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João Soares e a cerimónia do 25 de abril. Ferro conduziu processo de forma “desastrada e desajeitada”

21 abr, 2020 - 20:58 • André Rodrigues

Histórico socialista deixa críticas à forma como o presidente da Assembleia da República liderou o processo que levou à cerimónia do 25 de abril, mesmo em período de pandemia e estado de emergência.

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O primeiro-ministro apontou o nervosismo e a fadiga como causas da polémica em torno das celebrações do 25 de abril no Parlamento. Há dias, partilhou no Facebook um texto manifestando a sua oposição aos moldes tradicionais da celebração do 25 de abril, dizendo que não fazia sentido que a mesma se realizasse este ano, atendendo ao quadro excecional da pandemia. Sentiu-se visado por este recado de António Costa?

Não, de forma nenhuma. Não estou nada de acordo com a interpretação que está a fazer. Eu tenho, aliás, o sentimento de que as coisas estão a encaminhar-se para se poder fazer uma transformação revolucionária, como é desejável, daquilo que é a tradicional celebração do 25 de abril no quadro da Assembleia da República.

Uma celebração, devo dizer, que se estava a tornar cada vez mais enfadonha, como é sabido. Digo isto com a autoridade de quem, pelo menos duas vezes, falou em nome da bancada do Partido Socialista nas sessões solenes do 25 de abril na Assembleia da República.

Acho que a forma como o presidente da Assembleia da República, de quem sou amigo e que conheci ainda antes do 25 de abril, no movimento estudantil contra a ditadura, tenha conduzido este processo de forma tão desastrada e desajeitada, tentando impor um modelo tradicional de celebração da revolução.

Dito isto, não admito é que me suspeitem de não pretender que o 25 de abril seja celebrado.

O que, para mim, não faz sentido é impor às pessoas medidas que, de uma maneira geral, estão a ser respeitadas com enorme civismo e sentido de responsabilidade e, depois, não as aplicarmos nós próprios.

Mas o que defende, exatamente, quando sugere uma transformação revolucionária das celebrações do 25 de abril?

Eu socorri-me de um texto de um amigo e camarada de partido, o Luís Fagundes Duarte, e invoquei o exemplo do Papa Francisco nas celebrações pascais, sozinho, na Praça de São Pedro.

É, para mim, um exemplo absolutamente fantástico de capacidade de comunicar.

Bem sei que nem Ferro Rodrigues - sendo, além do mais, um não crente - nem mesmo o Presidente da República - um crente declarado - terão a capacidade de comunicar do Papa Francisco.

Ou seja, acho que deveríamos fazer bom uso dos instrumentos de que dispomos, sobretudo das novas ferramentas de comunicação, para que estejamos à altura das nossas responsabilidades contemporâneas, porque não devemos deixar de celebrar o 25 de abril, mas sempre respeitando a esmagadora maioria dos portugueses que, por força do estado de emergência, estão obrigados ao confinamento.

Por isso, penso que é, também, por aí que deverá passar a tal transformação revolucionária para o 25 de abril, dentro e fora da Assembleia da República.

Até porque a esmagadora maioria das gerações mais jovens não tem quaisquer referências da revolução, a não ser aquelas que lhes foram transmitidas pelos pais ou pelos avós.

No calor da polémica, assistimos a trocas de argumentos em que uns diziam que não faz sentido festejar o 25 de abril nos moldes tradicionais, depois de se ter proibido a celebração a Páscoa. Do outro lado, houve quem acusasse os saudosistas do Estado Novo de quererem impedir a celebração da data. Como interpreta este extremar de posições?

Não devemos inventar falsos fantasmas que são agitados de uma forma disparatada, a meu ver.

Rejeita, portanto, que se tenha tratado de uma luta ideológica entre esquerda e direita.

Absolutamente, até porque não há extrema-direita em Portugal. E transformar o senhor do Chega num expoente da extrema-direita e dizer que aquilo é protofascismo é um disparate sem nome. Para além do mais, isso é promover, do ponto de vista mediático, uma pessoa que não é de extrema-direita como é óbvio.

Tal como dizem que o CDS é um partido de extrema-direita. É um perfeito disparate. O CDS é um partido da direita democrática que, aliás, tem sido mais de centro-direita do que algumas fações do PSD que se têm manifestado noutros momentos da nossa história democrática.

Não é o caso, agora, com Rui Rio, tenho de lhe fazer essa justiça e tenho de lhe dirigir uma palavra de gratidão pela forma responsável como tem assumido a liderança do principal partido da oposição.

Concorda com quem defende que Ferro Rodrigues tem sido, ainda que de forma involuntária, um promotor dessa visibilidade?

Não é só o Ferro Rodrigues. Há muita gente que tem embarcado nessa cantilena que é completamente disparatada.

Não há nenhuma ameaça fascista em Portugal. A revolução do 25 de abril de 1974 acabou com isso tudo. Não há salazarismo em Portugal, isso não tem nem teve qualquer expressão, nem nos tempos áureos do PREC.


A cerimónia que assinala o 25 de Abril no Parlamento vai mesmo realizar-se no sábado, mas com menos de 100 pessoas na Assembleia da República.

Comentários
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  • 24 abr, 2020 Toronto 19:28
    Parabens pelos seus comentarios, todos os Portugueses deviam ler bem haja e cuide se
  • jorge
    23 abr, 2020 Porto 00:34
    pela primeira vez em quarenta anos, consegui ler do principio ao fim um artigo, entrevista de João Soares. Revela uma lucidez, sentido de cidadania que não imaginava, ao contrário dos hipócritas de cravo vermelho ao peito. Como dizia a canção ... cravo vermelho ao peito, a muitos fica bem e sobretudo faz jeito a muitos filhos da mãe.
  • João Lopes
    22 abr, 2020 Viseu 14:48
    Os adoradores mais ou menos marxistas da nova religião 25/4 têm o direito ao seu culto público… As outra religiões, não!
  • Maria Oliveira
    21 abr, 2020 23:06
    A sensatez que falta ao presidente da AR.

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