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BTL. Um destino turístico completo tem de ser acessível a todos

05 mar, 2023 - 23:09 • Ana Carrilho

Numa das conferências organizadas no decorrer da BTL- Bolsa de Turismo de Lisboa, ficou claro que nos últimos anos tem sido por causa do turismo e dos turistas que se operaram transformações significativas que, na prática, revertem a favor de todos os cidadãos, turistas ou residentes. Apesar de ainda subsistirem muitos erros a corrigir, o impossível, para muitos tornou-se possível.

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“Ao promovermos a acessibilidade, é para todos e não apenas para as pessoas com deficiência”, sublinhou a Secretária de Estado para a Inclusão. E foi como uma “pedrada no charco” que Ana Sofia Antunes classificou o Programa All for all, do Turismo de Portugal, criado em 2016. “Pela primeira vez houve dinheiro para promover a acessibilidade, que podia ser usado por entidades públicas e privadas. 120 projetos foram financiados e maioritariamente executados.”

Rampas de acesso a museus ou mosteiros, elevadores para castelos, acessos diversos a edifícios e equipamentos em que antes não se mexia para não dar cabo do património. “Ora, o património só tem valor intrínseco se puder ser usufruído por todos”, sublinhou Ana Sofia Antunes, ela própria invisual.

As mudanças chegaram também às praias – marítimas e fluviais – aos hotéis, onde passaram a existir quartos sem desníveis e com portas suficientemente largas para a passagem de cadeiras de rodas e casas de banho equipadas para pessoas com mobilidade reduzida. Indicações ou ementas de restaurante em braille já são um pratica, assim como a audiodescrição. Além da qualificação dos trabalhadores para que possam atender todo o tipo de clientes, com qualquer necessidade.

Ainda assim, a Secretária de Estado lamentou que atualmente haja menos projetos em curso e deixou a ideia de que é preciso repensar uma nova Linha do género da All for All.

Maior acessibilidade também é negócio

Ana Sofia Antunes considera que muita gente não tem a noção do potencial de mercado que a acessibilidade pode gerar, nomeadamente na área turística. Porque não se trata apenas de pessoas com deficiência. Com o envelhecimento da população aumenta naturalmente o número de pessoas com mobilidade reduzida. Mas também há quem tenha uma incapacidade temporária ou simplesmente tenha um carrinho de bebé. Por isso, a Secretária de Estado para a Inclusão deixou alguns dados para reflexão.

“Na União Europeia há 127 milhões de cidadãos com alguma incapacidade que viajam. Se metade dessas pessoas viajarem acompanhadas, podemos pensar no potencial desse mercado. São pelo menos dois clientes. Ao viajarem mais, voltam mais vezes ao sítio onde foram bem tratados, são mais fiéis e gastam mais.”

Noutro momento da Conferência, Paula Teles, presidente do Instituto das Cidades e Vilas com Mobilidade acrescentou outro dado: 60% da população da OCDE tem mobilidade reduzida, permanente ou temporária.

Quem não tem mobilidade não tem liberdade

Para a responsável do Instituto das Cidades e das Vilas com Mobilidade, o turismo tem muito a aprender com quem desenha as cidades, mas a mobilidade também tem muito a aprender com o turismo. “Para nós tem sido o catalisador das mudanças”

Cidades como o Porto, Funchal ou Ponta Delgada começam a ter zonas “mais caminháveis”, pisos amigos de quem anda numa cadeira de rodas, usa bengala, empurra um carrinho de bebé ou simplesmente, usa saltos altos.

“Esta visão holística tem contagiado o trabalho de quem desenha as cidades, foi através dos turistas que começámos a olhar para as cidades”, admite Paula Teles.

Os sinais são desviados, assim como os caixotes de lixo ou outros obstáculos. Os sinais luminosos podem também ser sonoros, para quem não vê e em determinados pontos, há indicações em braile. “Quem não tem mobilidade, não tem liberdade, é nisso que temos de pensar.”

E também os territórios mais problemáticos e acidentados se podem tornar acessíveis como já acontece nalgumas Aldeias de Xisto.

É, por exemplo, o caso do Caminho de Xisto Acessível de Gondramaz, um percurso pedestre com menos de 1km, de formato linear, criado com a intenção de ser acessível a qualquer pessoa, independentemente das suas limitações (motora, auditiva, visual ou compreensiva). O percurso tem um pavimento sensorial que, através de diferentes texturas, orienta as pessoas com deficiência visual. Além disso, são fornecidos áudio-guias que possibilitam uma maior autonomia ao utilizador.

São razões e exemplos que levam o Secretário de Estado do Turismo, Comércio e Serviços a concluir que não há destino turístico completo se não for acessível a todos. Com um agradecimento especial a Ana Sofia Antunes por ser a primeira a obrigar o Governo no caminho da inclusão, Nuno Fazenda sublinhou que o Social é um dos três pilares da Estratégia para o Turismo 2027 (a par do Ambiental e do Económico).

Os próximos passos prendem-se com a apresentação, ainda este mês, de uma Agenda para as Profissões do Turismo, o apoio à qualificação e retenção de talento e ainda o investimento de 20 milhões de euros nas escolas do Turismo de Portugal.

Próxima época balnear vai ter pelo menos mais dez praias acessíveis

O Programa Praia Acessível começou em 2005 com 49 praias. Dezassete anos depois tinha 234 parias, 177 costeiras e 57 interiores. Desse total, 177 são do Continente, 18 dos Açores e 8 da madeira.

Mas, segundo o anúncio feito durante uma cerimónia de entrega de prémios para as melhores praias acessíveis de 2022 que decorreu na BTL, na próxima época balnear mais dez poderão ostentar a bandeira de praia acessível.

Há vários critérios a cumprir, a começar pela disponibilidade de lugares de estacionamento, ausência de barreiras no acesso à praia, piso firme e confortável até ao mais perto possível da água, casas de banho para pessoas com deficiência e posto de primeiros socorros adaptado.

Além destes critérios obrigatórios existem as chamadas “boas práticas”. Incluem espaços reservados com sombra e pavimento plano e firme para acolhimento, apoio e permanência; equipamentos de apoio ao banho, como as cadeiras anfíbias, dispositivos de acesso a piscinas, canadianas e andarilhos anfíbios; duches, lava-pés, bebedouros, bares e restaurantes acessíveis e inclusivos e ainda, a promoção de atividades desportivas, culturais e lúdicas adaptadas e inclusivas.

As praias premiadas de 2022 já respondem a algumas destas boas práticas e há quem defenda que várias se devem também tornar critérios obrigatórios.

A Praia do Salgueiros, em Gaia recebeu o 1º prémio de praia acessível. O 2º lugar foi para a Praia Fluvial de Alqueva, em Portel. O júri decidiu ainda atribuir uma Menção Honrosa à Praia de Pedrógão, em Leiria.

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