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Juízes "fartos de promessas" querem resolver problema da justiça administrativa e fiscal

11 mar, 2022 - 13:59 • Lusa

Alerta deixado esta sexta-feira, em Coimbra, pela Associação Sindical dos Juízes Portugueses e que segue a mesma linha das declarações prestadas ao programa “Em Nome da Lei”, da Renascença, pela presidente do Supremo Tribunal Administrativo e Fiscal.

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A Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) alertou esta sexta-feira que estes magistrados "estão fartos de palavras, burocracia, planos e promessas" e vão assumir a responsabilidade de apresentar propostas para resolver o grave problema da justiça administrativa e fiscal.

O assumir desta responsabilidade foi transmitida pelo presidente da ASJ, Manuel Soares, na abertura das Jornadas de Direito Administrativo e Fiscal, em Coimbra, que teve a presença da presidente do Supremo Tribunal Administrativo, Dulce Neto, e do secretário de Estado da Justiça, Mário Bello Morgado, entre outras figuras ligadas ao setor.

"Concedo que o Governo, na anterior legislatura, procurou dar alguns passos para melhorar o funcionamento da justiça administrativa e fiscal, mas a verdade é que ficou aquém do que era preciso. A especialização, as equipas de recuperação e alguma melhoria no apetrechamento organizativo foram importantes, mas não suficientes. Continuamos a ter processos à espera de decisão há demasiados anos e a esta velocidade nunca mais lá chegamos", referiu o presidente da ASJP.

Na mesma linha, as declarações da presidente do Supremo Tribunal Administrativo e Fiscal que, em declarações ao programa "Em Nome da Lei", da Renascença, considera uma "vergonha" o ponto a que chegou a demora na Justiça.

A magistrada Dulce da Conceição Neto admite que há processos à espera de decisão há 10 ou 20 anos. “É uma vergonha e está na altura de ultrapassar isto”, reconhece.

Ainda na abertura Jornadas de Direito Administrativo e Fiscal, Manuel Soares lembrou ainda que o Governo em funções criou um grupo de trabalho, elaborou um documento importante, com propostas que a ASJP considera positivas, mas que também, sublinou, "são pouco ambiciosas e incompletas".

"Os juízes, sinceramente, estão fartos de palavras, de burocracia, de planos e de promessas. Isto precisa de mais ritmo, de mais energia, de mais ação. Por isso, a linha de atuação que definimos até abril de 2024, pode resumir-se nesta esta ideia: chega de conversa", vincou.

Nas suas palavras, os juízes vão "assumir a responsabilidade de apresentar propostas e de lutar por elas", para "mostrar que é possível resolver o gravíssimo congestionamento de processos antigos atrasados, num prazo razoável, com um orçamento moderado, com um reforço conjuntural dos quadros, com melhor legislação, organização e gestão, com realismo, sem revoluções ou ruturas".

A proposta dos juízes será, explicou, para, em cinco anos, haver "um esforço orçamental que no limite máximo não ultrapassará os seis milhões de euros, e conseguir (...) colocar a justiça administrativa e fiscal a trabalhar em velocidade cruzeiro, mantendo e melhorando as taxas de resolução positivas e liquidando os processos antigos com atrasos excessivos".

E avisou: "Se a nossa proposta não for boa, pois bem, arranjem uma melhor. Mas vão ter de nos convencer disso, porque daqui para a frente vamos bater às portas todas, do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF), do próximo Governo e dos grupos parlamentares e exigir que sejam tomadas medidas. Vamos ser chatos. Se nada se fizer, há de ao menos ficar claro que não é por falta de propostas nem por falta de esforço dos juízes".

Dirigindo-se ao Secretário de Estado da Justiça, o dirigente da ASJP considerou que "os governos também têm de fazer mais, melhor e mais depressa", reiterando que é "uma vergonha o Estado não tratar de garantir aos cidadãos e às empresas o acesso à justiça em tempo razoável, num sector-chave como o da justiça administrativa e fiscal".

"Não há desculpa para isto. Não podemos, por inércia, por desinteresse ou por incapacidade, deixar que se consolide a ideia que o Estado não faz nada porque não quer que os tribunais que o condenam a devolver impostos, que o obrigam a cumprir contratos e que anulam os seus atos sejam mais eficientes", criticou.

E foi ainda mais longe nas críticas, ao dizer: "ou porque, pior ainda, (o Estado) quer mesmo que sejam ineficientes para desviar para o negócio privado das arbitragens as centenas de milhões de euros de dinheiro público que aí se discute todos os anos, com inaceitável opacidade, em processos secretos, sem intervenção do Ministério Público e sem controlo do Tribunal de Contas".

A existência de instalações "muitas delas indignas para acolher um tribunal, sem condições mínimas de higiene, saúde e funcionalidade, sem gabinetes de trabalho, salas de audiências e equipamentos em número suficiente" foi outro dos retratos do setor feito por Manuel Soares.

O presidente da ASJP declarou que viu, em visita aos tribunais administrativos e fiscais, "pilhas de processos amontoadas nos armários" e apercebeu-se da "impotência dos presidentes dos tribunais e do CSTAF para darem mais meios e melhores condições".

"Vi como vos empurram para trabalhar em processos demasiado burocratizados, complexos e ineficientes, que tratam da mesma maneira litígios de 100 euros e de 100 milhões de euros", observou ainda.

A finalizar, o presidente da ASJP notou que o próximo governo tem quase cinco anos pela frente, dispõe de maioria absoluta no parlamento e conta com juízes "conscientes da necessidade de reformar profundamente o sistema de justiça" e disponíveis para participar nesse processo de reforma, pelo que chegou a hora de "arregaçar as mangas e mudar isto de uma vez por todas".

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