquérito à TAP começa esta semana as audições, com a indemnização a Alexandra Reis no centro da discussão, mas deverá também escrutinar o negócio da frota de aviões que está a ser investigado pelo Ministério Público.

A polémica indemnização de meio milhão de euros à ex-governante Alexandra Reis, pela saída antecipada da administração da TAP, levou a uma remodelação no Governo, à exoneração dos presidentes da companhia e à criação de uma comissão parlamentar de inquérito à tutela política da gestão da transportadora aérea.

A comissão, proposta pelo BE, incidirá em particular entre 2020 e 2022, averiguando a entrada e saída da antiga governante Alexandra Reis e as responsabilidades da tutela nas decisões tomadas.

No entanto, e já depois da constituição da comissão, foi noticiado o negócio da troca da frota de aviões Airbus, feito por David Neeleman, em 2015, antes de se tornar acionista da TAP.

O negócio está a ser investigado pelo Ministério Público, na sequência de uma auditoria pedida pela companhia aérea, que motivou a suspeita de que a empresa poderá ter sido lesada.

O empresário brasileiro está na lista de seis dezenas de nomes que vão ser ouvidos no âmbito desta comissão.

Jorge Seguro Sanches preside à comissão

A partir de quarta-feira são ouvidos a Inspeção-Geral de Finanças (IGF), a ex-administradora Alexandra Reis, a presidente executiva exonerada, Christine Oumières-Widener, o presidente do Conselho de Administração exonerado, Manuel Beja, o administrador financeiro, Gonçalo Pires, e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).

A comissão de inquérito é presidida pelo deputado socialista Jorge Seguro Sanches e tem como relatora a deputada Ana Paula Bernardo, também do PS.

O PS, que tem nove dos 17 lugares, indicou como coordenador o vice-presidente da bancada Carlos Pereira, sendo o elenco socialista composto ainda por Vera Brás, Bruno Aragão, Hugo Carvalho, Fátima Fonseca, Rita Madeira e Hugo Costa.

Já o PSD indicou como coordenador o deputado Paulo Moniz e os vice-presidentes da bancada Hugo Carneiro e Paulo Rios de Oliveira e a deputada Patrícia Dantas completam os quatro elementos efetivos do PSD na comissão.

A deputada Mariana Mortágua volta a representar o BE em comissões de inquérito, enquanto o Chega é representado pelo deputado Filipe Melo.

Já a Iniciativa Liberal (IL) tem Bernardo Blanco como efetivo e Bruno Dias está pelo PCP.

PS e PSD querem apurar responsabilidades sem prejudicar privatização

Os partidos querem que todas as responsabilidades sejam apuradas na comissão parlamentar de inquérito à TAP, mas PS e PSD alertam para a necessidade de prejudicar o mínimo possível a empresa, em processo de privatização.

Em vésperas do arranque das audições, os deputados dos partidos com assento na comissão parlamentar de inquérito à gestão política da TAP adiantaram à Lusa as expectativas, objetivos e receios em relação a esta fase dos trabalhos que começa na quarta-feira, com a audição da Inspeção-Geral de Finanças (IGF).

“O PS considera que é muito relevante que estas audições não criem um ambiente hostil à evolução da empresa e aos desafios da empresa, quer no quadro da reestruturação, quer no quadro do processo de privatização em curso”, disse o deputado socialista Carlos Pereira.

O também coordenador do PS na comissão salientou que são “matérias que exigem grande sentido de responsabilidade dos deputados”, para não colocar entraves ao escrutínio, mas, ao mesmo tempo, assegurar que haja o menor "ruído possível" em torno de uma empresa que está a viver, “provavelmente, o maior desafio dos últimos anos”.

“Nós devemos contribuir para que esse escrutínio e essa clarificação seja feita com um enorme cuidado, que exige uma empresa que está a ser intervencionada pelo Estado, que tem um plano de reestruturação e que tem um futuro que pode ser bastante bom, mas também pode ser comprometido com uma comissão de inquérito demasiado intrusiva”, realçou.

Que “não fique nada por esclarecer”

Com o objetivo de que “não fique nada por esclarecer”, o deputado Paulo Moniz, do PSD, considerou que “à medida que o tempo passa, a TAP, de cada vez que se levanta uma pedra, saem duas minhocas”, o que exacerba a importância desta comissão de inquérito.

“Isto não morreu, ao contrário, inclusive, do que o senhor primeiro-ministro já quis fazer entender, que todas as responsabilidades políticas já haviam sido assacadas. Faltou-lhe, do nosso ponto de vista, complementar com uma coisa muito importante: com o que conhecíamos à data”, acrescentou.

Questionado sobre um eventual impacto negativo destas audições na empresa, Paulo Moniz, na mesma linha do PS, pediu um permanente “cuidado e uma certa parcimónia”, “para prejudicar ao mínimo” o processo de privatização, apesar de recusar “esconder a realidade”.

Já Mariana Mortágua, do BE, que propôs esta comissão, considerou que “o que a IGF destapa é uma forma de gestão da TAP, pela tutela política, imprópria, para não dizer outra coisa”.

“A partir do momento em que nós vislumbramos a forma imprópria como a TAP estava a ser gerida, isso reforça a necessidade de ter uma comissão de inquérito que possa, sem achar que vai passar a pente fino a gestão, olhar para alguns elementos-chave e compreender quais são os principais pontos que é necessário melhorar, alterar e responsabilidades que seja necessário apurar”, observou.

Para a deputada bloquista, o relatório da IGF e consequentes demissões ajudam o trabalho da comissão, mas esta pode “ir mais longe”, “quer na atribuição de responsabilidades políticas, quer no âmbito de análise, que na IGF foi muito sucinto e muito restrito”.

Além da importância de investigar o processo de saída de Alexandra Reis, importa para o BE escrutinar outras decisões que possam ter lesado os interesses da TAP, dando como exemplos a intenção de renovar a frota automóvel, os prémios a anteriores administradores e “indícios que na privatização da TAP tenha sido utilizado indevidamente dinheiro da própria TAP num acordo com David Neeleman”.

“Será impossível” completar as audições nesta sessão legislativa

Para Filipe Melo, do Chega, o objetivo “é encontrar os responsáveis que usaram e abusaram do dinheiro público”, que terão de “responder perante os portugueses e perante a justiça, se for caso disso”.

Para o deputado, com a exoneração dos presidentes da companhia aérea, o Governo pretendeu criar “um bode expiatório para tentar sanar automaticamente mais responsabilidades”.

“Cremos que os responsáveis não se esgotam nessas duas pessoas que entretanto foram despedidas”, defendeu.

Filipe Melo arriscou dizer que, “tendo em conta o número de entidades que estão para ser ouvidas”, “será impossível” completar as audições nesta sessão legislativa.

Por sua vez, Bernardo Blanco, da IL, quer o “esclarecimento cabal de todas as ocorrências relativas à nacionalização da TAP”, incluindo “o pretenso interesse estratégico que justificou investir 3.200 milhões de euros dos contribuintes numa empresa que estava numa situação depauperada”.

Adicionalmente, “por uma questão de transparência e escrutínio dos factos, a IL não obstaculizaria a estender temporalmente a comissão de inquérito para datas anteriores a 2020, para averiguar as compras de aviões, até porque o ex-acionista David Neeleman já veio dizer que o Governo do PS estava a par de tudo”, acrescentou.

O deputado comunista Bruno Dias considerou que o aprofundamento de questões relacionadas com a privatização, em 2015, pode “servir também de lição e ensinamento para as opções políticas que temos pela frente em relação à companhia”, que está novamente em processo de abertura de capital a privados.

“Se nós trabalharmos com o objetivo de analisar os factos e identificar os problemas, as decisões erradas, as irregularidades e ilegalidades que estejam em cima da mesa, isso deve ser feito não no sentido de prejudicar a companhia e o interesse público, mas justamente ao contrário”, ou seja, “contribuir para a responsabilização daqueles que tiveram essas práticas e criar condições para assegurar que não voltem a acontecer”, realçou.

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