26 set, 2024 - 15:17 • Ana Kotowicz , Filipa Ribeiro
O número de guardas prisionais era suficiente, o seu brio não está em causa, mas é preciso apurar o que correu mal no dia em que cinco homens fugiram do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus. Já as torres de vigilância estavam enferrujadas, e havia cabos na prisão destruídos por ratos. "É preciso verificar se alguém que devia ter feito alguma coisa não o fez ou a fez tardiamente", afirmou Rui Abrunhosa, que está a ser ouvido no Parlamento.
"Não posso dizer que esta fuga tenha a ver com a falta de pessoal", disse o antigo diretor da Direção-Geral da Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), afirmação que já tinha feito antes. "O número de guardas que existiam era o número que estava mais do que estipulado para as funções. Há muito que já estava assim desde a reorganização dos turnos feita em 2017", acrescentou, frisando que "nunca houve outra fuga em mais de 24 anos".
Naquele dia, estavam 33 guardas ao serviço em Vale de Judeus.
"Esta fuga é muitíssimo grave e só me posso penitenciar por isso, só não posso dizer que a fuga tenha a ver com a falta de pessoal. O pessoal era o relevante para aquele dia."
Rui Abrunhosa afasta também a possibilidade de a fuga de 7 de setembro ter a ver com falta de profissionalismo dos guardas. “Não ponho em causa o trabalho e o brio dos senhores guardas prisionais, mas é preciso apurar responsabilidades.”
No entanto, assume que os fugitivos estariam a analisar as rotinas dos guardas prisionais. "Esta fuga tema ver também com aquilo que os delinquentes fazem: verificar as rotinas que existem. É muito provável que tenha havido alguma falha nessas rotinas e isso foi aproveitado."
No imediato, essa falha deve ser resolvida, defendeu Abrunhosa. Aliás, frisou ter apontado a escassez de guardas prisionais (e a necessidade de recrutamento) à tutela, relembrando que o parque prisional português está "extremamente envelhecido".
Em contrapartida, aquando da fuga, não falou diretamente com a ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, para lhe comunicar o sucedido. "Nunca tive uma comunicação direta com a senhora ministra. Comuniquei com a chefe de gabinete e com uma funcionária do Ministério da Justiça. Não tinha o telefone da senhora ministra."
Esta quinta-feira, a Comissão Parlamentar dos Assuntos Constitucionais ouviu Rui Abrunhosa e Pedro Veiga Santos, antigo subdiretor dos Serviços Prisionais. Na véspera, as audições foram a dois dos sindicatos que representam os guardas prisionais — e que desmentiram Abrunhosa quando este disse que no dia da fuga a rede eletrificada não estava a funcionar por falta de condições.
Sobre este tema, Abrunhosa diz ter sido “mal interpretado”: “Este estabelecimento prisional nem sequer tinha previstas torres e a cerca a que me referi tem lá painéis sensoriais de infravermelhos que nunca foram usados, porque efetivamente deitavam a energia abaixo”, detalhou. Além disso, acrescenta, a a zona "tem algumas características do ponto dos animais roedores que por ali andam e que, ainda por cima, roíam os cabos".
Mas as torres eram dispensáveis? “Se ganhávamos em ter as torres juntamente com as câmaras de vigilância? Com certeza que sim, mas essa decisão não foi tomada por mim.”
Durante a sua audição, Pedro Veigas Santos também falou das torres de vigilância e explicou que a sua demolição ficou a dever-se à falta de orçamento: "Aquilo que se previa de custo era na ordem dos 250 a 280 mil euros por cada torre, o que significa que o orçamento para as quatro torres seria sempre superior a um milhão de euros."
As torres estavam, explicou Pedro Veigas Santos, degradadas. “Houve aliás uma queixa legitima dos senhores guardas por causa daquelas condições”, acrescentou. Sobre a sua utilidade, não tem dúvidas: “Consegue-se viver sem torres? Sim. Preferia que elas estivessem lá? Sim”.
De resto, o antigo subdiretor assumiu a sua quota parte de culpa em tudo o que aconteceu a 7 de setembro. "Houve falhas, tenho de assumir. E essas falhas são minhas."
Os fugitivos de Vale de Judeus são dois cidadãos portugueses, Fernando Ribeiro Ferreira e Fábio Fernandes Santos Loureiro, um cidadão da Geórgia, Shergili Farjiani, um da Argentina, Rodolf José Lohrmann, e um do Reino Unido, Mark Cameron Roscaleer.
(em atualização)