23 nov, 2022 - 08:39 • João Cunha , Olímpia Mairos
O assédio moral está a levar à exaustão dos técnicos de manutenção de aeronaves. A conclusão é de um Estudo do Observatório para as Condições de Vida e de Trabalho, que conclui que aqueles profissionais estão sujeitos a altos níveis de pressão, provocados pelo trabalho por turnos, em dias de folga e com muitas horas extra para suprimir a falta de pessoal.
Em declarações à Renascença, o presidente do SITEMA, Sindicato dos Técnicos de Manutenção de Aeronaves, alerta ainda para o problema decorrente da saída do país de muitos técnicos de manutenção de aeronaves.
“Também nos preocupa que as empresas não consigam melhorar as condições de vida das pessoas o que leva a que as pessoas inevitavelmente estejam a abandonar o país”, diz Jorge Alves.
“E ao abandonar o país, isto vai-nos levar tendencialmente para uma situação em que não vamos ter mão de obra qualificada para fazer esta atividade que tão importante”, alerta.
O estudo que é apresentado esta quarta-feira foi feito a nível nacional, entre março e setembro de 2021. “Em virtude da crise da TAP e do plano de restruturação em curso entre 2021 e 2022, foram repetidas algumas questões numa segunda fase do inquérito, realizado entre 5 de julho e 6 de setembro de 2022. Além do inquérito, foram, ainda, realizados dois grupos focais”, lê-se no comunicado.
Segundo o documento, dos inquiridos, a maioria trabalha na TAP (88%), seguindo-se a Portugália (6%) e a SATA (6%), sendo que a grande maioria (67%) faz horas extra, 60% confessa não conseguir efetivamente descansar nas folgas e 58% diz não ter tempo para cuidar da família ou deles próprios.
Quanto às horas extra, alguns testemunhos qualitativos revelaram que tal ocorre “por má programação da gestão e das chefias, que trabalham sistematicamente com deficiência de pessoal”.
Os resultados indicam que 64% dos técnicos de manutenção de aeronaves declaram ter dificuldade em dormir, 44% declaram-se emocionalmente exaustos algumas vezes por mês (17%), uma vez por semana (10%), algumas vezes por semana (14%) ou sempre (3%).
Entre a primeira fase do inquérito e a segunda, o número de técnicos de manutenção a reportar serem alvo de assédio moral no trabalho – na maioria dos casos este assédio é praticado pelas hierarquias – passou de 28% para 39% quando contabilizadas as respostas “não sabe/não responde”. A percentagem sobe para 45% quando se retiram da contabilização as respostas “não sabe/não responde”. Além disso, 38% declaram ser pressionados pelas chefias para trabalhar em dias de folga.
De acordo com o Observatório para as Condições de Vida e de Trabalho, “tal como noutros cenários de intensificação laboral em Portugal, o trabalho extra passou a ser uma norma na gestão. Este modelo de gestão tem impacto na relação entre trabalhadores e destes com as hierarquias, sendo que 62% sentem que o contacto negativo com as hierarquias os afeta.
O estudo adianta que os TMA exibem “níveis preocupantes de sofrimento no trabalho e esgotamento emocional no seu todo” e que “nem todos os cansados exibem sinais de 'burnout', mas todos os que estão em 'burnout' têm índices de cansaço muito altos”.
Entre as conclusões refere-se que existe uma “relação elevada entre o assédio moral no trabalho e a exaustão emocional”. Um dos fatores que mais preocupa estes profissionais é o congelamento salarial, que afeta 99% dos inquiridos e a possibilidade de encerramento da empresa (98%).
Dos inquiridos, 86% concorda que os TMA deveriam ter um regime especial de reforma e 97% diz que o trabalho que desempenha envolve pressão contínua e stress laboral.
Para Raquel Varela, historiadora e investigadora responsável pelo estudo, “as conclusões mostram uma degradação das condições destes profissionais que está já a afetar sua a saúde a todos os níveis”.
“O congelamento de salários, a redução de pessoal e os níveis de assédio moral que reportamos são sintomáticos de um ambiente de trabalho muitas vezes tóxico, num setor que só por si já está exposto a níveis de stress elevados tendo em conta que os TMA são uma das garantias da segurança na aviação”, acrescenta.