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Granadeiro recebeu 8 milhões de Salgado com base na "confiança"

13 jul, 2021 - 16:37 • Lusa

Antigo líder da PT falava como testemunha no julgamento do processo separado da Operação Marquês, no qual Ricardo Salgado responde por três crimes de abuso de confiança.

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O antigo líder da PT, Henrique Granadeiro, justificou hoje ter recebido oito milhões de euros da ES Enterprises, uma sociedade do Grupo Espírito Santo (GES), sem a existência de um contrato com base na "confiança" com Ricardo Salgado.

Ouvido como testemunha na terceira sessão do julgamento no Tribunal Criminal de Lisboa do processo separado da Operação Marquês, no qual o ex-presidente do GES responde por três crimes de abuso de confiança, devido a transferências de mais de 10 milhões de euros nesse âmbito, o ex-"chairman" da operadora de telecomunicações lembrou que conheceu pela primeira vez Ricardo Salgado em 1975.

"A base dos contratos de qualquer natureza é a confiança entre as partes", afirmou Henrique Granadeiro, quando questionado pelo Ministério Público (MP) sobre o pagamento de oito milhões de euros (9,8 milhões de francos suíços) da ES Enterprises em 12 de outubro de 2011 e a razão de só em janeiro de 2012 ter sido elaborado um contrato, acrescentando ainda ao procurador Vítor Pinto que "a maioria dos contratos que faz não é escrito".

Em resposta, o procurador observou que "nem teria acesso a um contrato de milhões". Em causa esteve, segundo a testemunha -- que foi arguido no processo Operação Marquês até ser despronunciado pelo juiz de instrução Ivo Rosa -, a venda de 30% da sociedade agrícola Margar por cerca de 14 milhões de euros.

"[Os oito milhões de euros] foi um sinal de princípio de pagamento, porque o contrato só foi feito em janeiro. O negócio foi concebido em euros", explicou o gestor, adiantando ter recebido uma parcela dos quatro milhões de euros em janeiro de 2012 e os últimos dois milhões em novembro desse ano.

Sobre os motivos para o período de tempo mais longo entre a segunda e a terceira prestação deste negócio, Henrique Granadeiro considerou que "não é assim tão distante num negócio desta dimensão e com estas finalidades" e admitiu que não existiu qualquer contrato promessa nessa operação.

Já em relação à transferência de cerca de quatro milhões de euros (3.967.611,00 euros, originalmente 4,9 milhões de francos suíços) em novembro de 2011 de uma conta no banco Pictet para outra conta do banco Lombard Odier titulada pela sociedade em "offshore" Begolino, que era controlada pelo ex-presidente do BES, Henrique Granadeiro justificou essa operação com a compra de uma casa, mas reconheceu "ainda não" ter formalizado isso num contrato.

"A partir do momento em que entrámos na Operação Marquês não tive qualquer contacto direto com Ricardo Salgado e nem mexi em nada patrimonial", explicou o antigo líder da PT, notando que essa transferência era por um total de cinco milhões de francos suíços.

Em relação a este aspeto, o presidente do coletivo de juízes, Francisco Henriques questionou por diversas vezes Henrique Granadeiro sobre as razões desse investimento imobiliário de quatro milhões de euros quando o que pretendia com a venda dos 30% da Margar era obter maior liquidez.

"Qual é o fundamento de vender uma participação grande da sua empresa agrícola para depois ir comprar uma casa e fazer investimento imobiliário? Em termos de gestão esta decisão não me faz muito sentido e queria que me explicasse a motivação subjacente a esta decisão", visou Francisco Henriques, reforçando: "Se gerava rendimento, qual é a motivação que o leva a vender parte de uma coisa que lhe dá rendimento para investir numa área que não tem nada a ver com o seu negócio?"

"À luz do que sabemos hoje, temos de pôr as coisas na sua época. É nesse contexto esta venda de 30% da Margar. Eu procurava essencialmente um parceiro para montar um negócio de maior rentabilidade", observou Granadeiro, que acrescentou: "A motivação é na aplicação da liquidez que eu tinha e que ou seria feita em títulos de empresas - desaconselhável naquela altura -, ouro ou imobiliário, como a maior parte dos investidores fizeram".

Igualmente ouvido esta manhã foi o antigo administrador do BES Amílcar Morais Pires, que vincou nunca ter tido qualquer "responsabilidade acima do BES" e salientou apenas ter noção da existência da ES Enterprises.

"De nome sabia, mas nunca fui gestor nem sabia como funcionava. Espírito Santo era a marca e era muito valiosa, mas tinha muitas empresas. Não participei na gestão dessa empresa, nem em qualquer ato. E nem sei quem eram os administradores", afirmou. .

Confrontado pelo MP se recebeu pagamentos dessa sociedade, a advogada do antigo administrador interveio e aconselhou o cliente a não responder por uma questão de autoincriminação, uma vez que é arguido no processo do universo GES.

O julgamento de Ricardo Salgado prossegue hoje à tarde com as audições de Helder Bataglia, Francisco Fino e José Maria Ricciardi.

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