08 nov, 2024 - 06:30 • Isabel Pacheco
As crianças vítimas de "bullying" têm mais 70% de probabilidade de virem a sentir dor grave na transição para a vida adulta. A conclusão é do estudo SEPIA - “Studying Experiences of Pain In Adolescents” - do Instituto de Saúde Púbica da Universidade do Porto (ISPUP) que, durante três anos, analisou a forma como os adolescentes vivem e relatam a dor física.
“Os jovens que dizem que estiveram envolvidos em 'bullying' têm maiores queixas de dor três anos mais tarde”, aponta a investigadora Raquel Lucas, do ISPUP, em declarações à Renascença, explicando que são crianças que, perante testes sensoriais quantitativos, revelam “menor tolerância à dor e maior sensibilidade”.
Também as experiências adversas na infância determinam a qualidade de vida mais tarde. Aqui, explica a investigadora, falamos de experiências que influenciam a perceção da dor, como é o caso de “situações em que há perda de um dos pais, famílias em que existe violência emocional ou física, ou quando um familiar tem problemas de saúde mental".
“Quanto maior for o número de adversidades desse tipo, mais frequente é a experiência de dor dessas crianças”, resume. “Por outro lado, quando a família funciona melhor do ponto de vista da expressão e de coesão, menos dor tem as crianças”, conclui a investigadora.
“As crianças reportam o ambiente familiar próximo. É muito importante”, ressalva.
Segundo o estudo, uma em cada seis crianças aos sete e aos 10 anos dizem ter dor por um período superior a três meses. Uma situação que afeta, em média, até 20% dos mais pequenos.
“Entre 10% e 20% dos jovens entre os sete anos e a adolescência têm dor de elevada frequência, o que leva a limitações nas suas atividades da vida diária e dor com elevada duração”, revela Raquel Lucas.
Trata-se de um “número muito grande de crianças com experiências de dor que são adversas”, cujos perfis de dor “mantêm-se de uma forma relativamente constante ao longo da infância da adolescência”, acrescenta.
Em causa, explica Raquel Lucas, está na maioria dos casos a dor crónica “sem explicação nem solução médica”.
“Tem muito que ver com a suscetibilidade individual à dor. Não estou a falar daquela dor aguda que é muito adaptativa. O problema é a dor crónica”, alerta a responsável que conclui que , nem sempre, os pais dão a devido valor à situação.
“Os pais geralmente subestimam ligeiramente a dor em relação aos filhos”, indica a docente. ”Só em alguns casos o relato é concordante entre pais e filhos. Portanto, os pais reportam menos dor em relação às crianças do que os filhos”.
Para a responsável pelo estudo SEPIA, os dados permitem aos profissionais de saúde antecipar qual deverá ser o acompanhamento das crianças no futuro quando se tornam adultos.
“Se há uma grande quantidade de jovens com queixas relevantes, saberemos quem são os jovens que mais tarde, mais provavelmente vão procurar os cuidados de saúde e que, portanto, podem ser vigiados desde cedo de uma maneira mais próxima” conclui.
Financiada pela Fundação europeia FOREUM – Foundation for Research in Rheumatology, a investigação que contou com a parceria da Sociedade Portuguesa de Reumatologia e com o Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência é apresenta esta sexta feira no Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto.