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Seca no Alentejo

Agricultores desesperam com falta de chuva. “A situação é alarmante”

24 jan, 2022 - 22:00 • Rosário Silva

Os dias são de sol e de muito frio. O mês de janeiro está a terminar e chuva nem vê-la. No baixo Alentejo, os agricultores começam a desesperar face ao cenário que a falta de chuva está a provocar, com graves consequências para as produções agrícola e pecuária.

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Jacinto Mestre deita-se e levanta-se a pensar como vai dar de comer aos seus animais. É produtor de borregos em Castro Verde, no distrito de Beja.

“É uma situação muito preocupante. Acabou-se a palha, já não tenho para dar ao gado e as rações estão muito caras. Posso dizer-lhe que em cada semana que vou à farinha encontro sempre um preço diferente e cada vez mais alto”, lamenta o produtor, em declarações à Renascença.

Em relação à água, diz: "Ainda vamos tendo os poços, além de que o gado agora bebe pouco, mas a erva é cada vez menos, pois não chove."

Estes têm sido dias de algum desassossego, ainda que Jacinto Mestre se considere “um resiliente”.

“Os meses de água já passaram. Novembro é, para nós, o mês mais importante. Em dezembro, chove, às vezes, qualquer coisa, mas, este ano, pouca ou nenhuma... E já estamos no fim de janeiro e não há perspetivas de chuva, o que é muito preocupante”, confessa.

Com quase 400 ovinos, a palha armazenada há muito que se esgotou. Aos 61 anos, o produtor alentejano dá voltas à cabeça para encontrar soluções que permitam alimentar os animais sem colocar em risco o negócio que herdou da família.

Fundou a sua casa agrícola em 1983 e, desde então, tem tido “bons e maus momentos”, mas nunca pensou em abandonar a atividade.

“E, depois, faço o quê? A minha vida é esta. Cresci numa família que já tinha terras e gado e comecei logo com as ovelhas”, diz à nossa reportagem, reconhecendo que “de ano para ano, as coisas estão mais complicadas”.

A poucos dias das eleições, Jacinto Mestre lamenta que os “políticos estejam preocupados apenas com os votos e não com a realidade do país”, em particular, com “a nossa agricultura do Sul”.

Acredita que, se agora chovesse, “tudo mudava, até o nosso ânimo”, podendo ainda ser recuperadas “algumas searas que estão a perder-se”

As previsões, infelizmente, não são animadoras para esta região do país que se dedica aos cereis de sequeiro e à pecuária extensiva.

Fatores de produção disparam. “É uma coisa abismal”

O Alentejo, a par do Algarve e Nordeste Transmontano são, segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), as regiões mais afetadas pela situação de seca moderada. Se não chover até ao final de janeiro e durante fevereiro, então a situação, segundo o IPMA vai, seguramente, agravar-se.

Na sede da Associação de Agricultores do Campo Branco (AACB), em Castro Verde, o presidente José da Luz ouve, diariamente, as preocupações de dezenas de agricultores.

A seca e o nível reduzido de armazenamento de água nas barragens são inquietações comuns a todos os homens que trabalham na terra.

“Nós estamos em situação de seca já há alguns anos, mas esta está a ser muito preocupante, pois choveu pouco no outono e não choveu nada no inverno, o que está a criar uma situação deveras preocupante”, admite, José da Luz.

Neste momento, “estamos a alimentar os animais à mão desde setembro” do ano passado, uma vez que “o que tínhamos armazenado para esta altura, já foi tudo”, adianta.

O presidente da AACB garante que “as culturas feitas no outono/inverno estão completamente perdidas, a secar e a murchar”, o que é “alarmante”, pois assim não será possível “conseguir repor o stock para alimentar os nossos animais”, pondo em causa “a subsistência da pecuária”.

Toda a zona do Campo Branco está a ser afetada, numa área que congrega os concelhos de Castro Verde e Almodôvar e parte dos de Aljustrel, Mértola e Ourique.

“Só para lhe dar um exemplo, a barragem que abastece estes concelhos do Campo Branco, a barragem do Monte da Rocha, está neste momento com pouco mais de 10% de água armazenada”, menciona o também agricultor.

E como se não bastasse, José da Luz refere mais uma preocupação: “a incontrolada subida dos fatores de produção”, que é “uma coisa abismal”, onde se integra a alimentação animal.

“Esta semana, uma ração que eu estava a gastar subiu 20 euros a tonelada e isto está a acontecer desde outubro. É triste.”, lamenta o dirigente.

José da Luz espera que o próximo Governo olhe para a situação no baixo-Alentejo com “muita atenção” já que, a continuar assim, será necessário “tomar medidas rápidas e importantes”.

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