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Dependências: “Temos que nos preparar para o novo ciclo de deterioração das condições de vida”

07 dez, 2022 - 14:58 • Liliana Monteiro

Diretor do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) fala numa penúria dos serviços que trabalham com toxicodependentes e alcoólicos e alerta que a crise financeira trará novos padrões de consumos que é preciso prevenir.

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O diretor do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), João Goulão, deixou, esta quarta-feira, uma advertência aos deputados: "Temos que nos preparar seriamente para aquilo que é um novo ciclo de deterioração das condições de vida dos portugueses."

João Goulão apresentou esta o mais recente relatório sobre dependências no nosso país, documento que aponta para uma subida no consumo de cannabis entre os jovens, uma queda no consumo de heroína e um aumento ligeiro do consumo de cocaína.

O trabalho mostra ainda que as mulheres começaram a consumir mais drogas, equiparando já em alguns casos os consumos dos homens, e no álcool a dependência não está a atingir apenas os mais jovens mas também os idosos.

O diretor do SICAD deixou um aviso perante todos os grupos parlamentares que se encontravam no Auditório Almeida Santos, na Assembleia da Republica: "O uso de substâncias psicoativas tem uma interligação muito estreita com os níveis de saúde mental da população e tem também uma relação estreita com as circunstancias de vida dos portugueses."

"É fundamental criar balanço e que tenhamos massa critica e profissional para enfrentarmos de forma eficaz os problemas que aí vêm e antecipo que eles vão acontecer muito depressa”, acrescentou, numa clara alusão a uma possível alteração no comportamento aditivo da população em período de dificuldades económicas e sociais.

“Penúria” nos serviços de atendimento a toxicodependentes

João Goulão explicou que a resposta às adições a substâncias é dada de forma multidisciplinar numa articulação estreita entre serviços públicos e entidades privadas, particularmente ONG, denunciando que graves questões financeiras.

"Estamos todos na penúria de recursos humanos, de atualização de recursos financeiros, na remuneração das comunidades terapêuticas que não são atualizados desde 2008. Já fecharam algumas e temos a expectativa que a muito curto prazo seja publicado um despacho conjunto dos ministérios da Saúde e das Finanças para atualizar remunerações destes serviços, mas entretanto já encerraram algumas e se isto continua durante muito tempo haverá seguramente menor capacidade de resposta aos problemas que aí vêm", declarou

Comportamentos preocupantes

O consumo de álcool aumentou não só entre os jovens mas "preocupantemente" entre os mais velhos. "É desalientar que no consumo de álcool verifica-se um consumo de risco em pessoas mais velhas provavelmente aí com uma relação muito direta com a pandemia", disse Goulão, sublinhando que o consumo de álcool está na base de "problemas de sinistralidade rodoviária e atos de violência".

Em declarações à Renascença o diretor do SICAD revelou que o relatório “mostra aumento de consumos com algum grau de problemas relacionado com a canábis entre os jovens”.

João Goulão considera que o debate em torno da legalização da canábis conduz a população a uma desvalorização dos riscos do seu uso e defende um debate sério sobre o assunto: “Gostaria de ter a mesma certeza que de que todas as movimentações para regulação [do uso da cannabis] têm o mesmo objetivo que é reduzir o impacto nas populações se nos indivíduos que consomem, mas o que me parece é que entram outros valores na equação que não são os da saúde, são interesses económicos, uma nova fileira de negócio e esses não são valores pelos quais pugnamos."

A canábis tem surgido sempre como a droga com as maiores prevalências de consumo em Portugal. Os aumentos das prevalências de consumo recente foram mais relevantes nos 35-44 anos e 25-34 anos, sendo menos expressivos nos 15-24 anos.

As proporções de dependência foram mais elevadas no sexo masculino (1,2% dos inquiridos) por comparação ao feminino (0,4%). O estudo aponta para a necessidade do reforço das medidas preventivas em idades precoces, tendo em consideração que os 15-24 anos é o grupo etário onde maioritariamente se iniciam os consumos desta droga.

Os resultados nacionais evidenciaram que a canábis foi a segunda substância (a seguir às NSP) com mais referências à aquisição via internet (darknet, loja ou redes sociais).

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