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Colóquio “Eutanásia – o contexto, o cuidado, a relação”

O texto da lei da eutanásia é "lato" e “serve para tudo”

15 out, 2022 - 21:08 • Ana Catarina André

Carlos Costa Gomes, presidente do Centro de Estudos de Bioética, criticou a ambiguidade da lei e defendeu a necessidade de proteger os que sofrem. Já a antiga deputada do CDS Isabel Galriça Neto salientou que “dizer que se tem desejo de morrer não significa estar a pedir eutanásia”.

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O presidente do Centro de Estudos de Bioética, Carlos Costa Gomes, considera que o texto da lei da eutanásia “é mais ambíguo, mais lato e serve para tudo”. “Se antes se falava de doença fatal, agora [fala-se] de uma doença incurável, uma doença que eventualmente causa sofrimento”, diz o professor e investigador, que alertou para a existência de “muitas doenças incuráveis que não causam diretamente a morte”.

Em declarações à Renascença, no colóquio nacional “Eutanásia – o contexto, o cuidado, a relação”, que decorreu este sábado, dia 15, em Coimbra, Carlos Costa Gomes disse estar “preocupado” com a ambiguidade do texto e defendeu a necessidade de proteger os mais vulneráveis. “Uma pessoa em sofrimento não tem, de facto, capacidade de responder e nós, enquanto profissionais de saúde, temos o dever de a proteger, não de a eliminar.”

“Não se pode fazer uma boa lei da eutanásia”

O encontro contou também com a intervenção de Isabel Galriça Neto, que participou no painel “Como Cuidar num contexto de leis injustas?” A antiga deputada do CDS defendeu que “não se pode fazer uma boa lei da eutanásia”. “Sabemos que a partir do momento em que o sofrimento é a razão para matar alguém, as razões desse sofrimento vão alargar-se indefinidamente”, frisou.

A médica alertou, ainda, para os riscos da legalização da eutanásia nas estruturas residenciais para idosos. “Vejam os estudos feitos nos lares em Portugal e vão ver [quantas pessoas] têm desejo de morrer. Isto é perigosíssimo, perigosíssimo”, sublinhou Isabel Galriça Neto. “Dizer que se tem desejo de morrer não significa estar a pedir eutanásia. Significa que muitas vezes se vive em condições que podem e devem ser alteradas”, acrescentou.

Durante a sua intervenção, Isabel Galriça Neto lamentou que “tenhamos de falar de cuidados paliativos como resposta à eutanásia”. “Isso é falso”, esclareceu. A especialista lembrou que em Portugal 70% da população não tem acesso a cuidados paliativos. “Temos que falar dos cuidados paliativos enquanto cuidados de saúde que um sistema de saúde moderno deve ter. Se não tiver é arcaico e ultrapassado, porque pessoas com doenças crónicas, incuráveis, que ameaçam a vida existem aos milhares, nas instituições de saúde do nosso país”, disse.

Além de Isabel Galriça Neto, o colóquio organizado pelo Centro de Estudos de Bioetica contou com a presença do antigo secretário de Estado e jurista Joaquim Pedro Cardoso da Costa, que afirmou que o novo texto da lei da eutanásia é “mais radical do que o que saiu do parlamento há um ano”.

Por sua vez, o enfermeiro Valter José Mendes de Amorim chamou a atenção para “o sofrimento ético-deontológico dos profissionais de saúde”, quando confrontados com a eutanásia. “Somos formados para proteger a vida e o bem-estar dos doentes. É pernicioso estarmos a discutir uma nova visão que vem alterar tudo isto”, referiu, defendo que a possibilidade de recorrer à objeção de consciência “não responde em absoluto a isto, porque nem sempre há quem possa desenvolver a prática”.

O colóquio “Eutanásia – o contexto, o cuidado, a relação” contou, entre outros, com as intervenções do psicólogo Eduardo Carqueja, do capelão hospitalar Jorge Vilaça e do padre Miguel Cabral.

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