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Reportagem

​Profissão professora. 850 euros e mais de 20 anos sem saber onde vai dar aulas

23 jan, 2023 - 16:00 • Liliana Carona

Para ficar na zona de residência e cansada de mais de 20 anos de incerteza, depois de ter percorrido o país e até emigrado para a Suíça para trabalhar nas limpezas, uma professora de História da Covilhã garante que recebe 850 euros (depois dos descontos) por 15 horas semanais de trabalho, mas com 140 alunos, oito turmas, acaba por dedicar 60 horas ou mais à escola.

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​Profissão professora. 850 euros e mais de 20 anos sem saber onde vai dar aulas - Reportagem de Liliana Carona

Aos 46 anos, a professora de História, Luísa Rodrigues, a dar aulas desde 2000, não sabe nada sobre o futuro profissional. Mas do passado, dava um livro. Desde tirar outro curso (de Informática) para conseguir trabalho, a ter percorrido o Alentejo todo e até emigrou para a Suíça para trabalhar nas limpezas.

“Trabalhei nas limpezas em fábricas de relógios de luxo, depois de ter percorrido o Alentejo todo. Em 2011 fiquei desempregada, e o nosso primeiro-ministro mandou-nos emigrar e eu emigrei na altura e fui para a Suíça”, recorda a docente.

Luísa Rodrigues aprova a onda de protestos em curso no setor da Educação. “Identifico-me, porque em 2000 terminei o meu curso, os quadros estavam cheios e não consegui dar aulas de História, fiz uma pós-graduação em Informática em 2006 para poder lecionar TIC e disciplinas ligadas à Informática e até hoje não entrei no quadro”, lamenta.

Regressou da Suíça há três anos e tentou novamente entrar no sistema nacional de ensino. “A situação mudou, há professores a chegar à idade da reforma e agora o grupo de História tem falta de pessoas”, justifica sobre a vinda para Portugal.

Oito turmas, 140 alunos

Cada ano, uma escola diferente, horários incompletos. “Este ano tenho 15 horas, oito turmas, 140 alunos, mas trago um ordenado para casa equivalente a 15 horas, ninguém quer saber quantos alunos tenho, trago 850 euros limpos, sem saber o que me vai acontecer para o ano”, desabafa Luísa Rodrigues, denunciando o clima de incerteza.

O salário bruto de 1.047,89€, por 15 horas semanais, alega esta docente, não corresponde ao trabalho efetivo.

“Vejo-me sobrecarregada com quadros, quadrinhos, tabelas para preencher, reuniões que nunca mais acabam, papéis e burocracia. Tenho um horário de 15 horas, mas trabalho 60, quando trago 140 testes para corrigir. A paciência vai-se esgotando, porque tenho sempre trabalho e ganho pouco mais que um ordenado mínimo”, denuncia a professora da Covilhã, que tenta gerir os gastos.

“O meu pai ensinou-me sempre para não se gastar mais do que se ganha, há cortes, fica-se em casa, janta-se em casa, temos de gerir o dinheiro que temos. Nunca me meti em nenhum crédito nem nenhum banco me daria”, explica a docente.

Luísa Rodrigues admite que permanece na profissão por amor à camisola. “Eu gosto mesmo muito de dar aulas e ando nisto há 23 anos porque gosto muito de ensinar e da relação professor-aluno. Sei que poderia vir a ter horário completo, se fosse trabalhar para Lisboa ou para o Algarve, mas com mil e poucos euros e 46 anos, estou farta. O que ganho não chega para pagar portagens e combustível”, conclui.

Atualmente, Luísa Rodrigues leciona História ao 3.º ciclo, no Agrupamento de Escolas a Lã e a Neve, na Covilhã, de onde é natural e onde queria ter cumprido alguns sonhos.

Algumas escolhas pessoais de vida tiveram de ficar pelo caminho. “Nunca tive filhos, provavelmente por causa de toda esta instabilidade que foi a minha vida, felizmente não tenho créditos, se não estaria com a corda ao pescoço”, afirma Luísa, sem deixar de reconhecer que “há professores em piores condições, a atravessar a serra todos os dias para dar aulas, a deixar os filhos com os avós, situações muito precárias”.


Comentários
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  • Miraldina
    05 set, 2023 Setúbal 03:26
    Verdade! Chega-se até a receber menos que o salário mínimo se tivermos que faltar por algum motivo ! E podemos ter mais que 140 alunos! temos as mesmas responsabilidades e por vezes mais alunos que um efetivo que não tem este problema! Há muita injustiça e não admira que haja menos docentes. Os horários incompletos é para esquecer, o que se recebe não dá para fazer face às despesas e desmotiva para continuar. Deviámos receber por inteiro mesmo com horário incompleto e fazer outros trabalhos na Escola como apoiar os alunos no Estudo, isto sim, seria respeito por nós professores.
  • Lurdes costa
    26 jan, 2023 Vila Nova de Gaia 20:52
    Lamento a situacao precaria de muitos professores,ate porque os tenho na familia.O Governo deveria rever os direitos da classe porque os alunos de agora sao o futuro de amanha,e ninguem pode ensinar bem se nao lhe forem dadas as condicoes necessarias.boa sorte Professores!
  • António Nunes
    26 jan, 2023 Lisboa 16:29
    Já comprei vários artigos na La Redoute e fiquei muito satisfeito com a qualidade dos mesmos. Não comprei noutro lado. Já fui enganado por outras empresas do ramo. MAS ESTA É SÉRIA E OS ARTIGOS DE BOA QUALIDADE!
  • Antonio
    26 jan, 2023 Silva 15:24
    Se a Sra ganha 850 euros limpos ou seja con descontos feitos não está assim tao mal deveria arranjar outras 15 ou 20 horas mais para tentar aproximar os 2.000 euros que na realidade nem deveria muito de prostestar
  • Henrique Santos
    25 jan, 2023 Elizabeth , New Jersey 23:13
    Infelizmente tenho acompanhado as más notícias que veem de Portugal com respeito a’ Greve dos Professores é mesmo ridículo o que Governo paga aos Professores por Mês muito menos do que Dunkin Donuts paga numa semana a um simples Empregado y depois das 8 horas é obrigatório por Lei do Estado pagar Over Time ou seja se ganha $10 h passa a ganhar $15 h o Governo de Portugal tem Milhões para dar aos Deputados e outros ridículos Subsídios a quem não os merece y os Professores que são os verdadeiros Artífices em formar os Homens y Mulheres para o futuro de Portugal . Senhores Governantes pensem no “ Futuro “ dos Jovens de Portugal e nas “” Gerações Futuras “ para bem de Portugal e dos Portugueses . Com Portugal no “ Coração “ .
  • Manuel Ferraz
    25 jan, 2023 Vila Nova de Gaia 00:49
    Mas a dúvidas ainda que o estado está a pagar a educação e a segurança com o salário mínimo.
  • Miguel Vieira
    24 jan, 2023 Santarém 21:24
    Sr. Joaquim Correto, não é mau... é péssimo. Esta senhora (assim como a grande maioria dos professores em Portugal) trabalha 60 horas semanais divididas por 15 horas letivas (de aulas) mais 45 horas de trabalho burocrático, reuniões, grelhas, projetos, tabelas, etc. Conclusão... é uma média de 12 horas por dia. É o equivalente a 3, 07 euros à hora. Tirar uma licenciatura para ganhar pouco mais de 3 euros à hora, é bom para si? Então aconselho-o a concorrer nos próximos concursos (março/abril). O pior é que o senhor, assim como muitos portugueses, pensam que ser professor é apenas dar aulas. Saudações
  • Ricardo Fernandes
    24 jan, 2023 Rio de Janeiro 19:26
    Lendo esse post, chego à conclusão que trabalhar como professor no Brasil vale muito mais a pena do que em Portugal.
  • Repor a verdade
    24 jan, 2023 Leiria 19:16
    Um horário completo de um professor são 22h semanais, de tempos letivos e nao letivos. Limpos traz para casa 1035 euos. E é assim há muitos e muitos anos. Qual 1850 Limpos. Não falam do que não sabem!
  • Cristina Domingues
    24 jan, 2023 Covilhã 19:07
    O título é enganador, pois o salário corresponde às 15 horas letivas, em frente a turmas, mas estes horários obrigam ao cumprimento de horas chamadas não letivas. Na verdade, até acaba por ser explicado, pois é dito que há semanas em que no total são 40h e mais.

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