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OE2022

No Parlamento, a dissidência paga-se. "Partidos controlam praticamente na totalidade os mecanismos que permitem o acesso ao púlpito"

27 out, 2021 - 15:03 • Fábio Monteiro

Em declarações à Renascença, Jorge M. Fernandes, investigador no Instituto de Ciências Sociais e coautor do livro “The Politics of Legislative Debates”(Oxford Press), explica que “em votações de Orçamento de Estado, existe por parte dos partidos políticos uma maior imposição de disciplina”.

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Falta pouco para a votação do Orçamento de Estado para 2022. A não ser que haja uma grande reviravolta, tudo indica que a proposta apresentada pelo Governo de António Costa será chumbada. É pouco provável que deputados do PSD (ou de outro partido) surjam como dissidentes de última hora, fugam à disciplina de voto. Afinal, isso teria consequências.

Em declarações à Renascença, Jorge M. Fernandes, investigador no Instituto de Ciências Sociais e coautor do livro recentemente publicado “The Politics of Legislative Debates”(Oxford Press), explica que “em votações de Orçamento de Estado, existe por parte dos partidos políticos uma maior imposição de disciplina”.

O mesmo não se passa, todavia, no dia-a-dia do Parlamento. “Se olharmos para coisas menores, as imensas leis que vão à AR, muitas vezes nessas votações de menor importância os partidos deixam os deputados serem um bocadinho mais livres e expressarem a sua dissensão relativamente à linha do partido”, diz.

Fazendo uma leitura da conjuntura do momento presente, a possibilidade de os deputados PSD Madeira votarem de forma a aprovar o OE – cenário que foi colocado em cima da mesa ontem -, apenas apareceu porque “de acordo com os estatutos do PSD, os deputados do PSD Madeira são escolhidos exclusivamente pelas estruturas regionais”. Por outras palavras, o futuro destes não está nas mãos de Rui Rio.

Em The Politics of Legislative Debates” são analisadas as práticas parlamentares de 33 democracias liberais. De entre todos os países, os debates no Parlamento português distinguem-se pelo “controlo praticamente absoluto que os partidos têm sobre os seus deputados, ao contrário de muitas democracias europeias, como a irlandesa ou francesa”, nota o investigador.

Nesses países, “os partidos deixam aos deputados bastante discricionariedade do que diz respeito à utilização do tempo parlamentar para falarem sobre assuntos que lhes possam interessar. No Parlamento português, os partidos controlam praticamente na totalidade os mecanismos que permitem o acesso ao púlpito, à palavra”.

“Se porventura algum deputado fizesse um discurso que fosse contra a linha oficial do partido, isso prejudicaria a marca do partido, teria dano em todos os deputados do partido”, explica.

O sistema eleitoral português, que funciona por círculos regionais, dá centralidade aos partidos, não aos deputados. “Não existe motivo para aos eleitores fazerem voto estratégico em função da qualidade dos deputados individuais.”

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