10 jun, 2024 - 01:58 • Fábio Monteiro
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Desde 10 de março, a opinião dos portugueses – se as eleições europeias podem ser vistas como um barómetro nacional – não mudou muito. Pelo menos, para os dois partidos mais votados: PS e AD (coligação que une PSD, CDS-PP e PPM) obtiveram 32,1 e 31,12% dos votos, respetivamente.
Em relação às legislativas, houve uma inversão, sim. Se há três meses, a AD ganhou por “poucochinho”, desta feita foi o PS. O primeiro elegeu oito eurodeputados, o segundo sete eurodeputados. Mas, conforme ironizou o cabeça de lista da AD, Sebastião Bugalho, no seu discurso ao final da noite: “Alguém poderia mesmo dizer que foi por poucochinho.” Trinta e oito mil votos, mais precisamente.
Desde as 20h00, quando foram conhecidas as projeções das televisões, foi evidente que a noite não seria de (grande) festa para Marta Temido ou Sebastião Bugalho. Salvo a Iniciativa Liberal, energizada perante a possibilidade de eleger três eurodeputados e ficar em terceiro lugar, nenhum partido festejou.
Houve hesitações e recuos nas declarações. As projeções não eram simpáticas para a CDU, Bloco de Esquerda e Livre. Davam a possibilidade de eleger um eurodeputado – ou nenhum. Enquanto isso, o PAN soube imediatamente que ia ficar a zeros.
Ao mesmo tempo, uma certeza emergiu: o Chega seria (e foi) o grande derrotado da noite. (Com 9,79% (386.361 votos), elegeu dois eurodeputados.) O partido de André Ventura ficaria muito aquém do resultado conseguido nas legislativas (18,07%, 1.169.836 votos).
“Não era o resultado que pretendíamos”, disse Ventura, à chegada da sede de campanha. “A responsabilidade é minha.”
O PAN foi o primeiro a atirar a toalha ao chão. Perante as projeções das televisões, o dirigente Ernesto Sampaio deu logo como certa a derrota de Pedro Fidalgo Marques. “Não estamos satisfeitos com a não eleição do Pedro Fidalgo Marques ao Parlamento Europeu”, disse. (O partido de Inês Sousa Real não conseguiu repetir o feito de 2019.)
O Livre - um dos grandes vencedores das legislativas - ainda teve esperanças. Rui Tavares disse que as probabilidades estavam do lado de Francisco Paupério. "Será o primeiro eurodeputado do Livre. As probabilidades são boas, mas vamos guardar os comentários para o fim", afirmou.
O Bloco de Esquerda, por Fabian Figueiredo, evitou comprometer-se. Mas disse: “No final desta noite iremos celebrar.”
A CDU foi igualmente cautelosa. João Oliveira evitou a todo o custo “pôr-se fora de pé”, antecipar se ia ou não para Bruxelas.
Foi preciso esperar quase até ao último voto estar contado, para algumas das dúvidas eleitorais da noite serem clarificadas.
Às 22h00, quando a contagem se tornou pública, o impasse das projeções confirmou-se: PS e AD taco a taco, Chega e IL na disputa pelo terceiro lugar. Livre, BE e CDU em risco de não elegerem.
Catarina Martins, cabeça de lista pelo Bloco de Esquerda, foi a primeira a reagir aos resultados. E confirmou a sua própria eleição. Sem fugir a ilações nacionais, Mariana Mortágua fez questão de sublinhar a “derrota da extrema-direita [do Chega] face às legislativas”.
Com João Oliveira, da CDU, aconteceu o mesmo. "A voz do povo continuará a fazer-se ouvir com a voz distintiva da CDU", disse.
A noite do Livre foi mais “triste”. Apesar de ter quase 4% dos votos, não conseguiu eleger Francisco Paupério.
“É uma noite triste para o Livre. Valorizamos o que conseguimos, mas há também frustração por não conseguir a eleição e uma derrota em que o Livre, com um resultado muito perto dos 4%, não consegue eleger”, lamentou Rui Tavares.
E lembrou: “É o tipo de resultado que, em qualquer cenário normal, nos permitiria estar aqui a fazer a festa. Infelizmente não estamos. É uma noite em que o Livre perde as eleições e eu quero assumir essa derrota.”
Por algumas horas, Cotrim Figueiredo ainda sonhou ir para Bruxelas – em grupo. Mas a Iniciativa Liberal – o único partido que ganhou votos em relação às legislativas – apenas conseguiu eleger dois eurodeputados. Conquistou 386 mil votos e 9,07%, mais do que nas legislativas, onde teve 319 mil votos e 4,94%. Ficou em 4.º lugar.
O cabeça de lista da IL disse que o resultado demonstrou que o partido é "a única força política capaz de combater os oportunistas que apelam ao medo". Ou seja, o Chega.
O Chega perdeu mais de 780 mil votos em relação às legislativas, elegeu apenas dois eurodeputados.
No discurso de final de noite, André Ventura disse ser “o único responsável” pelo resultado do partido. Ainda assim, lembrou a eleição de dois eurodeputados. "Nem liberais, nem extrema-esquerda. Continuamos a ser nós a terceira força política portuguesa. O Chega não venceu, mas ninguém nos ultrapassou", disse.
Nem Pedro Nuno Santos nem Luís Montenegro se coibiram de tirar ilações nacionais do resultado das europeias. E ambos, à sua maneira, clamaram vitória.
O líder do PS frisou: “O Governo nacionalizou esta eleição (...). Não tenho memória de ver um governo tão envolvido numa campanha europeia como esta”, acusou mesmo.
Por sua vez, Luís Montenegro sublinhou: “O Governo não esteve em campanha eleitoral, o Governo esteve a cumprir os seus compromissos.” "Todos os que acenam com esse argumento, eram os que 30 dias depois de termos tomado posse, que éramos um Governo de inação e que não conseguíamos cumprir as nossas promessas”, disse.
A noite das europeias não provocou uma crise. Os portugueses foram a votos. E quase tudo ficou igual. Com uma pequena diferença.
Como a politóloga Marina Costa Lobo escreveu no X (antigo Twitter): “Antes de hoje nem o PS nem o PSD queriam eleições legislativas. Agora nem o Chega quererá. Estas europeias ajudam à estabilidade parlamentar a nível nacional.”