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Lei da eutanásia. Objeção de consciência é motivo para inconstitucionalidade?

27 jan, 2023 - 07:25 • Ana Catarina André

O diploma tanto refere que os profissionais de saúde que se recusam a praticar a eutanásia têm de justificar a sua decisão, como indica o contrário, alertam os especialistas.

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A lei da eutanásia, sobre a qual o Tribunal Constitucional se deverá pronunciar a 30 de janeiro, mostra-se contraditória no direito dos médicos e enfermeiros a serem objetores de consciência.

À Renascença, o constitucionalista Paulo Otero revela que, num dos artigos, "o profissional de saúde deve especificar as razões que o levam a recusar participar no ato de morte medicamente assistida", mas que noutro "se diz que não há que fundamentar a objeção de consciência”.

O especialista salienta ainda que obrigar alguém a explicar quais os motivos que o levam a não querer praticar a eutanásia é inconstitucional. "O Estado não pode impor que revele publicamente as razões pelas quais sou objetor de consciência."

Uma perspetiva partilhada por Bacelar Gouveia que defende que este é mais um motivo para a lei ser declarada inconstitucional, no caso da violação do direito a não participar na prática da eutanásia por razões de consciência.

"Se o objetor tem de explicar por que razão faz objeção de consciência, no fundo tem de mostrar a racionalidade do seu pensamento e opinião. Ao fazer isso, está a submeter o exercício do seu direito à autorização da autoridade administrativa, o que deixa de ser um direito", afirma o constitucionalista. E sublinha: "Um direito exerce-se livremente."

Mas será que o Presidente da República também pode ser um objetor de consciência na hora de promulgar a lei da eutanásia? "A meu ver sim", considera Paulo Otero. "Todos os titulares eletivos têm o poder de, por razões de consciência, suscitarem objeção à prática de atos violadores da sua consciência", constata.

O que pensam as ordens profissionais?

As ordens profissionais dividem-se quanto à necessidade de justificar a recusa da prática da eutanásia. José Manuel Jara, do Conselho Nacional de Ética e Deontologia Médicas, da Ordem dos Médicos, considera que a objeção de consciência "não carece em princípio de justificação, porque a prática da eutanásia é contrária ao código deontológico da profissão".

E explica: "A pessoa pode, quando muito, dizer que está de acordo com o Código Deontológico. Na Ordem dos Médicos, para já, a força da posição antagónica à eutanásia decorre dos princípios éticos e deontológicos da medicina em Portugal".

Do lado dos enfermeiros, a perspetiva é diferente. De acordo com Ana Rita Cavaco, bastonária desta ordem profissional, faz sentido justificar a objeção de consciência. "Em situações que já existem e foram legalizadas, como o aborto, é feita uma justificação [da objeção de consciência]", refere, explicando considerar esta situação "normal".

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