01 nov, 2024 - 16:50 • Cristina Nascimento
A UNICEF quer que o casamento de menores entre os 16 e os 18 anos com autorização dos pais deixe de ser considerado legal em Portugal.
O repto é lançado poucos dias depois da divulgação do “Livro Branco: Recomendações para Prevenir e Combater o Casamento Infantil, Precoce e/ou Forçado”.
O documento, elaborado por iniciativa de um grupo de trabalho sobre o assunto, concluiu que, em média, há mais de 120 casamentos infantis por ano em Portugal.
Francisca Magano, diretora de Políticas da Infância e Juventude da UNICEF, considera que um dos passos que tem de ser dado é considerar ilegal toda e qualquer união que envolve menores.
“É preciso acabar com exceções ao casamento infantil na lei portuguesa. Não é uma proteção legal que seja permitido que, com o consentimento dos pais, uma criança case”, explica Francisca Magano, considerando que este “deve ser o compromisso número 1 do Estado português: acabar com a exceção”.
A diretora da UNICEF revela que o estudo elaborado agora revelou que, entre 2015 e 2023, foram detetados pelo menos 836 casamentos infantis, precoces e forçados, sendo que a maioria envolve “crianças entre os 15 e os 18 anos”.
“Estamos a falar aqui de jovens, mas que a UNICEF se refere a crianças, porque até na lei portuguesa, a criança é todo o ser humano até aos 18 anos, portanto, estamos efetivamente a falar de casamentos infantis que afetam crianças”, explica.
Magano adianta que “cerca de 60% das pessoas afetadas nestas situações são raparigas”.
O estudo é “pioneiro” e vem dar razão ao que “as organizações da sociedade civil e e outras entidades públicas têm vindo a alertar para o facto de existirem casamentos infantis e forçados em Portugal”. No entanto, explica Francisca Magano, sem terem “dados concretos”.
Agora, “com este inquérito, apesar de ser uma amostra não significativa, conseguimos, conseguimos mostrar que há efetivamente casamentos infantis, precoces e forçados”.
Segundo o INE, entre 2015 foram celebradas 858 uniões com menores entre os 16 e os 18 anos. O estudo agora levado a cabo identifica 472 uniões infantis, precoces e forçadas abaixo desta faixa etária. Por isso, a UNICEF acredita que o fenómeno está sub-reportado.
Nesta entrevista à Renascença, Francisca Magano identifica como um dos problemas a falta de obrigatoriedade de reporte.
“Não há registos. O casamento infantil muitas vezes não é a principal razão das situações serem identificadas. As situações chegam às entidades por violência doméstica ou tráfico de seres humanos e depois é que se apercebe que afinal, por trás dessas situações, está também um casamento infantil, mas o que fica registado é a violência ou, por exemplo, o abandono escolar”, descreve.
Francisca Magano identifica ainda outras necessidades de mudança, por exemplo, maior aposta na prevenção e proteção das vítimas.