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"Vamos fazer uma vaquinha?" Dívida do CDS torna saída de funcionários "inevitável"

22 mar, 2022 - 17:31 • Tomás Anjinho Chagas

Membro da atual direção do CDS relata uma situação financeira “difícil”. Sede da Guarda vai fechar. Em Viseu, a distrital propôs uma “vaquinha” para não fechar portas.

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Antiga sede do CDS em Vila Nova de Gaia, num prédio agora abandonado. Foto: Maria João Cunha/RR (arquivo)
Antiga sede do CDS em Vila Nova de Gaia, num prédio agora abandonado. Foto: Maria João Cunha/RR (arquivo)
Foto: DR
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Em véspera de eleições internas no CDS, a herança política não é a única herança pesada. O partido tem uma dívida financeira à banca e aos fornecedores.

À Renascença, fonte da atual direção do CDS lembra que a dívida não é nova, e que foi herdada da direção de Assunção Cristas. As contas “ainda não estão fechadas”, porque falta perceber quanto se gastou durante a campanha para as legislativas, que culminou na perda de todos os lugares no Parlamento para o CDS.

O partido começou o mandato com “um milhão e duzentos mil euros de passivo”. Desse valor, cerca de 700 mil euros correspondiam a uma dívida à banca, e 400 mil euros eram dívidas contraídas aos fornecedores. A atual direção garante à Renascença que cerca de “88%” das dívidas aos fornecedores já foram sanadas. Quanto à banca, a atual direção diz já ter pago “200 mil euros”.

Apesar de todas estas contas pagas, fonte da atual direção centrista ressalva que “toda a despesa que tivermos contraído durante a campanha ficará como dívida a fornecedores”. Além disso, o partido perdeu os cinco deputados que tinha na Assembleia da República, o que significa que a subvenção que recebe do Estado Português baixa de 53 mil, para 26 mil euros por mês.

Culpa? Morreu solteira

As responsabilidades por esta situação financeira são passadas de mão em mão. Fonte da atual direção do CDS considera que “esta direção recebeu um partido endividado” e acrescenta que “a pandemia não ajudou”. Mas, também à Renascença, fonte da antiga direção, de Assunção Cristas, acredita que “a questão da herança não é uma desculpa”. “Já passaram dois anos”, lembra este ex-membro da direção do CDS.

Esta é uma questão que vai impor-se ao próximo líder do partido, que vai ser escolhido em abril. Até lá, a atual direção já tem “um plano em marcha” para tentar mitigar uma situação “difícil e dramática”. Há também uma preparação “de todas as medidas que a próxima direção terá de tomar, depois de estar legitimada”.

A receita emagreceu, e a estrutura tem de emagrecer também de forma “inevitável”. Fonte da atual direção do CDS admite que cortar no pessoal é um caminho provável.

“Creio que sim. Estamos a negociar rescisões amigáveis. É matemático, que se a subvenção baixa, temos de cortar”, revela à Renascença este membro da direção centrista.

Congresso no sítio “mais barato” tendo em conta a “dignidade” do CDS

Em momento de dificuldades financeiras, o partido vê-se obrigado a enfrentar outra despesa: o Congresso. Nos dias 2 e 3 de abril, os militantes do CDS são chamados a Guimarães para escolher o novo líder.

À Renascença, fonte da direção do CDS revela que, depois da demissão de Francisco Rodrigues dos Santos, o local do Congresso foi escolhido “em função da situação financeira. Escolhemos o local mais barato”.

“Um conjunto de militantes de Guimarães comprometeu-se a fazer donativos ao partido”, acrescenta esta fonte, para justificar a escolha da Cidade Berço. Serão mesmo os militantes a ajudar a diminuir os custos do evento, que acontecerá nos dias 2 e 3 de abril.

Se poderia ser mais em conta? “Mantendo a dignidade e a imagem do partido era impossível”, garante à Renascença fonte da atual direção. Quanto ao preço, em concreto, esta fonte não dá um valor exato. Mas revela que normalmente “estes eventos costumam custar centenas de milhares de euros”, e conclui: “nós não temos centenas de milhares de euros”.

Sede nacional não sai do Caldas

Cortar custos é obrigatório, mas não há qualquer plano para abandonar a sede do partido no Caldas, em Lisboa. “Foi dita muita coisa na comunicação social que não era verdade”, diz à Renascença um membro da atual direção do CDS.

Esta fonte explica que a renda mensal está entre os 900 e os 1.000 euros. Quando a direção tomou posse, em 2019, “houve uma reunião com o Patriarcado de Lisboa (que detém o espaço), para nos conhecermos”, mas garante que “Em momento algum, esta direção negociou a saída do Caldas”.

Se essa é uma medida que pode estar no horizonte? “Essa é uma decisão que a próxima direção terá de tomar. O partido tem de conseguir a sua saúde financeira”, explica à Renascença fonte da direção do CDS.

Austeridade interna. Torneira fecha para as distritais

Mas há outras despesas que estão a ser alvo de cortes. Esta fonte lembra “CDS é dos únicos partidos que não cobra quotas aos militantes”, e onde esse pagamento não é obrigatório para que os militantes possam votar.

Há várias sedes de distritais e concelhias que são património do partido. Quanto às que estão sediadas em espaços alugados, vão ter de ser autossustentáveis. Este membro da direção centrista revela que as despesas “têm de ser sustentadas pela estrutura local”. E revela que “caso não consigam” essa sede “fecha”.

Num comunicado enviado pela direção nacional às distritais, a que a Renascença teve acesso, essa mudança fica clara. “Importa, desde já, esclarecer que essa possibilidade [de manter as sedes físicas a funcionar] obriga ao pagamento de todas e quaisquer despesas dos locais supramencionados a ser realizado através de donativo ao Partido”, pode ler-se. As sedes distritais tinham de ter “avisado” a direção nacional até ao passado dia 15 de fevereiro.

“A maior parte das sedes distritais estarão com dificuldade”, explica à Renascença um antigo dirigente distrital. Quanto às contas, este dirigente revela que a dívida das Eleições Autárquicas de 2021 ainda está por pagar, “à qual se junta a dívida das Legislativas”.

"Vamos fazer uma vaquinha?"

A realidade já está a bater à porta das estruturas distritais do CDS. Em Viseu, por exemplo, o até aqui secretário-geral da Distrital assume que as dificuldades são evidentes. “São, são!”, admite Miguel Baumgartner à Renascença.

“As distritais não têm dinheiro”, reforça o dirigente, lembrando que até aqui, as contas eram sempre pagas pela estrutura nacional do CDS.

Para pagar uma renda, é preciso angariar dinheiro de alguma forma. Miguel Baumgartner explica à Renascença que sugeriu que os militantes contribuíssem. “Disse-lhes: vamos fazer uma espécie de vaquinha?”. Mas revela que, na altura, a ideia não reuniu muito apoio.

O mandato desta direção distrital terminou, e as eleições distritais só vão acontecer depois do Congresso que vai decidir o novo líder do CDS. Miguel Baumgartner explica que depois de os militantes terem mostrado alguma resistência em contribuir, comunicou à direção nacional do CDS que a distrital de Viseu iria deixar de ter um espaço físico.

“Entreguem a sede”, relata. Mas as eleições internas do CDS atrasaram os efeitos práticos da decisão. “Está tudo em standby”, afirma Miguel Baumgartner.

Por enquanto, nada mudou. “Continuamos a usar a sede”, explica o antigo dirigente da distrital de Viseu. Miguel Baumgartner ressalva que o CDS tem uma boa relação com a Misericórdia, que é arrendatária do espaço, e que isso ameniza a gravidade da situação.

Em relação ao futuro, o ex-dirigente distrital acredita que é possível manter a sede física, depois da realização do Congresso, dias 2 e 3 de abril. “Acredito que sim. Há um conjunto de pessoas que parece ter vontade”, atira Miguel Baumgartner.

Sede da Guarda vai fechar. Culpa atribuída a Chicão

“Foi-me comunicada a decisão de não manutenção da sede física”, revela à Renascença Henrique Monteiro, presidente da concelhia da Guarda. As contas não deram tréguas, e a nova diretiva que obriga os órgãos locais a pagar as suas próprias despesas, vai despejar a distrital e a concelhia.

O edifício da sede concelhia é partilhado com a distrital. O espaço na Rua António Sérgio deve ser esvaziado “no final do mês”. Henrique Monteiro explica à Renascença que “ninguém se disponibilizou” para contribuir para o pagamento da renda, e por isso só resta “esperar pelo futuro”.

O presidente da concelhia da Guarda tem algumas reservas quanto a esta política para melhorar a saúde financeira do CDS. “Não sei se é o caminho mais correto. A implementação de quotas obrigatórias poderia resolver um pouco este problema. Em vez de estarem os militantes a fazer donativos”, diz Henrique Monteiro.

À pergunta: "Atribui as culpas a Francisco Rodrigues dos Santos?", Henrique Monteiro é curto e responde: “Claramente. Atribuir a Assunção Cristas é falacioso”. O presidente da concelhia da Guarda sublinha que as contas se desequilibraram com José Ribeiro e Castro.

Henrique Monteiro critica a estratégia seguida pela direção de Francisco Rodrigues dos Santos e não poupa no cenário que pinta para o partido. “O CDS tinha crédito político e financeiro com Assunção Cristas. Termina o mandato de Francisco Rodrigues dos Santos sem crédito político, nem crédito financeiro”.

O líder da concelhia da Guarda acrescenta que, neste momento, o problema da sobrevivência é transversal a todas as sedes que não pertençam ao CDS. “Com a corda ao pescoço estão todas as sedes que não são propriedade do partido”.

CDS Algarve tem situação mais folgada

Mais sorte tem a distrital de Faro do CDS. A sede não é alugada, é propriedade do partido. Assim sendo, a distrital só tem de ser autossuficiente com as despesas mais práticas. Por isso não vão sair. “De maneira nenhuma!”, explica Adriano Guerra, presidente da sede distrital do CDS à Renascença.

O líder distrital revela que ainda não tem a informação oficial sobre a nova regra, que obriga à “autossuficiência” das estruturas distritais do CDS.

No entanto, assegura que, se esse for o caso, não haverá problema. “Se distrital tiver de assumir o pagamento da água e da luz, assim o fará”, garante Adriano Guerra.

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