28 nov, 2024 - 22:38 • Fábio Monteiro
O Governo – pela voz de Luís Montenegro – anunciou, na quarta-feira à noite, uma verba de 20 milhões de euros para a aquisição de viaturas da PSP e da GNR – despesa que “já estava prevista” na lei de programação de infraestruturas e equipamentos, aprovada pelo executivo de Costa, em Conselho de Ministros, a 12 de agosto de 2022.
Questionado pelos jornalistas esta quinta-feira, o ministro da Presidência, Leitão Amaro, sublinhou que o montante nada tem a ver com o concurso aberto (e adjudicado ainda a 21 de fevereiro) pelo executivo de António Costa. Não especificou, todavia, a origem da verba: se vinha lei da programação (aprovada pelo PS) ou se, porventura, se tratava de um acrescento ao montante já acautelado.
A lei da programação, com um valor de 607 milhões, "tinha para viaturas mais de 60 milhões", lembrou ontem o antigo ministro da Administração Interna José Luís Carneiro, em declarações à “RTP”. “Tinha ficado um concurso aberto de cerca de 30 milhões para viaturas e estava em preparação um segundo para um valor equivalente.”
Já esta noite, na "CNN", Carneiro frisou que o Governo ainda não explicou se os 20 milhões são ou não um acrescento à lei da programação. A Renascença colocou a mesma dúvida ao MAI, mas, até ao momento, ainda não obteve resposta.
Esta não é a primeira vez que um anúncio do atual Governo é precedido de um “afinal” e dúvidas. Desde que tomou posse há cerca de nove meses, foram já algumas as circunstâncias em que o Governo foi obrigado a prestar esclarecimentos sobre medidas anunciadas, “asteriscos” que não foram totalmente explicitados, e créditos que não foram atribuídos.
Sem margem para dúvidas, o caso que deu mais polémica foi o IRS. Em abril, o Governo anunciou uma descida do IRS de 1.500 milhões de euros em 2024. No entanto, após escrutínio, veio-se a perceber que a redução aplicada pelo executivo era de apenas 200 milhões de euros, os restantes 1300 milhões vinham do Orçamento do Estado (OE) aprovado ainda pelos socialistas.
Uma situação semelhante, é de recordar, já ocorrera ainda antes Luís Montenegro ser primeiro-ministro. Em dezembro de 2023, ou seja, em campanha eleitoral, o líder do PSD anunciou o objetivo de fazer chegar as pensões dos portugueses aos 820 euros até 2028 – um aumento, na prática, para cerca de dois milhões de cidadãos. Mais tarde, contudo, quando questionado pelos jornalistas, esclareceu que a medida aplicava-se apenas a quem recebia o Complemento Solidário para Idosos (CSI).
No Orçamento do Estado para 2025, houve também dois “afinais”: a) a intenção de rever as rendas antigas e a b) “inconsistência” nas verbas para o desporto.
No documento, apresentado em outubro, era expressa a intenção de tomar “as medidas necessárias para a conclusão dos processos de transição dos contratos de arrendamento habitacional anteriores a 1990, de modo a repor a justiça”. Mas, no dia seguinte, o Governo veio afirmar que não pretendia alterar o regime em vigor.
No caso do desporto, a história é diferente. O OE que veio a público acautelava 42,5 milhões de euros para o setor, um corte de 15,5% face ao montante de 2024. Posteriormente, em comunicado, o executivo afirmou ter havido “uma inconsistência” e o valor real era 54,5 milhões. (O documento aprovado na generalidade no Parlamento continha o erro ainda.)
Um partido retirar louros por medidas (ou ideias) de outro não é algo inédito. Ainda no congresso do PSD, Montenegro anunciou um novo programa de dispensa de medicamentos hospitalares – medida aprovada ainda pelo Governo de António Costa em março.
Em maio, a ministra Margarida Balseiro Lopes exonerou o Conselho Diretivo da Agência para a Modernização Administrativa (AMA), e, dois meses depois, apresentou um pacote de medidas, que, “na grande maioria e tirando algumas nuances” já estavam a ser aplicadas, denunciou o presidente afastado ao “Expresso”.
A opção de eliminar os rendimentos dos filhos como fator de exclusão no acesso ao Complemento Solidário para Idosos fazia parte do programa eleitoral do PS, não da AD. O passe ferroviário verde, anunciado na festa do Pontal por Montenegro, partiu de uma ideia do Livre.