10 jun, 2024 - 07:54 • João Pedro Quesado
O Parlamento Europeu já tem mais de 200 eurodeputados eurocéticos. O aumento é todo mérito da extrema-direita, que não atingiu os níveis previstos em algumas projeções, mas voltou a ser a fação política com maior crescimento nas eleições europeias de 2024.
Ao todo, pelo menos 202 políticos eurocéticos vão ter lugar em Estrasburgo e Bruxelas, o que totaliza 28% dos eurodeputados. Já a extrema-direita conta agora com 171 eurodeputados, mais 37 do que o Parlamento Europeu que cessou funções.
A esquerda não contribuiu para este crescimento: no final das contas, terá perdido um eurodeputado eurocético.
A extrema-direita continua dividida por vários grupos, como os Conservadores e Reformistas Europeus (ECR), o Identidade e Democracia (ID), os não inscritos, alguns partidos cuja filiação ainda não é conhecida, e dois partidos no Partido Popular Europeu (PPE) - o Partido Democrático Esloveno e o Nova Eslovénia.
Algo semelhante acontece com os eurocéticos de esquerda e extrema-esquerda – maioritariamente presentes no grupo da Esquerda, e com uma presença residual no grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia e no grupo dos não inscritos. Nem Bloco de Esquerda nem PCP são atualmente considerados eurocéticos pelos cientistas políticos responsáveis pela "PopuList", a base da Renascença para estas contas.
Segundo a classificação da "PopuList", os partidos são eurocéticos quando expressam ideias de oposição, incondicional ou limitada de alguma forma, ao processo de integração europeia. Entre estes partidos há euroceticismo duro, que rejeita totalmente o projeto europeu, e euroceticismo suave, que se opõe a algumas partes da integração na União Europeia.
Já os partidos de extrema-direita são classificados dessa forma por terem posições nativistas, defendendo que os países devem ser habitados por elementos do grupo nativo e que pessoas não nativas são uma ameaça para o Estado nação, assim como posições autoritárias.
Uma das histórias da noite eleitoral na Europa é a vitória do União Nacional, a antiga Frente Nacional, na França. O partido de Marine Le Pen elegeu 30 eurodeputados, mais 12 do que conseguiu nas eleições de 2019, graças a receber 31,5% dos votos dos franceses.
A diferença para a coligação “Besoin d’Europe”, liderada pelo partido de Emmanuel Macron, foi de tal forma abissal – mais de quatro milhões de votos – que o Presidente francês dissolveu imediatamente a Assembleia Nacional, convocando eleições legislativas para o fim do mês de junho.
Na França, somam-se ainda cinco eurodeputados de extrema-direita do Reconquista, de Éric Zemmour.
França volta às urnas a 30 de junho, desta feita p(...)
Também na Itália a vitória foi da extrema-direita, mais precisamente do partido Irmãos de Itália, de Giorgia Meloni. O culto de personalidade da primeira-ministra atirou o partido para os 24 eurodeputados eleitos, saltando do 5.º lugar nas eleições de 2019 para o 1.º lugar em 2024. Um reforço eleitoral muito útil para as negociações à mesa do Conselho Europeu.
Apesar do segundo lugar ser do Partido Democrático (do grupo dos socialistas), a Itália soma ainda os eurodeputados do Liga, de Matteo Salvini – que terá perdido o número exato de lugares que Meloni ganhou. Para o clube mais alargado dos eurocéticos, também contam os oito eleitos do Movimento Cinco Estrelas.
Na Áustria, o Partido da Liberdade venceu pela primeira vez, com uma margem de um ponto percentual. O suficiente para dar seis lugares ao partido de extrema-direita, contra os cinco do Partido Popular Austríaco (PPE) e também cinco do Partido Social-Democrata da Áustria (S&D).
A vitória de Viktor Orbán na Hungria tem um sabor agridoce. Os 44% de votos obtidos foram a percentagem mais baixa do Fidesz nas eleições da última década, resultando em apenas dez lugares (e um para o parceiro de coligação), e o Tisza, o partido liderado pelo agora principal opositor, Péter Magyar, entrou de rompante e conseguiu sete lugares.
Na Bélgica, é o Interesse Flamengo (Vlaams Belang) que lidera a votação, num dia em que eleições para os parlamentos federal e regionais foram somadas às europeias. Mas o sistema de três diferentes círculos eleitorais significa que este partido nacionalista da Flandres fica com os três lugares que já tinha no Parlamento Europeu.
Os democratas-cristãos da CDU foram os vencedores na Alemanha, mas o pior para o chanceler Olaf Scholz é a Alternativa para a Alemanha (AfD), de extrema-direita, ter ficado à frente do seu Partido Social-Democrata Alemão. A AfD elegeu 15 eurodeputados, mais um que os socialistas, mas 15 a menos que a CDU, de onde é oriunda Ursula von der Leyen.
Nos Países Baixos, a vitória foi da coligação entre Trabalhistas e Verdes, mas o segundo lugar foi de Geert Wilders. O Partido pela Liberdade elegeu seis eurodeputados, para o grupo do Identidade e Democracia, continuando a surfar a onda de descontentamento do país – mas com menos força do que nas eleições legislativas de novembro de 2023, que ganhou com grande vantagem face à mesma coligação.
Europeias na Hungria
"Será óbvio para todo o povo húngaro que agora tem(...)
Outro segundo lugar próximo da vitória foi o do Lei e Justiça (PiS), na Polónia. A coligação liderada por Donald Tusk conseguiu derrotar o partido de extrema-direita (que tirou do governo em 2023), mas o número de eurodeputados é igual: 20 para cada. E aos 20 do PiS somam-se seis do Confederação Liberdade e Independência.
A Roménia foi palco de uma grande coligação entre os partidos de centro-esquerda e centro-direita, que parece ter largamente cumprido os objetivos ao obter 53% dos votos, contra 15% da Aliança para a União dos Romenos. Trocando por eurodeputados: 21 da coligação (13 para o S&D e 8 para o PPE) contra 6 da extrema-direita (dos quais apenas 1 irá para o ECR, com os outros cinco ainda sem filiação determinada).
No país a sul, a Bulgária, a extrema-direita conseguiu um terceiro lugar muito próximo do segundo. Foi o Renascimento, um partido que ainda não tinha representação europeia, a conquistar três mandatos no Parlamento Europeu, num contexto de seis eleições legislativas em cerca de três anos – com a sexta a coincidir com as eleições europeias.
Análise
Pediu uma vitória nas europeias mas acabou em quas(...)
A extrema-direita elegeu ainda seis eurodeputados em Espanha, através do Vox (num distante terceiro lugar), cinco na Eslovénia, três na Suécia e na Grécia, e dois em Portugal, na Eslováquia e na Letónia.
Soma-se ainda mais seis eurodeputados, um em cada um destes países: Croácia, no Chipre, na Chéquia, na Dinamarca, na Estónia, na Finlândia.
No fim de contas, há 63 eurodeputados de extrema-direita no ECR, 59 no ID, 41 no clube dos não inscritos, 3 sem filiação determinada e ainda cinco (todos da Eslovénia) no PPE.
As contas da Renascença são feitas com base na classificação mais recente do “PopuList”, uma base de dados criada por cientistas políticos europeus que define os partidos como populistas, de extrema-esquerda, de extrema-direita e/ou como eurocéticos. Os partidos definidos como casos-limite em cada uma das classificações não entram nas contas.
[Notícia alterada às 23h52 de 11 de junho para acrescentar as definições relevantes de partidos eurocéticos e de extrema-direita]