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Avenida da Liberdade

Revolucionário seria ter uma “democracia mais sólida, responsável e melhores partidos”, diz Sarsfield Cabral

06 mai, 2024 - 09:01 • Maria João Costa

No podcast Avenida da Liberdade, Francisco Sarsfield Cabral diz temer “que já se tenham esquecido em Portugal como era o antigo regime”. Numa conversa com o filho Luís, o jornalista considera necessário reavivar a memória, porque não há liberdade sem democracia.

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Ouça o podcast aqui.

Revolucionário em 2024 “seria termos uma democracia mais sólida, responsável e termos melhores partidos”, diz Francisco Sarsfield Cabral. Em entrevista ao podcast Avenida da Liberdade, com que a Renascença assinala dos 50 anos do 25 de Abril de 1974, o jornalista considera que “a política não está famosa, a economia tem muitas deficiências” porque Portugal tem “fraca produtividade e as pessoas vivem pior”.

No diagnóstico do tempo presente, olhando para a expetativa criada há 50 anos com a Revolução dos Cravos, Sarsfield Cabral desabafa: “esperava melhor”. Na sua opinião “é bom reavivar as memórias”.

“A democracia é um valor fundamental. É a única forma civilizada de viver em sociedade. Infelizmente tenho muito medo que já se tenham esquecido em Portugal de como era o antigo regime. Cortava muitas liberdades”, aponta nesta conversa ao lado do filho Luís Cabral de 54 anos.

“Se viesse para Portugal agora um regime de extrema-direita certamente que havia censura e coisas piores”, indica Sarsfield Cabral. Também o filho diz-se uma “fotocopia do pai”. “A minha geração já não compara com o antigo regime, mas comparamos com a Rússia, ou o que foram os regimes de leste”, diz Luís que se mostra preocupado com “este crescimento da extrema-direita na Europa”.

Se para Francisco Sarsfield Cabral a liberdade e democracia confundem-se e sem liberdade não haverá democracia, também Luís valoriza a liberdade, mas diz que não sabe “o que é viver sem liberdade”.

O filho de Sarsfield Cabral que cresceu em democracia considera “fundamental pertencer à União Europeia”, diz mesmo ser “favorável a que haja uma integração cada vez maior”, porque considera isso “importante a nível económico e da paz”.

Questionado sobre o que hoje seria revolucionário, Luís Cabral, agrónomo de formação diz que “seria os partidos entenderem-se para governar a longo prazo”.

Na opinião de Luís, “não há uma visão para Portugal e um projetar a 20 anos. A grande revolução era os partidos entenderem-se em acordos de regime”.

O 25 de Abril sem televisão e com tiros à porta de casa

No dia 25 de Abril de 1974, Francisco Sarsfield Cabral soube da notícia, porque alguém lhe telefonou para casa pelas 7 da manhã a dizer: “Parece que há uma revolução!”.

Vivia, e vive, na Rua do Alto do Duque no Restelo e resolveu ir para a redação do Diário Popular, onde trabalhava. Mas quando chegou a casa sabia que haveria uma declaração da Junta de Salvação Nacional, mas como não tinha televisão, teve de ir a casa de um amigo para assistir.

“Não tinha televisão, porque não queria! Só havia RTP e eu não tinha confiança nas notícias. Até que no dia 25 de Abril anunciava-se para a noite, uma declaração da Junta de Salvação Nacional, mas não fui a correr comprar uma televisão. Mas dois ou três dias depois fui comprar uma televisão”, conta a rir Sarsfield Cabral.

Dos tempos da censura nos jornais, o jornalista recorda que o dia 25 de Abril foi “espetacular, porque pela primeira vez o Diário Popular não foi à censura”.

Francisco Sarsfield Cabral recorda no Avenida da Liberdade, o seu último texto censurado. “Chegavam a tirar coisas idiotas. Um dos últimos textos que escrevi, antes do 25 de Abril, foi um resumo de um relatório da OCDE sobre Portugal e dizia, ‘Portugal não é ainda um país desenvolvido’ e eles contaram a palavra ‘não’!” conta a rir.

Sarsfield que diz que já não consegui imaginar escrever com censura, recorda que “às vezes a censura estraçalhava completamente o texto”. O fim da censura deixou “todos radiantes”.

Quer Luís, quer Francisco falam dos tempos conturbados que se seguiram ao 25 de Abril. Porque viviam próximos da sede do Copcon chefiado por Otelo Saraiva de Carvalho foram “várias vezes aconselhados a sair de casa” por razões de segurança.

“Havia a hipótese de bombardeamentos”, recorda Francisco que conta que iam “geralmente para Cascais para estar a salvo” para casa de um familiar.

Luís era então criança e recorda aqueles momentos de forma diferente. “Estão a dar tiros na mata!” lembra-se Luís de dizer ao pai ao telefone, apesar de mãe pedir a ele e aos irmãos para se “portarem bem e não preocupar o pai”.

Os católicos, a Renascença e o 25 de novembro

Neste episódio do Avenida da Liberdade as memórias de Sarsfield Cabral vão mais para trás. Recorda que houve católicos que “apoiaram muito o regime de Salazar”, mas ressalva que “felizmente, depois do 25 de abril, pessoas como o Mário Soares tiveram o cuidado de não criarem problemas com a igreja”.

O antigo diretor de informação da Renascença lembra ainda que nessa altura houve quem ajudasse a “libertar” a rádio “que foi ocupada pela extrema-esquerda depois do 25 de Abril”.

“O governo da altura, para calar a Renascença, arranjou um grupo do exército que foi lá por uma bomba no emissor! Não é um bom exemplo de autoridade do estado”, comenta.

Sobre o período que se seguiu ao 25 de Abril, Sarsfield Cabral recorda que foram momentos conturbados. “A experiência que tive, era a de não haver Estado. Não se sabia quem mandava, se era o Otelo Saraiva de Carvalho, se era o Copcon, era quem? Era quem calhava!”, desabafa.

Sarsfield admite que houve uma possibilidade de uma guerra civil. “Só acabou com o 25 de novembro. Vivia-se com muita angústia”, conta o jornalista que se interroga se era “admissível que a Assembleia da República fosse cercada por populares? Havia uma parte do exército que tendia para a esquerda e tinha uma certa proteção”, aponta.

Neste encontro de gerações no Avenida da Liberdade, Luís Cabral olha para o futuro e afirma que a liberdade e a democracia são valores que quer passar aos seus filhos.

“Tenho muitas recordações de perto do sítio onde vivíamos dizerem-me que morava ali um PIDE e passávamos com respeito. Há coisas que damos como adquirida, mas afinal isto pode não ser para sempre, temos de cuidar desta coisa”, remata.

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